O Governo de Angola não abandona a perseguição a Isabel dos Santos. Passo a passo, Angola tem seguido o rasto do dinheiro alegadamente desviado pela filha do antigo Presidente José Eduardo dos Santos. Tem sido um combate jurídico, com queixas crime em todos os países onde Isabel dos Santos investiu em propriedades ou unidades industriais e comerciais.
A mais recente peleja foi no Supremo Tribunal de Londres e Isabel dos Santos perdeu a batalha legal para impedir o congelamento de bens num valor a rondar os 700 milhões de euros. A ação legal foi movida em nome da UNITEL, uma empresa de telecomunicações administrada por Isabel dos Santos durante os anos dourados em que o pai era o “dono-daquilo-tudo” em Angola. Documentos judiciais mostram que a UNITEL acusou Isabel dos Santos de “meter no bolso” mais de 450 milhões de euros que a empresa tinha obtido através de empréstimos na banca, em 2012 e 2013.
Isabel diz que está a ser perseguida no âmbito de uma vingança contra ela. Nega irregularidades e diz que as alegações decorrem das suas tentativas de “erradicar a corrupção” quando liderava a Sonangol, a petrolífera estatal angolana.
Mas as evidências de nepotismo de José Eduardo dos Santos foram desmascaradas com o famoso caso Luanda Leaks, que destapou milhares de documentos onde há fortes indícios dos esquemas utilizados por Isabel dos Santos, familiares e outros fiéis do pai para beneficiarem com negócios lucrativos em petróleo, diamantes, telecomunicações, banca e imóveis.

Em 19 de janeiro (há dois dias) o site do ICIJ dava conta de mais um passo judicial de Angola contra a filha do anterior Presidente. Diz o artigo que 12 procuradores angolanos reuniram acusações por alegada gestão danosa da Sonangol, que resultou em prejuízo de 219 milhões de dólares.
Isabel dos Santos já viveu em Londres, mas agora nem pode lá por os pés. Um tribunal londrino ordenou-lhe que revelasse os seus bens, onde se estima que ela tenha propriedades no valor de 40 milhões de euros no Reino Unido. O mesmo tribunal quer saber, ainda, que propriedades Isabel tem no Mónaco e no Dubai, numa estimativa a rondar os 90 milhões de euros.
Em 2022, o Presidente angolano, João Lourenço, sucessor escolhido a dedo por José Eduardo dos Santos, nacionalizou a UNITEL meses depois de as autoridades angolanas terem confiscado as ações de José Eduardo dos Santos, pondo efetivamente termo à sua ligação à empresa. É caso para dizer que José Eduardo dos Santos escolheu com os pés… Ou foi obrigado a “escolher”.
Entretanto, há um mandado internacional da Interpol para a detenção de Isabel dos Santos. Os fundamentos do mandado são os indícios publicados pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (ICIJ), documentos que foram obtidos pelo hacker português Rui Pinto, que revelaram como alegadamente Isabel e outras pessoas beneficiaram de modo ilícito com negócios.
Rui Pinto obteve mais de 715 mil documentos relacionados com as atividades empresariais da multimilionária angolana, partilhou-os com o ICIJ que os espalhou pelas redações de jornais de mais de 20 países. Na sequência disto, as autoridades angolanas acusaram Isabel dos Santos de desviar milhões do país.
Rui Pinto recebeu todos os créditos pelo Luanda Leaks, mas passou já vários anos na prisão pelos Football Leaks, uma ação de pirataria informática semelhante que revelou fugas aos impostos por parte de jogadores de futebol em toda a Europa.
Quanto a Isabel, a fortuna que acumulou diminui rapidamente. Decisões de vários tribunais de diferentes países já congelaram bens que lhe pertencem. Por exemplo, em junho, um tribunal holandês decidiu que documentos falsificados e gestão danosa permitiram a Isabel dos Santos desviar ilegalmente 52,6 milhões de euros da Sonangol por meio de sociedades holandesas. Em Angola, tudo o que estava em nome dela ou de empresas controladas por ela reverteram a favor do Estado ou foram encerradas. Voltar a Angola deve estar fora de hipóteses, caso contrário sempre poderia pensar em recomeçar tudo de novo…

Em Portugal, decisões judiciais congelaram-lhe contas bancárias e algumas empresas foram retiradas da sua esfera de influência, como foi o caso, por exemplo, da EFACEC. Lembramo-nos que, em 2020, o juiz Carlos Alexandre mandou arrestar todo o património da empresária em Portugal, como casas, contas bancárias e participações sociais em empresas.
Desde que morreu o pai, a vida de Isabel dos Santos e dos irmãos só tem dado trambolhões. Os que ficaram em Angola já passaram pela prisão e sabe-se lá em que condições permanecem no país, os que estão fora vivem com cada vez menos sossego e dinheiro. A morte do marido nunca foi oficialmente considerada suspeita, mas teve contornos estranhos. Hoje, Isabel vive “aprisionada” em geografias que não aceitam pedidos de extradição para Angola. Se puser o pé fora desse circulo protetor, vai parar à cadeia. Isso é mais que certo.