ANTIGO COMBATENTE COM ALZHEIMER, o drama

Hoje publicamos uma mensagem enviada em jeito de desabafo. Servirá de exemplo sobre o que se passa com muitos dos nossos idosos, afetados por demências e sem o apoio social e clínico que mereceriam ter. E nas aldeias do interior é ainda pior que nas vilas ou cidades. Como poderão constatar, ao ler este desabafo.

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Uma tarde destas, o meu marido saiu de casa para ir, a pé, a uma rua ao lado da nossa. Voltou rápido porque o jardineiro que procurava não estava em casa. Meia hora depois, cerca das 5 da tarde, voltou a ir a casa desse senhor. Passou uma hora… Passaram duas… Eu tentei o contacto telefónico e ele disse que já vinha, que não me preocupasse… Mais uma hora e dizia o mesmo, o que já não me convencia. Insisti e acabou por me dizer que andava perdido pelos campos… que já tinha caído e que estava buscando os óculos sem os quais quase não consegue ver.

Decidi chamar a GNR e relatar o que se passava, dando as indicações que tinha: o número de telemóvel e a zona por onde andaria… E começou o medo. A GNR não dava com ele. Por telemóvel dizia que não via casas nem nada… Enfim!

Também não demorei muito a chamada, porque não sabia que carga ele teria e, sem carga, a GNR não poderia proceder à geolocalização… E assim estive… Sozinha, claro, com contactos esporádicos da GNR a dizer que nada podiam informar, que não davam com ele.

Passavam as 11 da noite quando mo trouxeram. Andou kms. Ele está habituado a andar muito… A lembrar tempos da guerra… E também por isso tem a mania velha de se meter por caminhos e veredas… Afinal, estava a quilómetros de onde devia estar.

Eu já saía pouco de casa, porque sei que ele não está bem… Início de alzheimer, tal como as irmãs… que já foram…Agora, depois disto, tenho medo de ir à mercearia da rua e ele fazer algum disparate em casa.

Ele nunca quis nem quer mudar de casa, vender esta e ir para a vila, que, sendo pequena, me era mais confortável por tudo. Não quer. Além disso, como de costume, ameaça matar-se e eu temo, porque na sua família é habitual. Uma das irmãs morreu por se haver atirado a um poço e a outra também tentou, mas acabou por ser internada num lar e rapidamente deixou de ter sequer possibilidade física de o tentar.

É assim que vivo ou sobrevivo. Eu nunca gostei de estar aqui… Esta terra é hostil para os de fora e ele, sendo de perto, é de fora porque não viveu aqui… Terei duas ou três amigas, mais conhecidas que amigas, a quem nem sequer me atrevo a pedir ajuda. Eu que tanto ria e brincava já não me reconheço. Sorrir é já um acto raro. Saio o indispensável, porque temo deixá-lo só. Vou agora tentar consulta com um outro médico, ainda que saiba que isto é apenas uma fase inicial . Ele tem medicação, mas, já se sabe, milagres não há!

1 COMENTÁRIO

  1. O número de demências, Alzheimer ou outras, tem aumentado de forma assustadora. Seria interessante, e é urgente, estudarem-se a fundo as origens e o que pelo caminho da vida as potencia.
    Conheço casos idênticos. Quase ninguém ajuda, uns por absoluta incapacidade, outros pela atitude egoísta de virarem a cara para o lado, depois de um irritante “tenha paciência”.
    Para esta senhora, que respeito no seu sofrimento, a melhor atitude é contactar a Associação Alzheimer, para saber como lidar com o paciente. Isso ela pode conseguir.
    E creio que será muito importante seguir as instruções que lhe derem.

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