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O HERBICIDA GLIFOSATO, UMA HISTÓRIA SEM FIM À VISTA

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Para esta decisão, a Comissão baseou-se num relatório da Autoridade Europeia para a Segurança dos Alimentos, que não identificou áreas críticas de preocupação, embora tenha apontado riscos elevados, a longo prazo, nomeadamente para os mamíferos, tendo recomendado a adoção de medidas restritivas. A Agência concluiu ainda não existir qualquer prova de que o herbicida mais utilizado no mundo é cancerígeno, para espanto da comunidade científica e contra o apelo de cerca de 291 cientistas, incluindo 104 professores, da Bélgica e dos Países Baixos, dirigido aos seus ministros para levarem em conta a ciência independente e, portanto, não avançarem com a aprovação desta substância, não levando em consideração a Agência Internacional de Investigação sobre o Cancro, uma agência da Organização Mundial de Saúde (OMS) que, em 2015, considerou o Glifosato como um provável agente cancerígeno.

O Glifosato é um herbicida amplamente utilizado na agricultura, podendo ser encontrado em produtos como o conhecido produto químico de largo espectro Roundup. Na Europa, o Glifosato representa cerca de 33% do volume de herbicidas, segundo dados de 2017, e cerca de um terço da área de culturas anuais e metade da área de culturas permanentes, é sujeita à aplicação anual deste tipo de substância. Segundo os dados da Direção-Geral de Alimentação e Veterinária, pensando no caso português, esta é a substância ativa mais comercializada no grupo dos herbicidas e corresponde a quase 80% do volume de vendas de herbicidas em 2021. Quando comparado a outros herbicidas, o Glifosato apresenta algumas vantagens, como: baixo custo; fácil aplicação; flexibilidade de uso; amplo espectro de ação. No entanto, a controvérsia em torno da sua utilização não é nova nem consensual.

Este herbicida foi introduzido no mercado em 1974, pela empresa química Monsanto (adquirida em 2018 pela Bayer). Nessa altura, não se suspeitava que a sua utilização teria efeitos devastadores na saúde e no ambiente, conforme comprovam os diversos estudos que têm vindo a ser divulgados e que asseguram a nocividade e o elevado potencial de dano para pessoas e ambiente. A própria Bayer de alguma forma o assumiu, em 2020, ao comprometer-se a indemnizar grande parte dos milhares de pessoas que a processaram nos EUA, devido ao herbicida Glifosato, em mais de 10,9 mil milhões de dólares (9,7 mil milhões de euros), estando na base da acusação os efeitos cancerígenos associados ao herbicida. Inclusivamente alguns especialistas associaram a exposição ao Roundup ao aumento da incidência de uma série de problemas de saúde, nomeadamente, vários tipos de cancro, problemas reprodutivos, doenças neurológicas como a esclerose lateral amiotrófica (ELA), perturbações endócrinas, entre outros. Além disso, a utilização do Glifosato também afetaria a biodiversidade, eliminando espécies vegetais que sustentam o ambiente natural de seres vivos cruciais para a agricultura, como os polinizadores.

Ainda assim, e face à evidência científica, a Comissão Europeia decidiu aprovar a sua utilização por mais dez anos, com, reconheça-se, algumas restrições como a exigência de que os Estados-Membros prestem especial atenção a aspetos específicos aquando da realização das avaliações de risco, que devem ser estabelecidas medidas de redução dos riscos e o aumento das obrigações, por parte dos Estados-membros, em termos de fiscalização e de verificação. Além disso a própria Comissão Europeia mencionou que se surgisse, no entretanto, alguma informação de relevo que leve à alteração da decisão, poderia intervir a qualquer momento.

No entanto o caminho não deveria ser este. Para além de ir contra um dos princípios da estratégia europeia do “do prado ao prato”, em particular, o objetivo de reduzir para metade a utilização de pesticidas e fertilizantes, bem como, a venda de agentes antimicrobianos, é imperioso procurar outros métodos que não sejam químicos. Deveria ser feito um grande investimento para reduzir a quantidade de pesticidas que utilizamos, uma aposta clara no aumento da área de cultivo biológico entre muitas outras alternativas bem mais saudáveis e sustentáveis.

Aqui, uma vez mais, os fortíssimos lóbis da agroquímica venceram e os deputados, uma vez mais, falharam na defesa da saúde das pessoas e na condenação de medidas que em nada contribuem para a salvaguarda do equilíbrio da nossa Terra. Uma história sem um fim à vista.

