PESCADORES SALOIOS

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Pouco se sabe dos costumes saloios sobre a pesca. Uma das causas dessa ausência de informação deve-se ao facto de as comunidades de pescadores que habitavam nos portos de Cascais e Ericeira se não identificarem com a comunidade saloia, mas sim com as colónias de pescadores que habitavam o litoral português, entre Caminha e Vila Real de Santo António, de onde sempre se consideram originários.

A relação entre os saloios e os pescadores limitou-se, durante séculos, à troca de serviços entre as duas comunidades, sendo duas as fundamentais:

– O aluguer, por parte dos saloios, de animais de trabalho para o transporte das embarcações e dos apetrechos de pesca entre a borda de água e as áreas de resguardo durante o inverno;

– A venda de peixe aos almocreves saloios, que, por sua vez, o vendiam nas povoações mais afastadas dos portos de pesca.

No entanto, os saloios, homens do campo, sempre praticaram a pesca e continuam a praticá-la, não como uma profissão mas como uma atividade complementar de subsistência ou, mais modernamente, lúdica, como pode ver-se na gravura de João Pedroso Gomes da Silva, que retrata o Cabo da Roca e onde se vê um saloio, certamente da Azoia, junto à Praia da Ursa, com uma cana de pesca ao ombro, em 1862.

gravura de João Pedroso Gomes da Silva

Uma das descrições mais antigas que existe acerca do hábito saloio da pesca deve-se a Duarte Nunes de Leão, na sua obra póstuma sobre o “Reino de Portugal”, em 1610, onde se faz referência aos saloios de Almoçageme e Colares, que iam à pesca na base da Pedra de Alvidrar, a sul da praia da Adraga:

“Dizia-nos de seguida que existiam alguns homens que já lhe estavam habituados. Homens que a esse rochedo tão alto como uma torre, já estavam habituados, por desde moços irem pescar ao mar, levando na mão esquerda um facho (para iluminar a galeria da gruta que levava ao mar) e um cesto metido pelo braço, e na direita uma cana, os quais se dali caíssem se fariam em mil pedaços nos medonhos e acutíssimos penedos que no baixo estão”.

Nos inícios do século XIX, o viajante sueco Carl Israel Ruders descreve o mesmo costume:

“[…] Rapazes do campo que viviam em baixo, na povoação (Almoçageme), começaram a descer tranquilamente por esse precipício (da Pedra de Alvidrar), agarrando-se e apoiando-se em pequenas saliências, que mal se distinguem na rocha, cortada a pique sobre o Oceano! Chegando abaixo, rente ao mar, trepavam de novo pela mesma forma e pelo mesmo caminho. Este exercício, feito, ao que parece, para passatempo dos viajantes, serve mais para aterrar do que para divertir. Um passo em falso, o menor desvio, e seria a morte, uma morte horrorosa, a recompensa dessa temeridade, se se despenhassem sobre esse amontoado de rochas pontiagudas. Terminado o perigoso exercício, pedem a competente retribuição. Os habitantes dessa povoação marítima vêem com satisfação a chegada de excursionistas; ganham então mais dinheiro, e mais rapidamente, do que quando, forçados pela necessidade, têm de descer esse perigoso caminho para ir à pesca.”

Nos inícios da década de 80 do século passado, fizemos por duas vezes a descida da Pedra de Alvidrar para entrar na gruta existente, no lado meridional, a meio da grande laje, com um grupo de escuteiros. Descemos então a caverna até ao mar, onde as ondas banham as rochas frente à galeria, pesqueiro saloio com centenas de anos.

Quem está no topo da escarpa fica impressionado, pensando que é muito perigoso, mas posso garantir que é bastante simples e seguro, pois existe um pequeno carreiro com cerca de 40 centímetros de largura que vai do topo até à entrada superior da furna,

Lota da sardinha na praia de Cascais em 1941. Fotografia de João da Cruz Viegas.

fontes: Inácio de Vilhena Barbosa (1862): Cabo da Roca – desenho e gravura Pedroso. Archivo Pittoresco. Lisboa, p. 329; Miguel Boim (17/9/2021) «Lendas e factos lendários de Sintra. Até à Pedra de Alvidrar (2.ª Parte)»; Jornal de Sintra, n.º 1609. Sintra, p. 2.

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