A minha amiga tinha andado pelo Porto, a pé, de transportes públicos, de automóvel, e mostrou-se admirada com o estado de conservação da cidade: ‘nas zonas nobres tudo está recuperado ou em recuperação. Claro que há prédios altos e alguns horríveis mais afastados da Baixa. Mas vê-se que procuram estimar e tratar a cidade. Em Lisboa destroem tudo: as vivendas e os prédios da Av. da República, por exemplo, deram lugar a mamarrachos indescritíveis, de gosto muito duvidoso. E o que têm feito na zona das Avenidas Novas? E as lojas fechadas da nossa Baixa Pombalina? E os prédios entaipados?’.
As ruas da Baixa, conhecidas pelas lojas belíssimas e de luxo, são agora locais de venda de objectos de gosto, no mínimo, duvidoso, com lembranças de plástico, a maioria de origem chinesa, como se o artesanato em Portugal não existisse, e há portas e janelas entaipadas para impedir o acesso a toxicodependentes e sem-abrigo.
São Alojamentos Locais porta-sim, porta-não, que nada têm a ver com a cidade e frequentados por gente que se percebe não serem propriamente turistas, mas, talvez, imigrantes ilegais. O que, naturalmente, faz crescer a insegurança. No Porto, podem pôr os olhos na Rua das Flores, onde o AL tem ocupado uma grande parte, sem desfear a zona a quem por ali passeia.

A Lisboa, a belíssima cidade de Lisboa, parece restar somente a sua famosa luz…
Não está em causa o progresso ou a evolução, mas o desrespeito que sucessivos autarcas mostraram pela cidade e pelas as suas características. Nem a propósito, ao passar na Columbano Bordalo Pinheiro, outra zona que era de belas vivendas, verifico que a única que subsistiu está à venda. Ligo para o número de contacto e quem me atende informa que ‘o preço são seis milhões de euros, a casa é para demolir e ali ser contruído um prédio igual aos que estão ao lado’. Como se fosse uma grande informação, acrescenta que a Câmara de Lisboa já aprovou o projecto. E lá se vai a última vivenda da Columbano…

Recentemente tive acesso a uma carta enviada à Câmara de Lisboa por um cidadão estrangeiro que vive há alguns anos em Portugal. O casal não veio de um país em guerra ou a fugir de alguma coisa. Simplesmente optou por viver em Lisboa. O signatário da carta e a mulher não escolheram a Lapa ou Cascais para recomeçar, antes compraram casa em Campo de Ourique, um dos bairros mais ‘bairro’ de Lisboa, do qual falam com prazer e orgulho.
‘Adoramos Portugal. As colinas, os parques e florestas, as praias, o clima, o sol, a comida e o vinho, e mais. Mas, mais do que tudo, o povo faz este lugar especial’, escreve aquele cidadão, para acrescentar que a zona onde reside ‘é o melhor e o mais belo sítio da cidade’.
O casal pede atenção para problemas da sua rua: um armazém da Câmara Municipal, ‘totalmente abandonado, cheio de lixo e equipamento muito antigo, e o tecto de metal a cair’. Curiosamente, aquando do tornado em Lisboa que levou parte do telhado do Banco Alimentar, muitos dos pedaços daquele voaram para zona onde reside este casal. E apontam o facto de ‘o armazém parecer ter cabos elétricos e, quando chove, a água entra’.
Por outro lado, anotam as obras intermináveis junto ao Cemitério dos Prazeres e o facto de as ruas e calçadas estarem em péssimo estado, numa zona onde a população residente é, maioritariamente, muito idosa e sujeita a grandes quedas.
Lamentavelmente, o casal fala ainda da falta (imagine-se!) de contentores do lixo, já que, numa zona muito povoada, há somente alguns caixotes do lixo, sem possibilidade sequer de fazer reciclagem.

Mas isto é Lisboa de hoje, com ciclovias de localização dúbia, ruas sem arranjo, estradas perigosas e impraticáveis, casas a cair sem que haja possibilidade de reabilitação por motivos económicos e outros a comprarem-nas para destruírem o nosso património.
O Porto foi considerado o Melhor Destino de Cidade do Mundo 2022 nos World Travel Awards, em Mascate, Omã. Não sei se é um prémio de mérito. Visto o Porto como está, admito que seja. Mas lembro-me de quando se falava assim de Lisboa e como a têm vindo a estragar.
Agora, por favor, não estraguem o Porto!
Em relação à luz de Lisboa, o pouco património natural que resta de atraente, pode ser colocado em perigo se avançar a terceira travessia do tejo, sobre o mar da palha, que vai destruir essa harmonia e os reflexos dourados no Tejo que se reflectem sobre a colina de Alfama.