Considerado obsoleto, e mesmo uma limitação ao progresso, há décadas que o sistema monetário desprezou os padrões em que sempre assentou a economia, baseado na troca de moedas circulantes garantidas por reservas em minérios nobres.
Cedendo às crescentes exigências de um mercado que até apostava na sua própria autorregulação, a ciência económica entendeu creditar um novo modelo, garantido por entidades oficiais supostamente isentas e dependentes de poderes políticos insuspeitos. Uma opção que valorizava sobretudo a riqueza produzida e que, embora respeitável, acabou por promover um desequilíbrio incontrolável no deve/haver de muitos Estados que, em vez de prevenirem, antes potenciam os “vírus” da desregulação financeira que presentemente fazem temer pelo futuro da Humanidade.
Como uma doença que se instala lentamente, o rigor da ciência económica deixou-se inquinar por artes que admitiam todos os estilos de engenharias, com as cotações e paridades a dependerem não já de matemáticas puras, mas de “gramáticas” impostas pelo crescente braço-de-ferro entre as principais potências. E, de profundas mistificações em grosseiras falsificações, assim se caiu num descontrolo que conduziu a conflitos inúteis, agravou a desconfiança entre Estados e levantou obstáculos à execução de planos consequentes de desenvolvimento económico à escala global, o sonho de alguns “líricos”.
Interiorizada a noção de que os poderosos poderiam emitir moeda sem limites, e perdida a confiança num sistema que também escancarou as portas à corrupção, em 2009 aconteceu o impensável: o aparecimento de moedas virtuais, emitidas e “avalizadas” por entidades sem rosto e sem alma ou, sequer, uma pátria ainda que de “vão-de-escada”.
Este novo esquema de “mineração” assentou em quatro “criptopilares”: o embuste da contabilidade mundial; a ascensão de centrais de interesses que crescentemente controlam as decisões políticas de inúmeros governos; a vertigem da evolução informática; e, finalmente, o recurso a confabulações e algoritmos indecifráveis, adubo fácil para alimentar essa paranoia ancestral que é a obtenção de dinheiro fácil.
Toleradas de início em alguns países, as criptomoedas depressa ganharam fôlego e se internacionalizaram, já hoje circulando livremente em quase todo o mundo, onde, real e virtual tudo à mistura, até gozam de “paridade” com moedas oficiais: uma contaminação que prossegue e que não ocorre somente em “repúblicas de bananas”, como El Salvador. Com os EUA indisfarçavelmente por trás, também as bancas europeias e portuguesas, pretensamente “seguras” por entidades públicas e privadas que, em conluio, nunca reagiram a tão gigantesca fraude e continuam a alimentar este monstro, interessadas que estão em apagar as pegadas dos seus próprios erros e crimes e, futuramente, em retirar colossais dividendos da implosão do periclitante sistema financeiro internacional.
Por insólito e danoso, este esquema “dona-branca” tem merecido forte atenção por parte das agências responsáveis pela coleta de informações e pela aplicação das leis, sendo também alvo de preocupação de movimentos defensores dos direitos dos cidadãos e da transparência das Instituições, à escala global. Um controlo na prática impossível porque, protegidos pelo anonimato e até por escritas encriptadas, esses emissores de moedas fictícias se acobertam em vazios legais e paraísos fiscais, suportados por instituições bancárias com uma gestão tão opaca, como cristalina é a proteção fornecida por fortíssimos poderes político-económicos, à espreita do terramoto.
E não se trata de teoria da conspiração, porque algumas dessas moedas virtuais até já se esfumaram, alegadamente vítimas de pirataria informática e de outros obscuros esquemas. À vista de todos, desenvolve-se hoje claramente um “apagão geral” de todas as contas bancárias à escala planetária, um assalto às voláteis poupanças dos cidadãos: um “balão de ensaio”, excelente para banqueiros, mas de consequências terríveis para o povo em geral, que até já foi lançado com sucesso há poucos anos, no minúsculo Chipre. E a mesma tragédia já ameaça tornar-se inevitável em todo o mundo, sem que os Estados soberanos, salvo a China e poucos mais, promovam medidas eficazes para travar uma disrupção sem precedentes e que até irá comprometer o futuro dos serviços de saúde e de segurança social, públicos e privados.
Ultrapassada a Covid-19, e enquanto se avizinha esta nova catástrofe, como reage o nosso Portugal, eternamente desfasado das realidades e refém duma Europa que, sem atar nem desatar, se encontra dividida e até ameaçada pelo eixo anglo-americano?
A nossa classe política, sempre atrás de prebendas e migalhas, desmultiplica-se numa grotesca discussão orçamental sobre a “massa insolvente”, enquanto a sua Presidência anula a “centésima” visita de Estado, desta vez a Tenerife, a ilha ideal para se observar o vulcão em curso. Razões enternecedoras obrigaram certamente a tão grande “sacrifício”: desde a esperada morte de mais um “amigo”, à inesperada homenagem a um ministro tão desastrado em acelerar nas autoestradas, como a travar os imbróglios com as Polícias e os fartotes em torno dos incêndios florestais.
E enquanto amordaçadas, quiçá temerosas, as nossas elites nem se atrevem a denunciar a ineficácia duma bazuca europeia, notoriamente apontada para alvos errados, a sempre “atenta” comunicação social, indiferente à crise financeira que abala o mundo, entretém o Tuga com a interessante telenovela dos “Pandora Papers”, uma “fofoca” de milhões que, ocorrida há mais de dez anos, jamais merecerá qualquer justa punição neste país que faz de conta que existe justiça.
É a vida, dirão alguns poucos portugueses mais “hábeis” que, em condomínios à prova de terremoto, aguardam placidamente pela sua hora de “reconstruir o mundo”.