O AJUSTE DE CONTAS

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Ao antigo primeiro-ministro Cavaco Silva reconhecíamos a argúcia e o calculismo, com que, como líder do PSD tirou o tapete ao governo de Bloco Central formado pelo PS de Mário Soares e o PSD de Mota Pinto, para se lançar na aventura de gastar os fundos europeus que se avizinhavam, depois do governo anterior ter assinado o Tratado de Adesão de Portugal à CEE em 12 de Junho 1985.

O governo do Bloco Central cai a 12 de Julho desse ano. Portugal ingressa em Janeiro de 1986, como membro de pleno direito da CEE. Cavaco Silva como líder do PSD assume o cargo de Chefe do Governo a partir de 6 de Novembro de 1985. Digamos que calculismo mais cirúrgico não deverá ter existido na nossa História, nem mesmo quando Dom Afonso Henriques resolveu mandar Afonso VII de Leão e Castela às ortigas, tornando-nos independentes do então reino vizinho.

Já como Presidente da República o Dr. Cavaco Silva teve um percurso bem mais desastroso. Eu diria mesmo infeliz. Apesar de ter alcançado dois mandatos, muito por culpa das elites socialistas que nunca desejaram contrapor antes da eleição para o segundo mandato, uma figura com a estatura ética e moral de um Jorge Sampaio, o facto é que já no final dos primeiros cinco anos como presidente, este dava sinais de imensa falta de credibilidade e sensatez, com aqueles episódios associados às suas participações financeiras na SLN – BPN. Mais tarde veio a “estória” da Casa da Coelha, no Algarve.

O último mandato do Dr. Cavaco Silva esteve rodeado de episódios grotescos, que vão desde o choradinho da sua reforma, aos Orçamentos de Estado recheados de inconstitucionalidades que foi deixando passar, sabendo ele próprio que aquilo dificilmente passaria no escrutínio do Tribunal Constitucional. Argumenta que o fez com a convicção do cumprimento das normas constitucionais, mas nunca convenceu ninguém disso, nem mesmo os seus correligionários de partido.

No plano ético e moral, o Dr. Cavaco Silva não me parece ser a pessoa mais abalizada para falar de outros políticos. Quanto mais não seja, porque alguns dos seus amigos mais próximos, que pela sua mão entraram nos seus governos, foram condenados na justiça. O ex-Presidente Cavaco Silva sabe muito bem, melhor do que nós próprios, que foi a mais alta figura do Estado da nossa democracia, mais rejeitada no final do segundo mandato, desde que ela existe. Saiu com índices de popularidade confrangedores, que o fizeram tornar-se numa pessoa irrelevante para a politica actual. Serve apenas de balão de oxigénio, um pouco como Mário Soares no tempo da Troica e de António José Seguro, para as hostes laranjas não se sentirem completamente perdidas.

Cavaco Silva apareceu ao longo destes oito anos, seja em eventos públicos, seja em eventos partidários, uma dezena de vezes, se tanto. Uma boa parte deles para se autojustificar nas suas enfadonhas narrativas, de como ele está acima de todo e qualquer mortal. Nunca ninguém o levou muito a sério, desde que abandonou o cargo presidencial, nem mesmo dentro do PSD, apesar das parangonas mediáticas, sempre desejosas de alimentar uma trica.

Mas desde que António Costa se demitiu com o processo de averiguações de que foi alvo por parte do Ministério Publico, o Dr. Cavaco Silva aproveitou esse ensejo para aparecer de forma quase semanal a fazer o seu ajuste de contas com António Costa e o PS. Para além de um comportamento a roçar a cobardia, não me revejo nesta mesquinhez tamanha, quanto a moralidades o Dr. Cavaco Silva não necessita de nascer duas vezes. Uma bastou-me para perceber como não passa de alguém que finge ser aquilo que não é.

GUINÉ-BISSAU, SOLUÇÃO ‘CRIATIVA’ PARA A CRISE

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A crise na Guiné-Bissau levou à dissolução da Assembleia Nacional Popular, a uma surpreendente remodelação do Governo e à ocupação das estações de televisão e rádio públicas pelos militares.

Um comunicado da Presidência do Conselho de Ministros anuncia que o Chefe de Estado presidiu ao Conselho de Ministros, depois de ter anunciado a dissolução do parlamento, e que anunciou que o Governo está demissionário, que se mantém em funções até haver novo Governo e que o Chefe de Estado “passa a ocupar, cumulativamente com as suas funções, as de Ministro do Interior e da Defesa Nacional, assim como o primeiro-ministro assumirá as funções de ministro da Economia e Finanças e as de secretário de Estado do Tesouro”.

