Sei bem que há uma regra no jornalismo que nos manda poupar nas palavras. Principalmente nos titulos, que devem ser curtos e concisos. mas acabei de ler uma coisa no grupo fechado de Jornalistas e Antigos Jornalistas do Facebook que indicia manipulação da mensagem, no sentido de enganar o leitor.
Em questão, um titulo da BBC: Activists Say Ship Heading to Gaza Was Attacked by Drones off Coast of Malta. Tradução: ativistas dizem que navio que se dirigia a Gaza foi atacado por drones ao largo de Malta.

Não se menciona Israel nem que o barco era de uma ONG humanitária, sugestões que surgem tipo rasuras na imagem seguinte e que foi a imagem partilhada no grupo do Facebook de Jornalistas e Antigos Jornalistas.

A sugestão é que se tivessem escrito NGO Say Aid Ship Heading to Gaza Was Attacked by Israeli Drones off Coast of Malta (tradução: ONG diz que navio que ia para Gaza com ajuda humanitária foi atacado por drones israelitas ao largo de Malta), teriam tornado o título mais assertivo. A escolha das palavras é tudo.
A escolha das palavras não é apenas uma questão de concisão, é uma questão de enquadramento. Cada palavra (ou omissão) ajuda a construir uma narrativa que influencia diretamente a perceção do leitor, mesmo antes de este chegar ao corpo da notícia.
A escolha por omitir a palavra”Israel”, o alegado autor do ataque, é uma escolha editorial significativa. Quando se omite o agente da ação, retira-se responsabilidade e clareza ao relato.
Omitir que se trata de um navio humanitário de uma ONG, suaviza o impacto da notícia. Um “navio de ativistas” ou apenas “navio a caminho de Gaza” não tem o mesmo peso simbólico ou ético que um “navio humanitário de uma ONG”, especialmente se estiver a transportar ajuda para civis sob bloqueio.
A linguagem não é neutra e os títulos, especialmente em tempos de guerra, raramente são apenas sobre poupar palavras.
O navio em questão, denominado Conscience, fazia parte da missão da Freedom Flotilla Coalition, destinada a entregar ajuda humanitária a Gaza. Em 2 de maio de 2025, o navio foi alegadamente atacado por drones israelitas em águas internacionais, a cerca de 17 milhas náuticas da costa de Malta.
A análise ao título da BBC evidencia como as escolhas editoriais podem moldar a narrativa de um evento. Mesmo se no corpo da notícia se dá conta das acusações da ONG sobre a autoria do ataque, sabemos bem que a maioria dos consumidores de notícias apenas lê o título, excepto quando se sentem atraídos por saber mais sobre o assunto.