Um grupo cada vez mais numeroso de desportistas profissionais, reunidos sob a plataforma Athletes 4 Peace, tornou público um apelo direto à UEFA: suspender Israel de todas as competições internacionais enquanto persistirem as violações de direitos humanos na Palestina. A carta, assinada já por mais de 70 nomes, inclui figuras como Paul Pogba, Hakim Ziyech, Anwar El Ghazi, Moeen Ali, Romain Saïss e Adama Traoré, entre outros.
O documento, dirigido ao presidente da UEFA, Aleksander Čeferin, defende que o futebol e o desporto em geral “não podem fechar os olhos ao sofrimento humano”, argumentando que o que se vive hoje em Gaza e na Cisjordânia é incompatível com os valores proclamados pelas próprias instituições desportivas. A carta cita destruição de infraestruturas desportivas, ataques sistemáticos contra civis palestinianos e centenas de atletas mortos, números já reconhecidos por várias federações e organizações humanitárias.


Apesar da força simbólica da iniciativa, o impacto prático é incerto. A UEFA tem historicamente evitado confrontos diretos com Estados cujos governos são acusados de violações graves de direitos humanos, a não ser quando alinhados com decisões políticas prévias da União Europeia, do Conselho da Europa ou de alianças militares dominantes. O caso russo, frequentemente apontado como precedente, não resulta de um súbito despertar ético, mas de uma conjugação excepcional de pressões diplomáticas, sanções económicas e tentativa de isolamento político que tornou a exclusão exequível.
No caso de Israel, os governos europeus, incluindo vários dos que compõem a estrutura política que sustenta a UEFA, têm demonstrado uma apatia colaboracionista, limitando-se a “exprimir preocupação” enquanto o número de mortos palestinianos se eleva para dezenas de milhares, entre homens, mulheres e crianças. Mesmo perante investigações internacionais, decisões judiciais, relatórios das Nações Unidas e um consenso crescente de especialistas em direito internacional que qualificam a ofensiva israelita como genocídio, o peso político de Israel permanece, e com ele uma espécie de blindagem diplomática.
É neste quadro que a carta dos atletas se torna simultaneamente relevante e trágica: relevante, porque rompe o silêncio complacente que domina o desporto europeu; trágica, porque nasce sabendo que dificilmente surtirá efeito imediato. A UEFA depende financeiramente de governos, federações e patrocinadores que evitam criticar Israel, e não dará um passo que colida com esta arquitetura de poder, por muito que os seus estatutos proclamem valores de integridade, humanidade e justiça.
Outro pormenor importante é a ausência de nomes sonantes do mundo desportivo. Cristiano Ronaldo não assina a carta, Messi também não, nem Florian Wirtz, Kylian Mbappé, Ousmane Dembélé, Lamine Yamal ou Rodri. Nomes sonantes do mundo futebolístico, para além de Pogba (que assina a carta) temos Pep Guardiola, o treinador catalão, quase como figuras únicas a dar o corpo às balas pela defesa dos palestinianos.
Ainda assim, o gesto não é menor. Ao contrário de políticos, dirigentes desportivos ou grandes marcas, os atletas signatários da carta não têm nada a ganhar com este posicionamento – e muito a perder. Escolheram falar quando quase todos preferem o conforto do silêncio. E, mesmo que a UEFA continue imóvel, a carta deixa um registo público que poderá ganhar força com o tempo: a história mostra que as instituições só se movem quando o custo de nada fazer se torna demasiado alto.
Por agora, o que os atletas conseguiram foi lembrar que o futebol, por mais que tente fingir neutralidade, nunca deixou de ser também um campo de escolhas morais e políticas.




