O NOME DAS RUAS

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colagem fotográfica

É sempre oportuna a rubrica no jornal local, que vá explicando as razões por que se deu a uma rua determinado nome. E estar a ser costume – que o concelho de Cascais seguiu – de até se publicarem livros com a toponímia das freguesias, explicitando não apenas a sua localização, mas também quando, como e porquê esse nome foi atribuído.

Iniciativas que se aplaudem, primeiro, porque ajudam a criar comunidade, na medida em que, recordando os nomes das ruas e das terras, as pessoas sentem tudo muito mais próximo, mais seu; segundo, porque a atribuição de nome a um arruamento constitui um processo que amiúde envolve toda a população, mormente quando há oportunidade de ela manifestar a sua preferência.

Permita-se-me, porém, que, como historiador da cultura, realce a importância que a cronologia detém neste âmbito; ou seja, a resposta à pergunta:  por que razão a esta rua foi dado esse nome?

Dou um exemplo: Maria Bárbara Louro morreu em 1929; o seu nome foi dado à rua duma vila em 12-01-2016, quase 100 anos depois! Porquê? Que é o que diz a ata nº 1/2016, da reunião camarária em que tal decisão se tomou? Só tantos anos passados se lembram da senhora, porquê? Importa sabê-lo.

Veja-se o exemplo desta rua de Beja, que a figura mostra.

Século XIX adiante, ainda não havia placas nos arruamentos, era a Rua dos Mercadores. Ali se faziam os negócios, ali se ajuntavam os burgueses. Mais tarde, os mercadores perderam o seu ar de ambulantes e estabeleceram-se; vai daí, o povo deu em chamar-lhe a Rua das Lojas. Vieram depois as danças e contradanças da I República, hoje está no poder um partido, amanhã está outro, e a população acaba, em determinado momento, por depositar em Afonso Costa as suas sempre adiadas esperanças. Vitoriaram a sua subida ao poder e nada melhor do que afixar o seu nome na artéria mais frequentada da cidade, que se tornou, por isso, a Rua Dr. Afonso Costa. E não se esqueceu o seu título académico, como garantia de validade!

Está a tornar-se comum esta mui louvável atitude de, nas placas toponímicas, dar conta dos nomes antigos. A praça principal de Coruche ostenta seu nome num bonito azulejo que reza assim: Praça da Liberdade / antiga / Praça 5 de Outubro / e / Praça do Comércio. Em três penadas, oportuno e incisivo registo da história local: o ponto de encontro dos homens de negócios do século XIX saudou a implantação da República e proclamou a Liberdade que 25 de Abril lhe concedeu!

Em Cascais, há a Rua Direita, designação tradicional ainda hoje em uso.

Trata-se de uma designação vulgar e a rua «direita» amiúde é bem torta (estou a lembrar-me da de Coimbra), porque, neste caso, como se sabe, a palavra ‘direita’ provém de ‘directa’, para significar o caminho mais curto e principal para sair da localidade. Por isso também, dada a sua muita frequentação, era a rua preferida pelos comerciantes, tal como a atrás referida rua bejense, que foi dos mercadores e das lojas.

E também em Cascais se cedeu à tentação de Beja e o nome tradicional foi substituído por um dos políticos em voga e em quem se depositavam esperanças: Frederico Arouca, político notável da Monarquia Constitucional, que muito se interessou por Cascais, onde, aliás, viria a falecer em 1902.

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