“O tribunal de família colaborou para que esta tragédia acontecesse. O assassino pagou 750 € à APAV para que a queixa fosse arquivada”, diz Amélia Santos quando procura explicar os antecedentes que levaram à morte dos seus dois filhos, Carla e Marcelo.
Em 2010, Carla vivia com Moisés Fonseca, de quem tinha um filho ainda bebé, quando foi vítima de um acto de extrema violência doméstica, com agressões físicas, tortura, sequestro, maus tratos contra a criança igualmente, que levaram à apresentação de uma queixa na esquadra da polícia contra Moisés.
Desta queixa resultou um processo judicial que, por decisão do Ministério Público, ficou suspenso por 18 meses mediante o pagamento de contribuição à APAV de 750 €, tal e qual se comprova pela leitura do despacho de arquivamento lavrada em 2012.
Talvez Moisés Fonseca se tenha convencido que também na Justiça os “pecados” se lavam com o pagamento de indulgências, à semelhança das práticas religiosas. Não sabemos. Mas sabemos que menos de dois anos depois, Carla e o irmão, Marcelo, foram mortos por Moisés na sequência de actos de extrema violência justificados futilmente por ciúmes e “direitos” de decisão sobre as vidas de Carla e do filho.
Depois do caso de violência doméstica acima descrito, as questões do poder paternal foram dirimidas pelo tribunal. Carla procurava manter uma relação cordial com Moisés, dado que era o pai do seu filho. Mas Moisés continuou a assediar Carla para que reatasse a relação conjugal que tivera com ele, o que dava origem a frequentes discussões e ameaças de Moisés sobre Carla.
O envolvimento de Marcelo na tentativa de ajudar a irmã, levou à morte de ambos, esfaqueados por Moisés, conforme o próprio confessou.
Não sabemos se estes crimes podiam ter sido evitados. É difícil controlar as decisões de alguém emocionalmente desequilibrado. Mas podemos exigir que os tribunais sejam mais competentes na apreciação dos factos e dos perpetradores. Um exame psiquiátrico pode fazer acender luzes de aviso que evitem o desenvolvimento de lógicas de violência. Também aqui a Justiça não foi capaz de defender os mais fracos e desprotegidos.
(continua)
Aqueles que estão à frente nos tribunais já estudaram todo um caso na altura do julgamento. Quando o arguido ou arguidos é composto por gente com muito poder, ou perigosa, normalmente eles recorrem a dois tipos de estratégia. Não condenam ou aplicam penas irrelevantes, ou então constituem um júri para se desresponsabilizarem por aquilo que for deliberado pelos jurados, como um plutão de fuzilamento. Alguns elementos deste júri nomeados ganham consciência e procuram então uma forma de também se escusem.
As notícias de todos os dias sobre as deliberações dos tribunais refletem o que eu digo. Hoje é notícia que os juízes estão contra que nas suas declarações públicas de rendimento constem moradas.
Uma justiça que é “Fraca com os fortes e forte com os fracos” porque “Dos fracos não reza a história”.
O Senhor Presidente da República, professor jubilado na matéria do direito, poderia ficar na história da justiça portuguesa se patrocinasse uma revolução no nosso sistema de justiça.