Mensagem de um repórter que morreu ontem, para o seu editor no canal Al-Jazeera.
“Deixa-me dizer-te, meu amigo, que já não sei o sabor do sono. Os corpos das crianças e os gritos dos feridos e as suas imagens encharcadas de sangue nunca saem do meu pensamento. Os gritos das mães e os lamentos dos homens que sentem falta dos seus entes queridos nunca se silenciam na minha cabeça..
Não aguento mais o som das vozes das crianças debaixo dos escombros, nem esqueço a energia e o poder que reverbera a cada momento, transformando-se num pesadelo. Já não é fácil para mim estar diante das fileiras de caixões, que estão trancados e estendidos, ou ver mais os mortos do que os vivos que lutam contra a morte debaixo das suas casas, sem encontrar uma saída para a segurança e a sobrevivência.
Estou cansado, meu amigo…”
Isma’il Al-Ghoul,
Correspondente da Al Jazeera em Gaza
Cada bomba mata… dois jornalistas palestinianos em Gaza
Os jornalistas Isma’il Al-Ghoul e Rami Al-Reefi foram mortos quando um drone israelita foi dirigido contra o veículo em que viajavam na rua Aidiya, a oeste da Cidade de Gaza, segundo publicam meios palestinianos.
Pouco antes de terem sido mortos, tinham feito reportagem na casa destruída de Isma’il Haniyeh no campo de refugiados de Al-Shati, o líder do Hizbollah que foi morto a noite passada num atentado em Teerão.

Esta terá sido a última imagem captada por Rami Al-Reefi, o repórter de imagem que trabalhava com Ismail, que a publicou nas redes sociais.

Isma’il Al-Ghoul (à esquerda) era repórter e Rami Al-Reefi repórter de imagem. Ambos trabalhavam para a Al Jazeera.
Com mais estas duas mortes, somam 177 jornalistas assassinados em Gaza em ações militares israelitas, desde outubro do ano passado.
Quando me aparecem imagens horríveis do Holocausto, pergunto por que tantos homens, mulheres e crianças foram exterminados? Qual era o crime que tinham cometido?
Neste caso, em que morrem selectivamente homens que estão a trabalhar na sua profissão, pergunto por que razão, havendo tantos recursos?
Pertenciam a organizações terroristas? Primeiro talvez se devesse avaliar através da justiça, depois então agir-se mediante um julgamento justo.
E voltando a perguntar, agora não a uma nação alucinada como a que vivia sob o regime nazi, mas a homens inteligentes que sabem identificar os inimigos, por que insistem na morte indiscriminada de civis, homens, mulheres e crianças que não cometeram crime nenhum? Todos os humanos (ou quase todos) querem respeito, afecto e paz.
Não será tempo de criar as condições para que ela exista?