Esteve lotado o Salão Preto e Prata do Casino Estoril para, na tarde de domingo, 16, assistir ao já tradicional Concerto de Ano Novo, dado pela Orquestra da Câmara de Cascais e Oeiras, sob direcção do maestro Nikolay Lalov. Uma iniciativa da Câmara (pela Fundação D. Luís I) e do Casino Estoril.
Foram interpretadas – como não podia deixar de ser! – valsas de Strauss e obras de Fr. V. Suppé, P. I. Tchaikovsky, A. Dvorák, R. Stolz e E. Doga. Já depois do repertório dado por concluído, o maestro regressou para – com a participação entusiasmada das palmas do público – a orquestra fazer ouvir a Marcha Radetzky, da autoria de Johann Strauss I, que, como tradicionalmente acontece no concerto de Ano Novo da Orquestra Sinfónica de Viena e agora também no Salão Preto e Prata, alegremente fechou o programa, após cerca de duas horas de mui agradável espectáculo.
Lalov quis dedicar o concerto aos músicos, aos compositores e aos intérpretes. Recordaram-se, por isso, no anúncio do concerto, as dificuldades havidas por todos estes profissionais em se adaptarem às novas realidades a que a pandemia obrigou:
«Foram descobertos o trabalho “on-line”, concertos “em streaming” e muitos amantes de música conseguiram satisfazer os seus gostos através das novas formas de assistir a um concerto. No entanto, não existem gravações sem músicos e não é possível realizar e transmitir um espectáculo sem os artistas reais a trabalhar».
E acrescentava-se:
«Apesar das grandes dificuldades e o desânimo provocado pela falta de convívio com o seu público, os músicos fizeram tudo para manter a sua arte viva e ajudar a população a ultrapassar as suas angústias e preocupações através da sua arte».
Tem Nikolay Lalov o hábito de anteceder cada trecho com uma explicação do que vai ouvir-se, entretecendo-a com histórias da sua vida e, desta feita, sobretudo, das vidas dos compositores, tudo relacionado com a força de vontade que é preciso ter para singrar na vida, da tenacidade a manter para se obter o desejável aperfeiçoamento. E, durante esta pandemia, as dificuldades agravaram-se, porque faltou o contacto, o convívio, a troca de impressões, o público!…
Alguém lhe comentou, por exemplo, que ser músico e não poder actuar, não ter o frémito da responsabilidade que a integração numa orquestra exige e o gozo íntimo que suscita é como estar na cama com… o retrato de Marilyn Monroe!
Daí o maestro ter saudado com regozijo, em seu nome e no dos músicos, a oportunidade que ora lhes estava a ser dada de se apresentarem em público. Via-se, aliás, em todos os rostos essa alegria, mormente quando, no final de cada trecho, se erguiam bem alto os arcos dos violinos!
Um perito em interpretação musical dissecaria agora não apenas a oportunidade (ou não) do programa escolhido; deter-se-ia na forma como o rapaz da percussão soubera ser rigoroso no xilofone, quando lhe foi dada a possibilidade de quase estar a solo e todos dependiam dele; salientaria, quiçá, as entradas fortes dos metais, em contraste com a suave doçura dos violinos; chamar-nos-ia a atenção para o dedilhar da harpa… Enfim, para um amante da música mas ignorante de erudições, estas duas horas em final de tarde de domingo soaram primordialmente qual melodiosa esperança de um 2022 melhor!…
Estava florido o palco, qual canteiro a sonhar almejadas Primaveras! O maestro rompeu o protocolo e ele próprio, a meio do concerto, distribuiu rosas aos músicos. No final, também ele foi obsequiado com vistoso ramo multicolor. E o público longamente aplaudiu, não regatou aplausos e saiu a cantarolar no íntimo, bem ritmada, a Marcha Radetzky…
As imagens que ilustram este apontamento devem-se a João Lamares que, graciosamente, fez mui completa reportagem fotográfica tanto do ensaio geral como do concerto. Bem haja!
Acabo de sair do concerto com a leitura deste texto.
O maestro Nikolay Lalov gosta de comunicar também por palavras. Conheço esse hábito de se dirigir ao público. E acho muito interessante essa particularidade que aproxima, através dele, a assistência dos membros da OCCO.
Vários sectores têm sofrido com os confinamentos e os músicos, as orquestras, são um dos que precisam do calor das palmas, tanto como os apreciadores de música, mesmo os que não são melómanos, precisam das variações melódicas dos vários instrumentos para enriquecer a vida.
Lamento ter perdido este momento que parece ter sido um raio de luz a anunciar um novo rumo. Muito grata pelo exto, José d´Encarnação, e pela possibilidade de apreciar o espectáculo pela transparência das palavras.