O “EUROASISMO” EM MARCHA

0
1377

Depois do negacionismo, do whataboutismo e de outras afrontas à inteligência e ao pensamento, chega-nos agora mais um alter-modernismo, o “euroasismo” que promete fazer da velha Europa, a das Luzes, um enclausurado periférico da robustez autocrática com centro em Moscovo e Nursultan. Não vale a pena ir ver ao google maps – Nursultan é a capital do Cazaquistão. E Nursultan Nazarbaev o seu eterno presidente, que governou três décadas e quando se foi embora deixou a família e um presidente-fantoche a tomar conta do país.

O primeiro grande acto de gestão “pós Nursultan” foi mudar o nome da capital, de Astana para o nome do velho ditador. Mais ou menos como se Lisboa agora se tivesse passado a chamar Cavaco Silva – “vives onde? Vivo no Barreiro mas como trabalho em Oeiras estou a ver se consigo comprar casa em Cavaco Silva” – dá para imaginar o modelito que nos querem impor.

E qual a importância de Nulsultan neste novo mundo de Lisboa a Vladivostok… aliás, do Cabo da Roca a Vladivostok? Muito simples, o velho Nursultan Nazarbaev foi o pioneiro da grande ideia da “eurásia” e Putin atribui-lhe tal crédito. A coisa ainda está em formação. Tem substrato económico, social, político e ideológico e, claro, também substrato militar. A guerra a que agora assistimos é, à luz da timeline da História, um episódio menor na retaliação contra um parceiro mal comportado, a Ucrânia.

Tudo começou a 29 de Maio de 2014 quando a Rússia, o Cazaquistão e a Bielorussia assinaram solenemente um tratado de União Económica com vista à criação da “Eurasian Economic Union”, antecipando a livre circulação de pessoas, serviços, bens e capitais e uma moeda única – já vimos isto noutro local. Depois Putin puxou para o grupo a Arménia em 2 Janeiro 2015 e o Quirgistão em 29 de Maio do mesmo ano – “está a acontecer!”, como dizia o do anúncio.

Assume também grande importância o substrato doutrinário e ideológico: o linguista Nikolai Trubetzkoy escreveu, “devemos acostumar-nos à ideia de que o mundo romano-germânico, com toda a sua força cultural, é nosso pior inimigo. Devemos derrubar e esmagar impiedosamente os ideais sociais e preconceitos emprestados do Ocidente, que sempre nefastamente influenciaram os nossos “intelectuais”…” e depois de atacar o Ocidente Trubetzkoy não pára, mais à frente desfere novos ataques aos “eslavófilos” e outros… Delicioso.

Para compreender tudo isto convém ler a obra (de onde retiro as citações) “Inside the Mind of Vladimir Putin”, de Michel Eltchaninoff, C. Hurst & Co. PublishersLtd., 2017, e ir directamente ao capítulo VI, “the Eurasianist Dream”. Está lá tudo o que temos vindo a assistir e o que (infelizmente) iremos ver a seguir.

Não vale a pena ir à Fnac pedir para vos enviarem um sms quando o livro chegar porque nunca irá chegar. Mas podeis facilmente “baixá-lo” como pdf, gratuitamente. Anda por aí na nuvem.

(crónica publicada também no Facebook de João Salvado)

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui