Em Beja.
Numa bela tarde de Verão, em casa do Dr. Fernando Nunes Ribeiro, que foi Governador Civil de Beja, que escavou a villa romana de Pisões e reuniu relevante colecção de antiguidades, designadamente arqueológicas, estudava eu as pedras romanas com letras que ele guardara.
– E mais, dr.? Sabe de mais inscrições romanas por i? Fora das do Museu, claro! Tem ideia de um tal José Mendonça Furtado Lindo Januário, de que Abel Viana falou?
– Sim, era um antiquário daqui.
– Era?
– Sim, já não está cá. Abalou para as bandas de Tavira, dizem!
Tavira? Vamos lá! Um contacto com a Câmara, porque Abel Viana tivera o cuidado de dar o nome completo do senhor e poderia ser fácil, através dos cadernos eleitorais, por exemplo, saber dele. E soube-se logo, porque da Câmara rapidamente responderam. Abençoados! Conhecia-se bem o «Zèzinho da Beja». Morava no Monte da Guerreira, em Estiramanténs, freguesia de Santo Estêvão. Lá fomos. Recebidos com a maior atenção, mostrou-nos tudo o que fora ajuntando, mesmo aquelas moedinhas preciosas, que bem escondidas tinha.
Aí estudei, pois, duas inscrições da área de Beja, de que uma já mostrei na edição do dia 9 do Diário do Alentejo, com bem sugestiva ilustração de enquadramento da autoria do Dr. José Luís Madeira.
Trata-se de mui singelo epitáfio latino que diz assim (traduzo para português):
«A Monia, liberta de Leucínico, de 19 anos. Aqui jaz. Que a terra te seja leve».
Há, desde logo, um pormenor a prender a atenção: ninguém se identifica como promotor da homenagem; apenas se diz que a jovem foi liberta de Leucínico. Sua serva durante algum tempo, acabou Leucínico por lhe dar a liberdade, certamente devido aos seus bons serviços e, quiçá, imaginamos nós com a nossa mentalidade, por dela se haver enamorado. Tudo, porém, se nos mostra envolto em diáfano manto de discrição.
Mas… cadê a pedra?

A outra epígrafe deu entrada no Museu Municipal de Tavira. E esta para onde é que foi? A fotografia então feita é, pois, a única prova da sua existência. Acreditam em mim, que fiz a foto e a estudei; mas onde é que ora estará? Documenta, como vimos, o testemunho do uso único de dois nomes antigos; daí o seu interesse histórico. Vamos à cata dela?
«Depois de mim, que será do meu Museu?» – interrogava-se Zezinho da Beja em entrevista concedida ao conceituado jornalista Ferreira Fernandes de que se mostra praticamente só o cabeçalho e fotografia na página do Facebook do grupo «Penso, logo existe Tavira», com comentário exarado a 16 de Julho de 2018. Aí se preconizava uma acção camarária para salvaguarda do que ainda restasse. «O que ainda restasse»… Que o único comentário ao texto é de Rosário Afonso: «E tudo o vento levou…. Bye, bye, tesouro!».
Também eu fui obsequiado «com um figuinho e um copinho de aguardente», como se assinala nessa página; também eu tive ocasião de ver as «onze salas completamente cheias das mais variadas peças» – a Sala dos Candeeiros, a Sala Religiosa…; os quadros, os oratórios, os cristais, os marfins, os móveis…
Parte desse precioso espólio, uma parte pequena, deu entrada no Museu Municipal de Tavira onde está a ser devidamente inventariado.
Quem sabe se, um dia, os herdeiros põem a mão na consciência e se decidem a negociar? A memória do seu benemérito antepassado bem no merece!