“Quando a China despertar, o mundo tremerá!”.
Atribuída a Napoleão, sem fundamento científico que suporte a paternidade, esta frase significaria que o gigante adoemecido poderia acordar a qualquer momento e liderar o mundo. O número, leia-se quantidade de pessoas, é fundamental no poderio económico. Entretanto, a Índia já ultrapassou a China no número de habitantes.
Portugal é um país pequeno, com baixa densidade populacional e com um crescimento demográfico negativo. Isto é, a manterem-se todos estes factores, a prazo vai falecer, de morte natural. Morrem mais do que aqueles que nascem.
Estamos, hoje, em termos populacionais, tal como estávamos no séc XV. Em tudo o mais estamos francamente pior comparativamente. Liderávamos a ciência e a técnica, a construção naval, a navegação, a astronomia, a matemática. Em suma, a bem-dita Ciência. Éramos, aproximadamente, um milhão de habitantes.
O desafio que se nos coloca é voltarmos a ser, não os primeiros, mas a regressar ao grupo dos primeiros, aprendendo com as lições do passado. Todas as organizações em crise fazem uma reflexão em torno dos seus valores de criação, dos seus princípios orientadores e, a partir desse momento fundador, renascem.
Hoje, tal como ontem, a escassez de mão-de-obra tem que ser resolvida. No passado, foi a escravatura que a supriu, hoje tem que ser a imigração com direitos, apoiada no clima de segurança do país, na tolerância dos portugueses face ao Outro, ao diferente, assente na multiculturalidade.
No passado, fomos pragmáticos, fomos buscar os melhores que vieram pelo dinheiro que oferecemos mas trouxeram conhecimento efectivo. Não, não escrevo sobre Michael Porter, uma encomenda de Cavaco Silva datada de 1994, que descobriu no vinho, no turismo, no sector automóvel e por aí fora, “clusters”, vocábulo estrangeiro, à época, para seduzir os pacóvios com responsabilidades públicas. Sobre o Mar e as pescas nem uma palavra para um país que 97% do seu território é marítimo.
Temos pensadores suficientes que produzem saber, que acrescentam valor, que inovam, mas temos que ser rigorosos para não contratar peritos internacionais que nos vêm ensinar aquilo que já sabíamos. Se assim não for, corremos o risco de acabarmos a bater punho (para não ferir as susceptibilidades do leitor), como aquele ex-ministro que afinal não era doutor…
As cidades modernas competem umas com as outras, competem entre si pela atracção de empresas para os seus parques industriais, pela fixação de populações nos seus concelhos, pela fixação de pólos universitários nos seus territórios. Atraem novas gentes. A capacidade de conquistar o Outro, o estrangeiro de Camus, para vir viver perto de nós, para a nossa cidade, é um trabalho de todos. Era aqui que eu pretendia chegar.
O sociólogo Frédéric de Coninck escreveu L’Homme Flexible et ses Appartenances, O Homem Flexível, digamos, nas suas várias dimensões. Oferece-nos uma perspectiva de encarar e aceitar o outro nos desafios da modernidade. Haverá sempre um desvio entre as expectativas das novas comunidades que vêm viver para o nossos espaços e a realidade que lhe é oferecida.
O segredo da integração residirá, por um lado, na capacidade que essas mesmas comunidades terão de interiorizar, aceitar e conviver com a cultura do nosso povo. Por outro lado, teremos que lhes reconhecer o direito a circular, provavelmente de forma difusa, entre diversos papéis que são novidade para elas.
A flexibilidade é um ajustamento constante e pressupõe adaptações, mas também a vontade de conseguir alcançar. Os portugueses, quando mobilizados, já demonstraram possuir essas capacidades.
O autor escreve em português tal como o seu pai lhe ensinou, ao colo, a ler “Abola”.