O Ministério das Finanças foi “decapitado” com a prisão preventiva decretada pelo Ministério Público ao ministro Suleimane Seidi e a António Monteiro,  secretário de Estado do Tesouro. A prisão dos dois governantes foi decretada na quinta-feira pelo Ministério Público, o que motivou a intervenção armada da Guarda Nacional para libertar os detidos, a que se seguiram 48 horas de confrontos com a Guarda Presidencial que causaram seis mortos.

Suleimane Seidi

O ministro e o secretário de Estado são suspeitos de pagamentos indevidos na ordem dos 9 milhões de euros a 11 empresas. Depois de terem sido libertados pela Guarda Nacional, voltaram a ser detidos e encontram-se nos calabouços da Polícia Judiciária, em Bissau.

Na sequência destes acontecimentos, a dissolução da Assembleia Nacional Popular e a intromissão presidencial na constituição do Governo. Não é muito comum, um Presidente da República exercer uma pasta ministerial de um Governo sustentado por um partido que nem é o que lidera.

O atual Governo é da responsabilidade da coligação PAI – Terra Ranka, que ganhou as legislativas de junho último, com maioria. Esta coligação é liderada pelo Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde (PAIGC), cujo presidente, Domingos Simões Pereira, é o lider do parlamento, agora dissolvido.

O partido do Presidente da República é o Madem G15, na oposição. Ou talvez não, uma vez que, agora, o Presidente também faz parte do elenco governativo.

Confuso? É a Guiné-Bissau.

GUINÉ-BISSAU, PRESIDENTE DISSOLVE PARLAMENTO

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O decreto presidencial 70/2023, divulgado esta manhã, através de uma nota informativa, anuncia a dissolução do parlamento, decisão sustentada pela alegada tentativa de golpe de estado que ocorreu em 30 de novembro e 1 de dezembro.

recorte da nota informativa onde se anuncia a dissolução do parlamento guineense

Tudo começou quando dois membros do Governo foram detidos, sob acusações de má gestão do erário público e a Guarda Nacional decidiu invadir as instalações prisionais e libertar os detidos.

Durante algumas horas ouviram-se tiros nas ruas da capital guineense e, ao fim do dia 1 de dezembro contaram-se seis mortos, devido a confrontos entre a Guarda Nacional e a Guarda Presidencial.

O Presidente Umaro Sissoco Embaló sustenta que a Assembleia Nacional Popular “em vez de pugnar pela aplicação rigorosa da Lei de Execução Orçamental e exercer o seu papel de fiscalização dos atos do Governo, preferiu sair em defesa dos membros do executivo suspeitos de envolvimento na prática de atos de corrupção”.

O decreto presidencial não define qual a data para a realização de novas eleições.

(notícia com novos desenvolvimentos)

PALESTINA, IÉMEN E ESPANHA

É evidente que os regimes árabes e islâmicos perderam credibilidade perante as suas próprias populações, pela ausência de respostas ao que Israel está a fazer em Gaza.

Depois de quase 2 meses de mortandade, de sucessivos atos genocidas que aniquilam o povo da Palestina, depois de 6 ou 7 mil crianças mortas (não importa o número certo), depois da destruição massiva de infraestruturas, de modo a impossibilitar o retorno dos sobreviventes às zonas destruídas, o conjunto de países islâmicos limita-se a declarações verbais de condenação. Preferem o mercantilismo e desprezam a solidariedade. Frouxos, venais.

E os defensores da democracia e dos direitos humanos, no ocidente tão humanista, compactuam com a “única democracia do Médio Oriente”, confundindo multipartidarismo com democracia. Aceitam a carnificina, vocalizam baixinho lamúrias de sacristia, mas não dão um murro na mesa para parar o exercício de tiro ao alvo que os israelitas executam na Faixa de Gaza. Na verdade, se não o fizeram nos últimos 50 anos, por que razão haveriam de o fazer, agora? Hipócritas, cínicos.

