CONTROLAR A INFORMAÇÃO

Em Portugal discutem-se modelos de financiamento dos órgãos de comunicação social, perante as falências que abalam o setor. Alguém alvitrou que o Estado deveria assumir esse financiamento, logo outro contrapôs com o argumento da independência dos media.

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Jornalista desde 1980, passei pela RTP e LUSA (do setor empresarial do Estado) e pelos privados, tanto em Portugal como em França, Angola e Timor-Leste. Em todo o lado senti tentativas de controlo, de censura e de condicionamento dos jornalistas.

Nas redações, sabemos bem como se manipula a informação. Um dos esquemas mais comuns é a escolha do repórter. Quando querem que determinado tema seja maltratado, escolhem um nabo. É para isso que eles existem. Para estragar a mensagem, nada melhor que uma má reportagem. Mas também vi chefes de redação cortar palavras de textos, bufaria nas redações entre jornalistas, diretores aceitarem encomendas do patrão e o patrão tentar influenciar diretamente o repórter saltando por cima da hierarquia. Ou seja, nada garante que um órgão de comunicação social privado seja mais independente que um público.

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É assim, em todo o mundo. Num recente artigo no site Duas Linhas sobre um outro tema, mas que se cruza com este, vem a história de como Bill Gates faz negócios na área da saúde pública à escala global, conflituando os seus interesses de empresário patrocinando a Organização Mundial de Saúde e controlando importantes grupos de comunicação através de contribuições financeiras encapotadas de filantropismo.

Nesse artigo, está escrito que Bill Gates investiu “milhões no financiamento de ONGs, meios de comunicação e agências internacionais, garantindo uma influência política significativa. As contribuições financeiras para os media garantiram a Gates uma cobertura noticiosa favorável. No site da Fundação está, por exemplo, o registo de financiar o jornal The Guardian em 3.5 milhões de dólares durante três anos.

Como se diz ‘não’ a um patrocinador deste quilate? E, no entanto, dir-se-ia que o The Guardian não precisaria de aceitar pagamentos para abordar determinados temas. O jornal pertence ao Guardian Media Group, que engloba os jornais The Guardian, The Observer e o semanário The Guardian Weekly. O jornal tem uma edição on-line e dois sites vocacionados para a política internacional, Guardian Australia e Guardian USA. Parece bonito, mas a crise chega a todo o lado. O mercado publicitário transferiu-se para as redes sociais, como se sabe. Quem passou a cobrar foi o Zuckerberg (Facebook, Messenger, LinkedIn), Shou Zi Chew (Tik Tok), o próprio Bill Gates (Microsoft), Musk (X/Twitter) entre outros.

CONTROLAR A INFORMAÇÃO À BRUTA

O tempo muda tudo, até mesmo a vontade das pessoas. No The Guardian, por exemplo, houve um problema fraturante que abalou as estruturas do grupo, quando publicaram os primeiros documentos fornecidos por Edward Snowden sobre crimes de guerra cometidos pelas tropas norte-americanas no Afeganistão, e os projetos relacionados com segurança e espionagem da NSA (agência de segurança dos EUA).

Snowden foi acusado de espionagem, teve de fugir para a Rússia para não ser preso e condenado a prisão perpétua. O The Guardian viu os seus jornalistas serem perseguidos, proibidos de entrar nos EUA sob pena de serem detidos.

O GCHQ (Government Communications Headquarters, um serviço de inteligência britânico encarregado da segurança e da espionagem e contraespionagem nas comunicações) entrou em ação e o jornal The Guardian foi obrigado a destruir os seus computadores em frente aos agentes do serviço de inteligência britânico (GCHQ), em 20 de julho de 2013.

Então, depois disto tudo, terão pensado no The Guardian que antes Bill Gates que os capangas dos serviços secretos americanos e ingleses. Eu não balanço entre esses “dois amores”… digo que só o controlo público poderá garantir a independência perante os poderes político e económico.

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