Amiúde se usa a palavra «diferente» quando se não sabe exatamente como é que se deve classificar um evento e, porventura, também assim se capta a atenção do leitor. Neste caso, porém, o qualificativo tem toda a razão de ser.
Primeiro, porque o cenário, ainda que do Salão Preto e Prata, foi mesmo diferente do habitual, pois que se retiraram as cadeiras da plateia e ali se ajuntou uma multidão que, assim de perto, vibrou intensamente com a actuação de João Pedro Pais. Depois, porque o cantor soube, do princípio ao fim, criar intensa empatia com as largas centenas de admiradores que o foram ouvir. Estava repleto o salão!

Acompanho João Pedro Pais desde os seus primeiros passos. Uma actuação nas Festas do Mar, em Cascais, nos anos 90, seria? E sempre ele acabou por ser o jovem despretensioso, que até parece que pede licença para cantar. Cativa pela maneira de ser, cativa pelas letras do que canta. E isso intensamente se sentiu no concerto da noite de 31 de Janeiro. Estava-se em sintonia.
«Conta-me histórias de tempos / A que eu gostaria de voltar / Tenho saudades de momentos / Que nunca mais vou encontrar / A vida talvez seja só três dias / E eu quero andar sempre devagar / Até a ti chegar. / Ninguém é de ninguém / Mesmo quando se ama alguém»…
«Quando tu me pedes eu dou / Onde tu me levas eu vou / Tudo que me fazes é bom / Só eu sei / Que fazes falta aqui».
«Ando louco / Tão louco / Louco por ti / Fico louco / Tão louco / Fora de mim».
Confidências de amantes. Palavras dele e que, sem dúvida, poderiam ser de muitos dos que ali o foram ouvir e, em uníssono, sem peias, em comunhão (dir-se-ia) com ele quiseram cantar.
Juntou-se a ele, em determinado momento, Luana Ferreira, para interpretar «Dava tudo», um tema da mãe, Adelaide Ferreira, que, da plateia, também cantou, como que a simbolizar a vontade de todos os espectadores ali ficarem a noite toda a cantar.

Essa foi a atmosfera, a noite toda (repito), do princípio ao fim, duas horas sem interrupção. E quando, já oficialmente encerrado o alinhamento previsto, se começaram a ouvir os acordes de Mentira – «Acreditar que no amor / Não se sente dor / Mas é mentira! / Mentira, mentira!» – o entusiasmo não esmoreceu.
O relógio da senhora a meu lado bem avisou, mais do que uma vez, em irritantes letras luminosas: «Ambiente muito ruidoso». Não lhe ligámos importância. Coitada da «inteligência artificial»: não sabe a diferença entre ruidoso e… caloroso, no mais completo sentido do termo!

(Fotos gentilmente cedidas pelo Gabinete de Comunicação da Estoril-Sol)
Havia umas cadeirinhas sentadas, presumo.
Estar ali duas horas de pé, não é para jovens de todas as idades. Mas confesso que certa vez no Coliseu, tão doente que julgava não conseguir dar dois passos, dancei até saltar em todo o espectáculo de Ney Matogrosso. E quanto terminou, só me apetecia assobiar (coisa que não sei fazer) e pedir que repetisse a dose.
A música, ou a identidade com alguns músicos, consegue o milagre de nos fazer voar, um poder curativo que se poderia procurar mais vezes, sendo possível.
Esse Salão Preto e Prata tem muito para revelar…
Muito grata.