Nesta crítica ficam de fora o Iémen, único Estado árabe a agir militarmente em apoio ao combate dos palestinianos e a Espanha, com o primeiro-ministro Pedro Sanchéz a dizer que embora Israel tenha direito a autodefesa, deveria exercê-lo dentro do direito internacional e que a Espanha reconhece o Estado da Palestina, quer a União Europeia ou os EUA gostem ou não.

cartoon de Hélder Dias

ALGÉS, depois do susto

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Um enorme buraco na rua, fruto das recentes chuvas fortes, obrigou a obras de reparação que ainda decorrem, e alertou muitas pessoas que se dizem receosas com o que ainda pode acontecer. Na memória, os acontecimentos do ano passado, em que as fortíssimas chuvas fizeram uma vítima mortal e vários estragos avultados.

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Aos poucos, foram-se juntando várias pessoas, algumas com cartazes feitos à mão. Uma mulher que passava perto e observou a ainda modesta quantidade de pessoas fez o comentário de que eram “meia dúzia de caga tacos” (estou a citar). O tempo provou a esta cidadã, quiçá desiludida da participação cívica, que nem por isso. Em meia hora, duas estações televisivas foram fazer reportagem, e juntou-se mais de meia centena de pessoas, enquanto seis agentes da PSP ao longe faziam a sua discreta vigilância.

Uma das primeiras intervenientes, Helena Abreu, invocou a morte da cidadã que residia numa das caves inundadas, classificando-a de “uma morte perfeitamente estúpida”, e questionou o que fazia a Protecção Civil.

Pedro Fonseca, morador em Miraflores, tomou o microfone para criticar o empreendimento Parque dos Cisnes em Miraflores, que considera estar com muitas irregularidades. Afirmou ainda que alertou o município, dado que entende que o projecto vai contra diversas regras camarárias. Segundo ele, projectos como este podem ser a causa para o aparecimento de crateras como aquela que está agora a ser reparada. O caneiro que contém a ribeira, lembrou, tem cerca de 70 anos, ao longo dos quais se construiu na zona, e defendeu que até o caneiro estar arranjado não se deveria permitir mais construção. Apelou ao refrear da impermeabilização do solo, opinando que as medidas paliativas não vão ser suficientes. Pediu ainda a que fosse dada visibilidade de todas as formas possíveis a esta questão, para chamar a atenção às entidades competentes: a Agência Portuguesa do Ambiente, a autarquia e o Governo.

A seguir desfilaram mais intervenientes (incluindo representantes de um partido político e de movimentos cívicos, bem como um engenheiro hidráulico), que sublinharam ser este um problema crónico. Não faltaram críticas a alguns episódios ocorridos em assembleias municipais em que os membros da autarquia terão reagido de forma menos cordial quando questionados sobre vários aspectos desta problemática. Foi dito, ainda, que é necessário passar à ação concreta a longo prazo bem como mais iniciativas como esta concentração, para evitar a repetição de situações como as cheias de Dezembro de 2022. Chegou a ser mencionado o envio de propostas alternativas à autarquia. Em linguagem futebolística, a bola está agora do lado da Câmara Municipal de Oeiras.

NATURALIA de CLOTILDE FAVA

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Naturalia II, exposição da pintora Clotilde Fava, nas salas da Sociedade Nacional de Belas-Artes, em Lisboa.

O exotismo e a sensualidade, as cores quentes, porventura a revelar memórias felizes de Angola, onde Clotilde viveu durante muitos anos.

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Uma vintena de quadros, alguns de grande dimensão, todos com uma estética única que caracteriza a expressão artística de Clotilde Fava.

Das cores quentes (vermelhos, amarelos, rosas), às cores frias (azul, verde, cinza), as formas que nos sugerem flores, plantas, folhas, sementes, uma panóplia de estímulos para os sentidos.

PORTO VAI MATAR O MAIS ANTIGO GRUPO DE TEATRO

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No dia 29 de Junho de 2017, a Universidade do Porto deu um passo decisivo e oficial para passar a declaração de óbito ao TUP, instituição fundada em 1948 e com atividade permanente desde então, sendo por isso o grupo teatral mais antigo da cidade do Porto.

Nesse dia o Diário da República publicou o anúncio de um concurso público da venda ou concessão do antigo colégio Almeida Garrett, localizado na Praça Coronel Pacheco, pela Universidade do Porto, por um preço base de 4,768 milhões de euros. De há muito que se sabia que a Reitoria da Universidade do Porto tinha uma visão exclusivamente economicista em relação a este tentador espaço que faz salivar qualquer empreendedor imobiliário. Também se sabe que a Reitoria se estava nas tintas para o facto de nesse espaço existir o mais antigo grupo de teatro da cidade.

