Há mais ou menos sete ou oito anos, enviei um e-mail para uma comissão ligada ao SEF que pedia nomes que pudessem acolher refugiados. A guerra da Síria já era uma realidade com algum tempo, o Iraque estava completamente destruído e o Afeganistão não deixava os seus cidadãos sobreviverem pelas mesmíssimas razões. Inscrevi-me assim para receber uma criança de qualquer destes três países. Esperei. Nunca obtive resposta. Entretanto a vida avançou, mudou e não mais insisti nessa ideia.
Portugal ofereceu-se recentemente para acolher 500 refugiados menores, vindos dos campos de refugiados, sobretudo da Grécia, e são novamente estes três países os maiores fornecedores deste fenómeno migratório que pensavamos não assistir no nosso tempo. Vinte e três já chegaram e algumas reações de desconfiança vão-se sentindo, nomeadamente no facto de se achar necessária a despistagem da covid 19 aos mesmos, tendo em conta que já não são “crianças”, uma vez que se trata de rapazes entre os 15-17 anos. Convém, porém, não esquecer, para outros efeitos, que muitos deles já vieram há muito tempo dos seus países, sendo mais novos e sujeitos a todo o tipo de abusos e exploração precisamente pela idade e por terem atravessado as fronteiras sozinhos, deixando as suas famílias para trás.
Há sensivelmente um ano, passou uma reportagem na televisão portuguesa sobre cinco rapazes refugiados afegãos, que o nosso país acolhera e que, espantosamente ou não, não conseguira integrar. Lembro-me relativamente bem do conteúdo dessas histórias, porque na altura fiquei zangada com as instituições portuguesas responsáveis pela integração, assumidamente não conseguida e justificada com comportamentos “desviantes” de alguns deles. Dois eram irmãos, orfãos, muito marcados por situações de violência sobre a sua família e depois pela exploração laboral, “a meio do caminho” , que também vieram a sofrer. A desculpa para a não integração foi a de que os rapazes também eram violentos entre si, que carregavam marcas da “sua cultura” e que não se conseguia fazer nada deles. Acabaram todos a viver num apartamento e a ser ajudaos pela Mesquita de Lisboa, ao que me lembro, desconhecendo o seu percurso desde então.
Há uns dias, passou uma reportagem na RTP1 sobre jovens como estes, refugiados nos campos da Grécia, que, ao contrário, não mostraram o seu rosto, e entrevistados pela Catarina Furtado na sua rubrica “Príncipes do Nada”. A esperança é a de sempre, a de poderem trabalhar para enviar dinheiro para as suas famílias, quando estas ainda restam nos seus países de origem. Trata-se de miúdos muito carentes emocionalmente, com fortes marcas de desabrigo emocional e também de conforto material, que se automutilam com frequência, deixando-me envergonhada das minhas e das nossas queixinhas e indignaçõezinhas diárias do nosso mundo mais fácil e confortável.
São este tipo de jovens, que se aventuraram sozinhos à procura de uma sobrevivência financeira ou mesmo física, que chegam também, e mais uma vez, desta feita em maior número a Portugal. Uma das responsáveis de um dos campos da Grécia elogiava o nosso país como sendo um que manifestara boa vontade, enquanto que outros pura e simplesmente fecharam os olhos a toda esta situação. As quotas falharam na Europa e cada vez mais outras questões vieram sobrepor-se a estes dramas das migrações.
O que desejo para estes miúdos? Integração. Não é impossível e é uma vergonha que não o tenhamos feito antes com os 5 que mencionei acima. Muitos destes estudam em escolas da Grécia e é por aí que temos de começar. Educação e apoio psiscológico. Acho importante haver figuras feminas na área da psicologia a apoiá-los, perdoem-me a diferenciação por género, mas a figura maternal pode ser uma ajuda emocional que poderá fazer a diferença. Um destes miúdos chorava enquanto falava da sua mãe afegã. Nas escolas, terá de haver verdadeira inclusão, com Português Língua Não Materna, metas adaptadas (que não é o que está a acontecer com os miúdos da Venezuela) e apoios para as dificuldades que surgirem. Tem de haver recursos humanos. A Alemanha recebeu um milhão de refugiados. Embora pareça utópico por cá, tem de haver investimento nas pessoas, nos seus problemas e projetos.
É um bom começo. E a compreensão, pragmatismo e afeto de quem os recebe, claro.