O CORPO NO CHÃO, A PETIÇÃO

0
746
fotografia de Sofia Marvão

Mais do que as palavras ditas e escritas, tantas, dos últimos dias ficam-me as imagens. As imagens do vídeo que a Visão publicou. O corpo de Odair Moniz na calçada depois de alvejado pela polícia. O som de algumas vozes, os transeuntes no regresso a casa, a dolorosa e longa permanência de Odair no meio da rua. O olhar de dois agentes, jovens, hesitantes, perdidos, sem a capacidade de prestar auxílio, de verificar os sinais vitais de um homem, do ser humano que acabou de ser abatido. Será que se perguntariam como ali chegaram e o porquê? O que lhes foi dito durante a sua formação profissional sobre os lugares onde iriam trabalhar? Que narrativas, preconceitos, concepções enviesadas incorporaram na sua mente?

Depois, as imagens de um responsável da PSP na televisão a falar sobre a proteção das “pessoas de bem”. Onde é que este conceito existe na CRP ou em qualquer lei ou regulamento? Mais o comunicado oficial da PSP a justificar a ação como procedimento em “legítima defesa” e, mais tarde, o depoimento do próprio agente a contradizer a versão oficial. Nem o carro era roubado, nem Odair estava armado.

As imagens de políticos-abutres, na inversão chocante de defender “a condecoração” do polícia autor dos disparos e a defesa e o incitamento à necessidade de mais ações semelhantes, que é como quem diz, assassinatos à queima roupa.

Nos lugares, chamam-lhes “bairros”, cansados de tantas perdas e mortes sem sentido (o que aconteceu não é um caso isolado) e fustigados por tantas declarações-incendiárias, as imagens da revolta e da ira que alastram. Autocarros destruídos em geografias que tanto necessitam de acessibilidade e de transporte público. A ironia. Trabalhadores magoados em serviço. Ironia dupla. Mas quando a justiça tarda ou falha por completo, onde encontrar legitimidade para criticar o desespero e a revolta de quem foi esquecido e se sente abandonado? E uma outra vez, as imagens. Na manhã seguinte, eram os trabalhadores e os mesmos corpos de sempre, que limpavam os restos carbonizados, que apagavam os vestígios de noites de fúria e dor. Sobra sempre para os mesmos..

Por estes dias, uma última vez, a imagem. O medo dos mais novos em sair de casa e ir para a escola, as perguntas: “Achas que vai acontecer de novo?”, “Estamos seguros?”. No olhar, o reflexo de um mundo que não sabem como processar e um ciclo de violência que se repete. Que vergonha, que impotência que este ciclo de violência, de desigualdade, de opressão, não foi quebrado…

Ainda assim, o que podemos fazer? A VIDA JUSTA convocou uma manifestação em Lisboa contra a violência policial e de homenagem a Odair Moniz e a todos os cidadãos vítimas da violência policial e que foram mortos pelo Estado português. Há, também, uma petição pública a decorrer relativa a uma queixa-crime contra incendiários a quem pagamos mensalmente milhares de euros para incitarem ao ódio e não fazerem nada de útil e benéfico, e que, acredito, devemos subscrever: https://peticaopublica.com/mobile/pview.aspx?pi=PT122809

E lembrar sempre que “Sem justiça não há paz”.

fotografia de Sofia Marvão

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui