Ao antigo primeiro-ministro Cavaco Silva reconhecíamos a argúcia e o calculismo, com que, como líder do PSD tirou o tapete ao governo de Bloco Central formado pelo PS de Mário Soares e o PSD de Mota Pinto, para se lançar na aventura de gastar os fundos europeus que se avizinhavam, depois do governo anterior ter assinado o Tratado de Adesão de Portugal à CEE em 12 de Junho 1985.
O governo do Bloco Central cai a 12 de Julho desse ano. Portugal ingressa em Janeiro de 1986, como membro de pleno direito da CEE. Cavaco Silva como líder do PSD assume o cargo de Chefe do Governo a partir de 6 de Novembro de 1985. Digamos que calculismo mais cirúrgico não deverá ter existido na nossa História, nem mesmo quando Dom Afonso Henriques resolveu mandar Afonso VII de Leão e Castela às ortigas, tornando-nos independentes do então reino vizinho.
Já como Presidente da República o Dr. Cavaco Silva teve um percurso bem mais desastroso. Eu diria mesmo infeliz. Apesar de ter alcançado dois mandatos, muito por culpa das elites socialistas que nunca desejaram contrapor antes da eleição para o segundo mandato, uma figura com a estatura ética e moral de um Jorge Sampaio, o facto é que já no final dos primeiros cinco anos como presidente, este dava sinais de imensa falta de credibilidade e sensatez, com aqueles episódios associados às suas participações financeiras na SLN – BPN. Mais tarde veio a “estória” da Casa da Coelha, no Algarve.

O último mandato do Dr. Cavaco Silva esteve rodeado de episódios grotescos, que vão desde o choradinho da sua reforma, aos Orçamentos de Estado recheados de inconstitucionalidades que foi deixando passar, sabendo ele próprio que aquilo dificilmente passaria no escrutínio do Tribunal Constitucional. Argumenta que o fez com a convicção do cumprimento das normas constitucionais, mas nunca convenceu ninguém disso, nem mesmo os seus correligionários de partido.
No plano ético e moral, o Dr. Cavaco Silva não me parece ser a pessoa mais abalizada para falar de outros políticos. Quanto mais não seja, porque alguns dos seus amigos mais próximos, que pela sua mão entraram nos seus governos, foram condenados na justiça. O ex-Presidente Cavaco Silva sabe muito bem, melhor do que nós próprios, que foi a mais alta figura do Estado da nossa democracia, mais rejeitada no final do segundo mandato, desde que ela existe. Saiu com índices de popularidade confrangedores, que o fizeram tornar-se numa pessoa irrelevante para a politica actual. Serve apenas de balão de oxigénio, um pouco como Mário Soares no tempo da Troica e de António José Seguro, para as hostes laranjas não se sentirem completamente perdidas.
Cavaco Silva apareceu ao longo destes oito anos, seja em eventos públicos, seja em eventos partidários, uma dezena de vezes, se tanto. Uma boa parte deles para se autojustificar nas suas enfadonhas narrativas, de como ele está acima de todo e qualquer mortal. Nunca ninguém o levou muito a sério, desde que abandonou o cargo presidencial, nem mesmo dentro do PSD, apesar das parangonas mediáticas, sempre desejosas de alimentar uma trica.
Mas desde que António Costa se demitiu com o processo de averiguações de que foi alvo por parte do Ministério Publico, o Dr. Cavaco Silva aproveitou esse ensejo para aparecer de forma quase semanal a fazer o seu ajuste de contas com António Costa e o PS. Para além de um comportamento a roçar a cobardia, não me revejo nesta mesquinhez tamanha, quanto a moralidades o Dr. Cavaco Silva não necessita de nascer duas vezes. Uma bastou-me para perceber como não passa de alguém que finge ser aquilo que não é.