Coisas da morte na fé católica

AS “ALMINHAS”. OS PURGATÓRIOS PINTADOS.

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Alminhas e espigueiro em Vilarinho da Samardã, Portugal
Ora havia lá (e há ainda) umas Alminhas.
Com um painel antigo sobre o oratório,
Que são as almas a penar no Purgatório,
António Nobre in

As Alminhas são a mais singular forma que o povo cristão encontrou para lembrar os seus mortos, os irmãos desprendidos da vida, corpo e alma separados por um tempo.

São quase sempre velhas pedras talhadas como capelinhas ou cruzes. Estavam antigamente postadas à beira dos caminhos onde passava a gente, aproveitando boa parte das vezes as encruzilhadas.

Alminha localizada na aldeia de Cabeça, Seia

Eram memorial. Encerravam a lição do Purgatório. Como catequese, queriam dizer que todos os homens eram filhos de Eva, assinalava-os o carisma da fragilidade, que todos provaram o fruto proibido, macularam a vestimenta da alma quando passaram pela terra que ficava já “A Leste do Paraíso”.

A origem desta devoção, que ganha foros de popular apreço, tem a sua origem na XXV Sessão do Concílio de Trento (1563) que redefine o dogma da existência do Purgatório, segundo a lição da Sagrada Escritura, a tradição dos padres da Igreja e a palavra de anteriores Concílios. Reafirma a capacidade de sufrágio dos fiéis vivos através dos privilegiados instrumentos que são a Missa, a Oração e a Esmola. E confia aos bispos o encargo de diligentemente pregarem por toda a parte a sã doutrina do Purgatório.

Alminhas na Serra da Ermida, Sever do Vouga, Aveiro

A Sociedade de Jesus e a Ordem do Carmo assumem a missão de veicular esta verdade confirmada.

Mas são as Confrarias das Almas quem vai fazer chegar ao grande povo esta devoção e nela radica esse incremento de uma devoção popular, que encontra uma poética concretização nos minúsculos oratórios espalhados pelos quatro caminhos, sobretudo os do mundo rural, contendo muitas vezes uma tabuinha pintada com uma piedosa cenografia, que representava as almas dos crentes mergulhadas num mar de fogo de onde, cumprido o tempo, anjos as transportavam às ordens de uma Virgem do Carmo ou de um Santo de particular devoção, quando não de um Cristo Crucificado.

Multiplicadas, cumpriram seu mester quase até ao nosso tempo, que praticamente as esqueceu, abandonados que foram os caminhos antigos, ainda que às vezes nos surja numa curva de caminho o resto de uma vela que ali se acendeu ou um ramo de flores que depressa murchou.

Desapareceram os cofrezinhos onde caíam as esmolas. que permitiriam celebrar missas pela intenção dessas almas ainda sofrendo.

Património do povo, cuja alma ali demora, muitas permanecem nos velhos lugares ou, a instâncias de autarquias ou Associações de Património que vão concretizando seus inventários, transferidas para novas vias, ganham o estatuto de ingénuo monumento que faz lembrar a legenda antes inscrita numa tabuinha:

Ó VÓS QUE IDES PASSANDO,
LEMBRAI-VOS DE NÓS QUE ESTAMOS PENANDO.

Devoção bem portuguesa, as Alminhas!…

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