Parques urbanos
Criaram-se, felizmente, por toda a Cascais (pode dizer-se) parques urbanos. Já tínhamos, na vila, o Parque Marechal Carmona, verdadeiro coração verde, e o Parque Palmela. Este, embora escondido por trás daquelas bisarmas, oferece motivos que bastem para aliciar a uma visita, dotado como está de adequados equipamentos para bons instantes de lazer. Aliás, como que envergonhadas do seu descomunal volume, as bisarmas deixaram medrar árvores e plantas nos interstícios, aliciaram o passante com o bonito jardim fronteiro e possibilitaram aquela fresca entrada para o parque propriamente dito. Todavia, ainda se mantém parcialmente encoberto por painéis publicitários o bosque de dragoeiros, único em Portugal, uma jóia que a burocracia camarária ainda não logrou mostrar na sua plenitude, apesar dos sucessivos apelos.
Mas há mais, nesta zona ocidental cascalense! Ainda no perímetro da vila, o Parque do Outeiro da Vela e o Parque Urbano da Ribeira dos Mochos, junto ao Bairro do Rosário. Deste se concretizou já a continuação, ainda sem nome próprio (‘Parque Urbano da Pampilheira’, porque não?), entre a Avenida Raul Solnado e a Rua Gomes Leal – e ficou bem esse vale, nicho ecológico de muita passarada.
Para nascente, outro vale existe, o da Ribeira das Vinhas e também ele foi arranjado com passadiços até quase à 3ª circular. O Município vai aceitar a doação duma azenha e será bem agradável, daqui a uns tempos, continuarmos a passear por esse leito e vermos, de vez em quando, se tal for possível, a azenha a funcionar.
Um parque mui diferente
A plataforma sobre o Rio Marmeleiro, em Murches, onde funcionou o campo de tiro aos pratos, foi judiciosamente aproveitada para se criar o Parque Urbano Penhas do Marmeleiro.
Nome bem dado:
1º) Porque, lá ao fundo, corre o leito do «Rio» Marmeleiro, nome do curso de água que terá, a jusante, a (mais conhecida) designação de Ribeira das Vinhas, atrás referida. Foi a abundância de marmeleiros que medram nas suas margens que lhe justificou o nome.
2º) Porque a vista que dali se abarca se estende penedias além, em graciosa cadência de sucessivas colinas.
Há simpático parque para a pequenada brincar, inclusive «aos índios e aos cowboys, porque se construiu, para o efeito, um castelo amuralhado!… Contudo, o aliciante será, sem dúvida, não resistir à tentação de ir por aí fora, pelos coleantes passadiços a proporcionarem inesperados ângulos de visão, em atmosfera sem ruídos e pejada de bem selvagens fragrâncias.

De «matos» se falou no título. É verdade. Mato é essa infindável variedade agreste, livre, espontânea de arbustos rasteiros, ricos em tonalidades, poiso predilecto do pássaros que por ali esvoaçam satisfeitos, aí nidificam e se alimentam. Tojos, madressilvas, carrascos e suas bolotas, troviscos e suas bagas vistosas, silvas a oferecerem amoras no seu tempo, murtinhos de acres frutinhos azuis, zimbros a sonharem com a possibilidade de os seus frutos virem a aromatizar uma boa aguardente ou a confeccionar seleccionado perfume… Todos ali serenamente convivem, oferecendo a sua singular beleza a quem a souber apreciar.
E as flores? Ele são lírios roxos e o amarelo dos montes, orquídeas, as campainhas amarelas, a erva mosca, as bocas de lobo, as alcachofras, as margaridas do monte!… E as ervas aromáticas – como a nêveda (ou erva-das-azeitonas), os orégãos, o funcho?…
Não, não estou a inventar! Apenas respiguei alguns nomes (dos meus mais conhecidos) do extensíssimo rol de plantas que constituem «a composição florística dos carrascais», apresentada pelo professor catedrático do Instituo Superior de Agronomia, Doutor João de Carvalho e Vasconcellos, no livro Vegetação Natural do Concelho de Cascais, páginas 12 a 16, bem densas!… Uma das preciosidades bibliográficas que integra a – nunca por de mais abençoada! – colecção do VI Centenário da Vila de Cascais, editada pela Câmara Municipal em 1964.
Amiúde se pensa, aquando dum incêndio: «Ardeu só mato. Não houve problema de maior!». Sim, é verdade: esta vegetação espontânea tem alma para depressa se recuperar; no entanto, é com essas devastadoras chamas que um manto ímpar num ápice se esvai, um equilíbrio da biodiversidade que assim desesperadamente fenece e que mereceria, decerto, estudos mais aprofundados.

Visitar sem pressas as Penhas do Marmeleiro, a respeitar o silêncio envolvente, puro bálsamo para a velocidade em que se nos desgastam os dias.
Adorei a leitura desta revisitação dos parques do concelho de Cascais da autoria de José d´Encarnação. Apesar de conhecer quase todos, aprendi pormenores que complementam as informações prática e teórica que já tinha. Gostei particularmente da expressão “aquelas bisarmas” para classificar os exemplares de arquitectura de duvidoso gosto do Estoril Sol Residence, que encobrem o bosque de dragoeiros. Único em Portugal? Não sabia. Mais surpreendentes são os detalhes sobre as Penhas do Marmeleiro que já rondei, mas não conheço. Que bela descrição, apoiada num livro que gostaria de obter, sobre a variedade da flora nessas colinas ondulantes. A pureza aromática (e cromática também) das ervas do campo, entra-nos pelos olhos e pelas narinas à leitura de cada palavra, de tal modo que já combinei uma visita em grupo. E entristece que o flagelo dos incêndios ameace também estes pedaços virgens da Natureza e o “equilíbrio da biodiversidade”.