O talento de Margarida Chagas Lopes, assente numa sólida formação académica, não se limita à escrita poética, domina todos os discursos que atravessam com elegância verbal as fronteiras simbólicas uns dos outros.
Não há personagens fictícias nos seus poemas. É ela a personagem principal adivinhada em representação de todas, sob a roupagem de múltiplas vivências, coloridas ou monocromáticas. No mundo que a (nos) rodeia, cumpre com o maior rigor a função mais acabada da Literatura: interrogar a realidade sobre as suas incoerências, numa metodologia de questionamento e denúncia subtis.
É uma poesia feita de sinfonias verbais bem codificadas, sem encenações demagógicas. Nunca se adentra pela floresta dos mitos, nem se impõe nas suas convicções, mas tão-pouco se demite do foco principal das muitas fragilidades e grandezas do ser humano.
Em ‘Ao Postigo’ há a preocupação primeira com a fractura evidente entre esses extremos, fractura que abrange uma universalidade de temas que vêm do passado até à violência generalizada do presente. É sobre esse “corpus de estudo” que a autora se debruça, num mundo de perplexidades sobre as quais constrói – e convida a construir – uma ampla teia reflexiva.
A sua grande preocupação é o papel de interveniente social no julgamento das atitudes desviantes do ser humano, que o levam a perder-se num labririnto agressivo de jogos de poder, antes da inevitável chegada ao fim. “Um mesmo mar os tragou! Um mar que se dividiu, mas sem traço/de união…” – UM MESMO MAR.

Margarida Chagas Lopes desempenha esse papel sempre com a maior tranquilidade, porque ‘Ao Postigo’ é um destino próximo de todos, um corpo em (re)construção emocional, uma casa fechada, mas com uma janela entreaberta aos cicios de outras vidas pessoais, que ali podem revelar segredos sem temer a sua profanação. Conhecidos de quem escuta, intemporais, comuns a todos os homens e mulheres, não causam surpresa, nem carecem de perguntas, só receberão respostas: “Pega no já sabido e dá-lhe vida nova” – A INVENÇÃO DO VELHO.
Os versos de ‘Ao Postigo’ são estradas, caminhos já percorridos com sugestões de ramais ainda por explorar, que incitam o leitor a fazer viagens interiores em redor de si mesmo, no sentido de aprender o acolhimento aos raios de sol que ainda espreitam. “Viver não tem receita, só quem arrisca vence”- DANÇA DE RODA. E nesse labor de se livrar de embaraços, há-de encontar os nichos afectivos onde o bem-estar aguarda de braços abertos.
Na dialéctica entre um mundo de excessos e outro de carências, sentimo-nos vizinhança destas páginas, habitantes de um lugar próximo onde só um postigo de referência, digno de reverência também, nos poderá ir cobrindo com os seus véus protectores.
Não haja a ilusão de uma descrição autobiográfica definitiva de momentos intimistas, apenas. Adivinhamo-la, sim, mais como emparelhamento com outras biografias de idêntico recorte. Já o comprometimento com causas universais tem uma identidade definida, e acrescenta a vontade própria da autora numa mudança radical de paradigma de vida, à empática ansiedade alheia.
‘Ao Postigo’ é a mais perfeita metáfora da existência, que ainda pode aproveitar as últimas incidências da luz natural para aquecer os instantes disponíveis e fazer sorrir. “Um postigo entreabriu-se por aqui, a medo, quando já não se/ esperava…”- do poema que dá o título ao livro.
Vou pela convicçao de Margarida Chagas Lopes: pode sempre haver um recomeço em nichos de ternura que unem, confortam e compensam da solidão no meio de tanto ruído. “Arruma o casulo, põe lenha na lareira/veste de linho novo, recomeça a sorrir” – VESTIR DE LINHO NOVO.
E recomeçaremos em leituras sucessivas de ‘Ao Postigo’, na doçura de um silêncio guardado em local secreto.

Muito obrigada, Helena Ventura Pereira, por esta recensão ao meu livro de poemas, baseada no belíssimo Prefácio com que tanto o valorizou!
Agradeço também à coordenação do Duas Linhas a magnífica apresentação ilustrada com poemas meus daquele livro.
Bem hajam.
Belíssimo percurso pelo livro de poesia de Margarida Chagas Lopes. Uma forma belíssima de acompanhar o leitor. De o ajudar, com a sábia visão de Maria Helena Ventura, a saborear a poesia de Ao Postigo.
Tenho o privilégio de conhecer quer a autora do Prefácio maravilhoso do livro Ao Postigo, quer a autora dos poemas. A primeira uma Autora de enorme qualidade, a Margarida uma estreia na Poesia que me encantou.
Tudo o que aqui se refere subscrevo e sublinho.
Não tem que agradecer Margarida Chagas Lopes, eu é que fico muito contente por lhe ter agradado o texto e pelo facto de as nossas Amigas estarem atentas, deixando palavras de simpatia.
Tendo já lido o seu livro, são boas “cartas” de recomendação para outros eventuais leitores.