Estive duas vezes em Israel e na Palestina. Na primeira vez viajei bastante pelos dois territórios, fazia um documentário para a RTP sobre o 1º aniversário da segunda Intifada, a revolta popular palestiniana em que os resistentes atingiam os militares israelitas com pedradas,algumas lançadas através de fundas. Nessa primeira viagem entrei em Gaza. Foi no ano de 1989.
Voltei em 2014, para acompanhar uma ofensiva israelita sobre Gaza, no verão desse ano. Estava então a trabalhar para o canal Banda TV de Angola. Foi uma viagem bastante maus curta, na duração e nos percursos. Mal saí de Jerusalém. Não foi possível ir além de Ramallah e Belém. Todas as estradas estavam cortadas e os jornalistas precisavam de autorizações especiais do ministério do Interior israelita para ir a qualquer lado.
Sempre que estive naqueles territórios imaginei que se me levassem de olhos vendados para uma rua qualquer, tirada a venda eu saberia dizer se estava em território israelita ou palestiniano. A separação física das comunidades marca as diferentes paisagens. Um sítio de judeus tem uma estética diferente de um sítio de árabes, tem gente que veste roupas diferentes, que usa adereços próprios, que falam diferentes línguas. E como o apartheid ali não é treta, pratica-se mesmo, as diferenças são evidentes.
Desde sempre que os palestinianos resistem às ocupações de terras, à destruição das suas habitações, ao vandalismo dos colonos israelitas, aos assassinatos. Desde sempre. Nada do que se está a passar agora é novidade. A diferença é a escala da agressão que, desta vez, atinge dimensões nunca antes vistas.
Com a chegada de Trump à Presidência dos EUA, o perigo aumentou muito. Esta ideia de colonizar a Faixa de Gaza, expulsando a população, para fazer daquilo uma estância balnear, é algo que já está há muito na cabeça de alguns dos apoiantes de Trump. Ou seja, talvez a ideia nem seja dele.
O PLANO DE TRUMP JÁ TEM ANOS
Já em 2020, durante a primeira Presidência de Trump, houve um plano para o Médio Oriente muito focado em investimentos imobiliários de autoria do genro de Trump, Jared Kushner. Esse plano nunca seria aceite pelos palestinianos, porque reconhecia Jerusalém como cidade indivisivel e capital de Israel, reconhecia os colonatos ilegais na Cisjordânia como partes integrantes de Israel e impedia que o Estado da Palestina pudesse ter um exército. Não chegou a ser implementado, mas sabemos agora que a ideia ficou naquelas cabecinhas.
Outra evidência era a colonização israelita dos territórios palestinianos. Apesar de muitos palestinianos trabalharem em empresas israelitas, nomeadamente nos serviços, comércio e áreas agrícolas, as movimentações dos trabalhadores eram vigiadas pela tropa em multiplos checkpoints espalhados por todo o lado. Sempre houve zonas em que a presença de um palestiniano era considerada perigo iminente e a pessoa tratada como potencial criminosa.
E, no entanto, a mal paga mão-de-obra palestiniana encheu os bolsos dos patrões israelitas. Explorados mas sem alternativa, os palestinianos sujeitavam-se porque Israel nunca permitiu o desenvolvimento económico dos territórios ocupados, asfixiados económicamente pela ditadura administrativa israelita que impedia muitas atividades sob o pretexto da segurança. A pesca é um exemplo disto. Nunca os palestinianos puderam ir pescar a mais de uma milha da costa de Gaza e nunca puderam ter uma frota de pesca industrializada.
Muitos dos aliados de Trump apoiam projetos de colonatos em territórios ocupados. O ex-governador do Arkansas Mike Huckabee, um cristão evangélico que negou que os palestinianos existam como povo, viajou para Israel durante o primeiro mandato de Trump para colocar o primeiro tijolo num colonato ilegal na Cisjordânia. Na altura, disse que poderia “querer comprar uma casa de férias” ali.
E no final do primeiro mandato de Trump, Mike Pompeo tornou-se o primeiro secretário de Estado dos EUA a visitar oficialmente um kibbutz implantado em propriedades palestinianas expropriadas ilegalmente, onde os colonos produziam vinho a que puseram o rótulo de “Pompeo”.

Não se sabe é se o vinho terá qualidade para a mesa dos milionários que adquirirem propriedades na “Riviera” de Gaza, que Trump lhes vai vender.
ainda por cima o vinho deve ser uma treta.