“O procedimento visa a celebração de contrato de compra e venda do espaço denominado ‘ex-colégio Almeida Garrett’, ou a celebração do contrato referente à cedência em direito de superfície por um período máximo de 30 anos”, especifica o anúncio. Localizado na freguesia do centro histórico do Porto, o imóvel tem entrada pela praça Coronel Pacheco e está inserido num terreno com uma área total de 8.520 metros

“O TUP, habituado que está a saltar de um lado para o outro e a nunca ter uma casa mesmo sua, voltará certamente a fazer as malinhas. O TUP, para os que não sabem, tem património e tem gente lá dentro. Património e gente que não cabem numa ou duas salinhas. O TUP, para os que não sabem, voltou a fazer do antigo auditório da ACE Escola de Artes um auditório de teatro (obviamente com o acordo da ACE). Um auditório onde os senhores da reitoria nunca põem os pés. Um edifício onde os senhores da reitoria nunca põem os pés, habitado por um grupo de teatro universitário onde os senhores da reitoria nunca põem os pés, que faz teatro que os senhores da reitoria nunca vão ver, que acolhe a comunidade universitária e não só e que lhe dá a oportunidade de fazer um teatro de que os senhores da reitoria não querem mesmo saber”, desabafou na altura Nuno Matos, um “TUPniano” que se recusa a pactuar com o domínio do lucro sobre a arte e a cultura.

‘Enteado’ da Universidade do Porto, para quem o Teatro e toda a sua envolvência social e cultural é descartável, o Teatro Universitário do Porto (TUP) é o grupo de teatro mais antigo ainda em actividade do Porto e está, como o próprio nome indica, de alguma forma ligado à Universidade do Porto. No TUP nasceram, ou passaram, muitos dos nomes mais sonantes desta nobre arte.

O carácter não profissional e universitário do TUP é, porventura, a sua mais-valia. Há espaço para rasgar com as convenções – às vezes tão presas como raízes – que o panorama teatral da cidade do Porto ainda teima em acarinhar, há amor na vontade de fazer como o TUP sabe e quer fazer. Assim o deixem. Para além de encenações colectivas e da apresentação de textos dramáticos de autores inéditos em Portugal, gostam de criar a partir do que está lá dentro – da casa, deles, de quem está com eles. É, continua a ser, acima de tudo, uma questão de verdade e da verdade – porque o Teatro não tem de ser mentira.

Hoje, continuam a apostar na formação, porque querem ver o TUP crescer; querem gente interessante de ver, que encha a casa do que tem para dar, que goste de dar mesmo quando faz ferida – que fique. E que, como disse o Mestre José Rodrigues, escultor e antigo cenógrafo do TUP: «Alertar, não deixar ninguém esquecer. Lembrar, lembrar constantemente. E não perder a memória. Compete ao TUP ser uma espécie de despertador. Não agredir, despertar. Mostrar às pessoas que ser curioso é fundamental».

A importância do TUP no teatro português, em especial no teatro do Porto, não se mede, nunca se poderia medir, em estatísticas desapaixonadas, acontecimentos pontuais e recortes de jornais. Um grupo de teatro assim é parte do património cultural da cidade e do país. Devia ser amparado, acarinhado, se isto fosse um país a sério.

UM HOMEM DIFERENTE

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E nós ‘passamos’ amiúde por um dos mais conhecidos retratos de Miguel Torga, admiramos-lhe a boina basca, imaginamo-lo pensativo de costas voltadas pró mar – e nem reparamos na assinatura. É de Isolino Vaz esse quadro, carvão sobre papel, 1961.

retrato de Torga, Isolino Vaz

Conhecemos e admiramos a obra de Siza Vieira e nem nos perguntamos – ou raramente nos ocorre perguntar: «Quem foram os seus professores?». Um deles, Isolino Vaz.

De resto, no catálogo da exposição comemorativa do centenário do pintor, exposição que esteve patente no Museu Municipal de Faro de Novembro de 2022 a 21 de Maio passado, há um texto de Siza Vieira em que ele conta como foi uma lição a simples ida à praia de Leça com o mestre:

«Não se falou em desenho. Jogámos à bola e corremos contra o vento, até ao limite do fôlego. […] Provavelmente este exercício preparava uma nova aprendizagem: como fixar o carvão, que sempre ameaçava seguir a brisa sobre o Rio Douro».

