A minha saga iniciou-se há semanas, na noite em que antigos colaboradores, que ainda se mantêm na linha da frente, me comunicaram que, evitando desperdícios, dispunham de seis vacinas. A primeira, garantiam, fora-me unanimemente atribuída, enquanto colega de risco a quem pretendiam simbolicamente “homenagear”.
Uma proposta “irrecusável”, que muito agradeci, mas que prontamente recusei: embora a engordar com o confinamento, nunca seria capaz de encerrar a minha carreira cívica na qualidade de “fura-filas”…
Até que, na semana passada, e pelo telefone, uma instituição oficial me informou que, no domingo, teria acesso à vacina. Com pouco mais de setenta anos, e sabendo que muitos concidadãos, mais idosos, ainda estavam por vacinar, desconfiei. Se calhar, na altura própria, teria de recusar porque, talvez estivesse a ser incluído na quota dos médicos, profissão que oficialmente já não exerço.
E acrescia outro problema: é que, sendo “fã” da Sputnik ou da Cinovax, me queriam impingir o “refugo” das vacinas mundiais, essa produção britânica que, por acaso, sempre foi das mais exigentes do mundo.
Como português espertalhote, tinha dois dias para me “desenrascar” e voar até às ilhas dos Açores, onde a “geringonça local” anunciara tal aquisição: uma dificuldade facilmente ultrapassável porque, embora com a frota da TAP no chão, nem me seria difícil aceder a João Loureiro, um tipo porreiro que, certamente, me cederia o contato de uma empresa particular de aviação, oportunidade de até importar uma carga suplementar para os meus amigos, cá do retângulo.
O problema, contudo, residia na “geringonça açoriana” onde não conheço ninguém. E com Marcelo Nuno em digressão pelo Iraque, onde fora visitar o Papa, e sem que Rios e Xicões me pudessem valer, foi então que tive uma “ideia luminosa”:
– Talvez o André Ventura… que também é do Benfica e até é quem manda lá nos Açores… – Pensei.
Não contava eu que, nesses dias, esse amigalhaço estivesse incontactável: primeiro, ocupado a homenagear os três campeões europeus de atletismo em pista coberta; e, depois, a responder a dezenas de convites para casamentos de ciganos, rendidos à sua política de integração.
Gorada a hipótese de viajar com sucesso para os Açores, um território europeu que, recebendo magros subsídios, segue o exemplo da Hungria ao dobrar da primeira esquina, foi então que me “apresentei ao serviço”, em Leiria: não sem antes ter confirmado que estariam a chamar o pessoal da minha faixa etária, sem discriminar ninguém.
Uma “benesse” que não me surpreendeu, ao confirmar que estava a ser executada “vertiginosamente” por excelentes profissionais que, em tempos, tive o privilégio de formar e dirigir. E que nem sequer me exigiram o folclórico “streap-tease”, que outros foram obrigados a executar.
E foi num Estádio de Leiria quase em ruínas, mas recebido como VIP, que integrei o lote de cento e oitenta mil felizardos que, em Portugal, mesmo à justa, mereceu a primeira dose da “tenebrosa” Astra Zéneca. Uma vacina que, no dia seguinte, a nossa DGS havia de retirar do programa, invocando razões sem qualquer consistência técnica ou científica.
Tendo sido colocadas naturais reservas, em práticas que em “tempo de guerra” até obedeceram aos melhores parâmetros, será amanhã que a agência europeia vai ditar a sua verdade. Prognósticos depois dos jogos nunca faço e – quem sabe faz e quem não sabe complica – não é com retóricas esdrúxulas e fórmulas matemáticas exotéricas, que me escondem a incompetência e total incapacidade de gente que nem sabe gerir uma capoeira.
Acreditem que, faça sol ou faça chuva em junho, esteja eu são e escorreito como hoje e sem ter passado por qualquer das reações secundárias, registadas por muitos portugueses a quem foram aplicadas outras vacinas, exijo que me apliquem a segunda dose, que me é devida. Nem que tenha de ir aos Açores…
Arre, porra, que já é demais!…