Os portugueses estão a ler menos. A prova dos nove é a falência das editoras. É o que a vai acontecer à Editora Cotovia, fundada há 32 anos por André Jorge e dirigida pela culta e bela Fernanda Mira Barros nos últimos dois.
Em 90, José Saramago chocou-me numa conversa com uma frase curta: a leitura nunca foi coisa de muitos portugueses. Mas eu julguei ser mágoa de Saramago. Ainda ele vivia para os lados da Calçada da Estrela.
Vítor Direito, que veio do Diário de Lisboa, da República e do A Luta para fundar o Correio da Manhã com muito sucesso, em 85 tinha-me dito: todos os dias os jornais perdem três leitores.
Hoje percebe-se que as palavras de ambos eram premonições.
Tirando o fenómeno pontual de José Rodrigues dos Santos, que anda nos 80 mil exemplares vendidos por título, os portugueses abandonaram jornais, livros, editoras e livrarias.
O amor por um livro ou por um jornal são hoje uma anedota.
Comprávamos livros no Círculo de Leitores a bochechos. Os livros iam substituindo os bibelôs nas prateleiras. E os jornais eram lidos e relidos, e serviam para embrulhar peixe, limpar vidros, envolver a panela de arroz e muito mais coisas.
Bebia-se uma bica, lia-se o jornal. Colecionavam-se os livros de bolso RTP, Europa-América e a Colecção Vampiro. Também se lia o Tio Patinhas e o Major Alvega. Lia-se tudo até a Crónica Feminina
O fecho agora anunciado da Editora Cotovia magoou-me porque André Jorge tinha um notável portfolio de 1500 título escolhidos com rigor elitista.
Adivinhava-se o fim. A Editora Cotovia tinha os dias contados, mesmo com a pragmática Fernanda Mira Barros ao leme. Assumiu a direcção da editora PARA salvar o amor de André Jorge.
Mas os tempos são de espuma. Para vender seria necessário fazer concessões. Como tem feito Moita Flores, que corre atrás dos leitores, tal como Alice Vieira, que já escreve pelas escolhas do patrão Leya, segundo diz.
Em sentido contrário teimam ainda José Luís Peixoto, José Água Lusa e Gonçalo Tavares.
Muitos escritores e os jornalistas ainda escrevem por amor às palavras, às personagens, aos leitores. Mas os leitores fogem, uns porque continuam a futilizar-se, outros porque se trancam num elitismo preguiçoso
Vasco Teixeira, patrão da Porto-Editora, afirmou sem paninhos quentes: basta abrir um manuscrito e ler 10 páginas para se perceber se um livro é bom. Há muita gente a escrever bem. A questão é saber se conseguem ser moda.
Um escritor escreve um livro para estar apenas 2 meses em exposição. Depois lixo.Venha outro livro.
Sem leitores não haverá escritores. Voltaremos em breve ao tempo das trevas, quando os livros eram lidos nas praças públicas e as notícias anunciadas com trompetas.
Obrigado Fernanda Mira Barros pelo esforço. Já é tarde para amar a palavra escrita com sentido e mestria. Chegou o Face, o Tinder e mais.
Quando se fecha o computador e se pega num livro… ups! Já é tarde para amar.
Às 8 da manhã toda a gente tem de começar a rotina.
E lá vamos, mas não vemos o futuro tenebroso que nos espera