Em muito boa hora se fez a exposição. E aqui, na capital algarvia, porque longo tempo passou o pintor, de férias, na sua casinha duma Ilha do Farol então quase deserta. Em muito boa hora, o Município farense, após ter patrocinado a exposição, houve por bem editar o respectivo catálogo, com a colaboração de entidades algarvias e da própria Associação Mestre Isolino Vaz. Aí se analisa a obra do artista, uma análise meticulosa gizada pelo historiador de Arte Daniel Santana; aí se transcrevem mui oportunos testemunhos, entre os quais o de sua filha Elsa Vaz:

«No Núcleo familiar eram incentivados e cultivados hábitos já herdados e que ficaram para a vida. Sobretudo o da leitura e de tempo na Natureza. Muitas vezes acompanhei o meu pai em visitas de estudo, exposições e viagens. Tive uma infância feliz entre livros, obras de arte e viagens».

Optou-se por apelidar aqui, no catálogo, Isolino Vaz como um «homem diferente». E é ele mesmo que assim se retrata em palavras, depois de amiudadas vezes se ter querido autorretratar em desenho:

«Nasci pobre, com os pobres convivi. O povo anónimo, sofredor e humilde na sua vivência (e não no cenográfico pitoresco, anedota), no seu dramático realismo, sempre me emocionou. Pode dizer-se que toda a trajetória de quanto realizei tem por base a injustiça, a angústia do homem da rua, a sua luta sem esperança».

Quem se interessar por Arte e tiver curiosidade em conhecer quem foi e como foi o professor de Siza Vieira e também de Joana Vasconcelos tem neste catálogo, além dos seus dados biográficos, boa ocasião de aprendizagem e – ousarei dizê-lo – de não menor deleite, ao rever, em magníficas reproduções, algumas das mais significativas obras do pintor, cujo génio ficou espalhado por muitos lugares públicos de Portugal, em painéis e em vitrais: no Palácio da Justiça do Porto, no Santuário do Monte da Virgem (Vila Nova de Gaia), na igreja de Pinhovêlo (Macedo de Cavaleiros), na igreja de Santo Ildefonso (Porto), no Museu Nacional Soares dos Reis…

O que atrás se transcreveu acerca da sua maneira de pensar está bem patente na sua obra: Isolino Vaz fez do lápis e do pincel armas contra a desigualdade social; chamando a atenção para a realidade sua envolvente – como era apanágio da corrente neorrealista que perfilhou – contribuiu, sem dúvida, para que ela fosse vista com um olhar mais penetrante. A força que dimana desses corpos, desses rostos, desses gestos não pode deixar-nos indiferentes. É o Povo na sua vitalidade maior! Mesmo a rachar o tronco ressequido da árvore, de forte machado na mão, o casebre ao fundo a fumegar, descalços ele e a mulher, mesmo nesse instantâneo, não é o casal pobre que assim labuta por ter com que se aquecer e cozer um caldo, é todo um Povo a labutar. E apetece recordar Carlos de Oliveira: «Não há machado que corte / a raiz ao pensamento / Não há morte para o vento / Não há morte». Das obras de Isolino saltam pensamentos que nenhum machado ousará cortar.

O CASO DAS GÉMEAS BRASILEIRAS

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O caso das gémeas brasileiras que receberam o tratamento mais caro do mundo, pago pelo SNS, está a ganhar contornos estranhos.

Na TVI, Sandra Felgueiras, jornalista que tem chefiado a equipa de repórteres que segue e investiga este caso, depois de explicar que existe uma carta inicial que a Presidência da República recebeu e de que tentou “apagar” o remetente”, eventualmente para que não se soubesse a origem do pedido, garantiu que “nós não vamos ceder a ameaças de ninguém e aqueles que nos estão a ouvir seguramente percebem para quem eu estou a falar”.

É… talvez Marcelo esteja a comer a sua própria vichyssoise.

Vejam um excerto das declarações de Sandra Felgueiras, no Primeiro Jornal da TVI de hoje:

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Relembrando o caso.

Há cerca de um mês, o Hospital de Santa Maria abriu uma auditoria para perceber como é que duas gémeas brasileiras que residem no Brasil fizeram um tratamento de quatro milhões de euros em Portugal, pago pelo SNS. Chegaram com consulta marcada e vários médicos foram contra. Há suspeitas de influência do Presidente da República, mas Marcelo nega. Contudo, apesar de um parecer desfavorável de todos os neuros pediatras do hospital, o tratamento avançou mesmo.

Quem meteu a cunha? E quem está a fazer ameaças?

fotomontagem publicada no Duas Linhas em 6 de novembro de 2023