Todos nos lembramos dos tempos em que Pedro Passos Coelho foi primeiro-ministro com uma agenda ultraconservadora, sustentada por uma narrativa que lhe foi dada pelo acordo com a Troika, e do qual Sócrates serviu como bode expiatório dessa patranha. Tudo isto coadjuvado pelo anterior Presidente da República, Cavaco Silva, cujo fim último era transformar Portugal numa democracia iliberal, num estilo muito idêntico ao da Hungria.
Quis o destino fazer aparecer uma coligação maioritária de partidos à esquerda, para pôr cobro a este caminho desastroso para a nossa democracia, libertando-a desse espectro fascizante, durante 6 anos. Com as eleições de 2022, o Chega, até aí um pequeno partido populista com apenas um deputado, emerge através duma agenda populista promovida pelo seu líder, André Ventura, alcançando um grupo parlamentar com onze eleitos para a AR.
André Ventura já tinha sido escolhido por Passos Coelho para candidato da coligação de direita à autarquia de Loures, tendo nessa altura sobressaído na agenda mediática com um discurso manifestamente homofóbico e racista. Saiu em rotura com Rui Rio, entretanto líder do PSD, formando o Chega.
Pedro Passos Coelho nunca aceitou de bom grado ter sido apeado em 2015 pela coligação formada à esquerda que se denominou no jargão politico por ‘geringonça’. Resistiu até às autárquicas de 2017, mas com a estrondosa derrota eleitoral nas autárquicas desse ano, nas quais o PSD perdeu cerca de 50 autarquias, o mesmo sentiu-se na obrigação de libertar o partido para uma nova etapa, sem a sua presença, de modo a que este conseguisse retornar ao poder.
É neste quadro psicológico que Pedro Passos Coelho, intercalando com Aníbal Cavaco Silva, fazem umas aparições públicas, para destilarem aqui e acolá o seu azedume contra o PS, mais do que contra a esquerda em si mesma, por terem abandonado os seus cargos políticos com manifesta impopularidade entre os cidadãos.
A travessia do deserto foi grande, oito anos, e maior seria se o Ministério Público não encenasse aquele parágrafo tenebroso, numa pretensa acusação contra alguns membros do governo. Até agora, dali só saiu poeira. Facto é que foi no meio dessa poeira que o Chega engordou e a Aliança Democrática conseguiu a muito custo, mais umas décimas para governar.
É claro para todos que este governo jamais durará os 4 anos, a não ser que alcance um acordo de incidência parlamentar com uma das forças da Oposição, seja ela à sua esquerda pela mão do PS, ou à sua direita pela mão do Chega. Como isso não vai acontecer a não ser que a AD abdique de parte do seu programa eleitoral, ou o Chega faça o pino, o mais provável é entramos num período de ingovernabilidade.
É neste quadro que Pedro Passos Coelho volta a aparecer, com uma agenda claramente de direita radical e conservadora, forçando o PSD a encostar-se ao Chega, promovendo um manifesto em forma de livro, sobre os valores da família. Tudo isto ao mais belo estilo neofascista, como se não tivéssemos todos nós família, sendo que o conceito desta, nos dias que correm, significa tão somente: “amor e concórdia entre os pares, e destes para os vários grupos sociais onde nos inserimos”.
Tudo o resto é conservadorismo retrógrado.
Não duvidem. Passos Coelho sabe que Luís Montenegro está a prazo. A partir de ontem vai aparecer tantas mais vezes, quanto as crises forem aparecendo, até ao dia em que Luís Montenegro perdendo as eleições, mas ficando ainda assim a direita em maioria com o Chega e a Iniciativa Liberal, este acabar por regressar ao poder, como primeiro-ministro, qual D. Sebastião regressado do exilio a que se propôs, por ter sido rejeitado pelo povo.
Fiquem atentos. A história por vezes repete-se. Depois não se queixem.