Ainda não eram 9h30 e já caminhava pela estrada que ladeia um dos muitos jardins quando deu de caras com a Fonte Mourisca. Não hesitou: foto com ela. (re) descobriu a sua Sintra de sonhos (ou de outras realidades…) enquanto continuava a caminhar., e ainda mal tinha começado. Ainda era cedo, ainda o centro histórico tinha poucos turistas, e já a primeira paragem: NewsMuseum. O museu dedicado ao jornalismo e aos media é de pequena dimensão mas com moderna estrutura: um estúdio onde as mais jovens gerações podem simular a apresentação noticiosa, modernos equipamentos que ombreiam com evocações do passado e informação transmitida por meios que tanto evocavam as novíssimas tecnologias da realidade virtual como equipamentos antigos prestes a cumprir um século de existência.
Em destaque, do rés-do-chão até quase ao teto, uma espiral em ferro com pequenas luzes sustenta vários ecrãs que mostram reportagens de várias estações televisivas pelo mundo, Portugal incluído, peças sobre a pandemia do maldito coronavírus. Nome da instalação (em todos os monitores)? Pandemedia. E a casa de banho? Nunca um WC deu tanta vontade de rir: nas portas, escritas as gaffes de títulos menos felizes em termos jornalísticos puros – mas anedotas de todo o tamanho. E sem falar na All of Fame, uma reprodução de vídeos de momentos, digamos, menos bem conseguidos nos telejornais e programas de entrevistas também de todo o mundo, onde desfilam desde aquela comediante norte-americana que “passou um sermão” a uma pivot que a tentava entrevistar, até àquele debate algures num país (de Leste? Do Médio Oriente?) onde, em vez de se trocarem argumentos, se trocaram socos e até a bancada voou no estúdio de televisão.
A seguir, Palácio Nacional de Sintra. Sim, os bilhetes custam caro, sim, a conta bancária vai ficar mais vazia, mas ela queria desfrutar do dia dela. E o deslumbre ainda estava a começar: os salões, a Arte, a História, enquanto ela se misturava de forma discreta num grupo de turistas que ouviam obedientes o guia a falar em inglês. Que pasmo!, o relógio de sala com mais de um século que ainda dá horas certo e direito. Que maravilha, as salas, incluindo a famosa Sala das Gralhas (ou das Pegas – o pássaro, senhoras e senhores, o pássaro!) onde Dom João se vingou das damas da corte palradeiras que fizeram piadas com o facto de ter sido apanhado pela real inglesa esposa aos beijos com outra senhora. Que encanto, os recantos pequenos e discretos mas agradáveis, e o jardim simples mas aprazível, já com vista para o Castelo dos Mouros, próxima paragem a conquistar. Que o foi, após um breve descanso noutro jardim, sentada perto de um dos tanques de água que durante anos lavaram reais roupagens.
Após uma viagem de autocarro aos avanços e recuos, cheia de turistas e sem o desejado wi-fi, eis que ela chega à entrada do Castelo dos Mouros. Mais um bilhete, mais um gasto, mais um desafio. Benditos ténis-sapatos, que o caminho (não sendo de cabras) é cheio de pontos de interesse arqueológico mas complicado de andar… ai sim? Esperem até subir aquelas escadarias ao longo da muralha. Poucos se atreveram a chegar ao topo, ao ponto mais alto, à torre cimeira. Ela nem por isso, que a idade e o joelho já refilavam (e ela a mandá-los calar, bendita máscara que disfarça quem fala sozinho). A vista, de cortar a respiração. Ao fim da visita, mais uns minutos de repouso, e uma viagem (inesperada) de tuk tuk depois, bastam dez minutos no centro histórico para perceber a massificação em curso do turismo: preços hiperinflacionados (até um simples travesseiro na Piriquita!), músicos de rua que só cantavam em inglês, vendedores de bugigangas e empregados da restauração que miravam os transeuntes qual ave de rapina, que o negócio está mal e cada potencial cliente é contabilizado pelos gerentes/patrões.
A ela, o orçamento apenas permitiu comer à pressa numa dessas cadeias multinacionais de pizza rápida, antes de ir para o autocarro e correr atrás do tempo para chegar a tempo à tão sonhada visita: Quinta da Regaleira. Chegou atrasada (evitar imprevistos, não é?) e prestes a deitar os pulmões pela boca enquanto pedia desculpa pelo atraso – mas porque é que obrigam a dar a Volta à Regaleira a Pé por Ladeiras para aceder à entrada?! – e se preparava para ouvir, atenta e educada, as sábias explicações do guia, que guiou o grupo de visitantes não só pelos espaços da Quinta, como por factos e curiosidades sem par. Uma sugestão: mente aberta, esvaziada do que se passa para lá daqueles muros, porque o encantamento, a História, a Ciência, a Arte, entram-nos pelos sentidos adentro naquele que é um espaço único na Europa Ocidental.
Apesar da beleza das fontes, dos jardins, da curiosa estufa deixada em herança por um apaixonado pela Botânica, da capela tão magnífica como pequena, dos próprios caminhos, claro que as joias daquela esplendorosa coroa são duas. O Poço Iniciático, cujo túnel escavado nas rochas esconde simbolismos e histórias, e o palacete, obra única que por vezes precisa de um ou outro restauro, onde os visitantes da tarde foram brindados por um recital de piano (o nome do músico escapou à atenta visitante) cujo som saía de uma das magnificentes salas do palacete ímpar por onde os turistas passavam, de forma mais ou menos ordeira, mais ou menos atenta a cada sinal de História ou de Cultura. Todas as palavras já foram escritas, mais vale estar lá e sentir o espaço.
Já não deu tempo para ver outros sítios, que ficaram para outra ocasião (que venha ela): o Palácio e o Parque da Pena, a Vila Sassetti, Monserrate, Seteais, o elétrico até à Praia das Maçãs, que já está a caminho dos 125 anos e circula bem e recomenda-se… adoçou o desgosto de ter de regressar com umas queijadas na mala antes de apanhar os transportes para casa.
Ao regressar à vida real pensou: conta bancária mais vazia, mas alma mais cheia.