Foi anunciado hoje um acordo para um cessar-fogo permanente em Gaza, alcançado após intensas negociações mediadas pelos Estados Unidos, Egipto, Qatar e Turquia. Trata-se de um acordo faseado, embora, para já, apenas a primeira fase tenha sido detalhada: prevê a libertação de todos os reféns israelitas — vivos e mortos — em troca da libertação de milhares de palestinianos detidos em prisões israelitas, incluindo mulheres e crianças. Recorde-se que Israel detém centenas de menores palestinianos, muitos sem julgamento. Prevê a retirada parcial do exército israelita e a reabertura de uma “passagem” para o Egipto e o fornecimento de ajuda humanitária.
Nas redes sociais palestinianas, enquanto muitos festejam a perspectiva de paz, alguns alertam para maus presságios…

Segundo as informações divulgadas, o Hamas terá recebido garantias formais dos EUA quanto ao cumprimento do acordo por parte de Israel. Não deixa, no entanto, de pairar um ceticismo generalizado: a história recente mostra que Telavive tem um longo histórico de violações de compromissos internacionais, nomeadamente os Acordos de Oslo. Além disso, Israel já demonstrou no passado estar disposto a recorrer a ações terroristas extraterritoriais — como os assassinatos de líderes palestinianos em Beirute ou no Qatar — para impor a sua agenda política e militar.
Se o parlamento israelita ratificar este acordo, tal poderá representar uma derrota política significativa para um governo que declarou abertamente a intenção de ocupar a Faixa de Gaza e que aprovou recentemente a anexação da Cisjordânia. Nada garante que este seja um passo real rumo à paz. A experiência dos últimos 70 anos mostra que bastará um pretexto — fabricado ou real — para que Israel retome os bombardeamentos e volte a infligir sofrimento sobre a população palestiniana.
O PAPEL DE TRUMP

Donald Trump já anunciou que pretende deslocar-se ao Egipto no domingo — ou, quem sabe, segunda-feira — para “assinar o acordo”. Com o habitual instinto de palco, o ex-presidente norte-americano quer aparecer no foco das câmeras de televisão. O papel dos EUA está longe da mediação pelo interesse da paz. Os EUA são os principais fornecedores de armamento a Israel, e a reconstrução de Gaza representa um negócio potencialmente gigantesco. Ninguém acredita seriamente que a ideia da “Riviera de Gaza”, apresentada há meses como um projeto turístico e económico de luxo, tenha desaparecido do mapa.
Tudo isto acontece a escassas horas da atribuição do Prémio Nobel da Paz. Donald Trump, que tem feito campanha aberta para ser laureado, talvez não tenha chegado a tempo… duvidamos que o Comité Nobel ainda não tenha decidido a quem atribuir o galardão pela paz. Para Trump, mais do que um revés diplomático, será provavelmente o maior ultraje. Trump poderá não receber o Nobel da Paz, mas os contratos de obras públicas não lhe escaparão, isso é certo.