A Confiança nas Instituições

O SNS português tem sido posto à prova a cada dia que passa desde a sua criação. Com o atravessar da pandemia de Covid 19, que fustigou a generalidade do nosso planeta, este sistema de saúde público foi levado ao limite das suas forças. E resistiu. Toda a gente subscreve hoje a ideia de que somos dos poucos países da Europa, que têm os cuidados de saúde gratuitos e alargados a toda a população de uma forma uniforme, sem olhar a credos, raças e condições sócio económicas.

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O caso das gémeas luso brasileiras tratadas pelo nosso SNS, pela módica quantia de 4 milhões de euros, veio abalar a imagem, já de si debilitada, de credibilidade das nossas Instituições. Há, claro, uma agenda politica que pretende insinuar que o Estado não se sabe governar, nem mesmo em sectores que deviam ser muito bem geridos e escrutinados, até pelos custos que representam na despesa pública, como é o caso do SNS. Ora isso não é verdade. Ninguém é tratado nos nossos hospitais públicos, por exemplo, para o transplante de um órgão, sem estar elegível para esse efeito. E isso obedece a uma série de requisitos, em que o ultimo deles é o dador compatível. O mesmo se passará com outros tratamentos.

O primeiro ponto que eu gostava de realçar deste caso, e que de certa forma me intriga, não é tanto a cunha do Presidente para um tratamento caro. É claro que há uma solicitação do filho, caso contrario não lhe mandaria um email, bastaria um telefonema. Já agora era bom que as autoridades judiciais soubessem o que ele contém. E percebermos mais sobre a forma leviana como tudo isto se passou, pensando alguns, e aqui refiro-me às estruturas politicas, que isto nunca se viria a descobrir. Os políticos em geral não se enxergam. Pensam que estão acima da burocracia com que os outros cidadãos se debatem todos os dias.

Eu acho que qualquer português tem direito a ser tratado com as melhores tecnologias e práticas médicas ao dispor, no país, mesmo com custos elevados. Esse cidadão de nacionalidade portuguesa pode cá residir em permanência, o mais comum, mas também pode não residir por motivos migratórios, de longa ou curta duração.  Quantos milhares de portugueses não estão a residir temporariamente no estrangeiro. E quantos compatriotas nossos não emigraram durante décadas e resolveram regressar a Portugal, na reforma. Têm todos eles direitos, desde que estejam inscritos no SNS.

Já coisa bem diferente são as pessoas que não têm qualquer vinculo a Portugal, ou ele é muito precário, muitas delas nem português falam, como aqueles lusos israelitas que estiveram agora reféns do Hamas, e que adquiriram a nacionalidade portuguesa por mero oportunismo. O caso das gémeas brasileiras não é muito diferente. As meninas não tinham qualquer relação com o nosso país, apesar de terem uma avó de origem portuguesa. Só se preocuparam em dar-lhes a nacionalidade portuguesa para tirar beneficio do nosso sistema de saúde, universal e gratuito. Quantos milhões de cidadãos por esse mundo fora não terão afinidades genéticas com a nossa diáspora, não podendo ainda assim considerar-se portugueses?

Aqui o problema tem muito mais a ver com as interferências e, acima de tudo, com as coincidências. Goste-se ou não, ficamos com a percepção de que Presidente e alguém no Governo, por interpostas pessoas, deram uma mãozinha à família das gémeas. E deram-na de forma indelével, sem se comprometerem no plano documental, coisa muito habitual na politica. Num país onde a bajulação sempre teve escola, não me admira nada que tudo isto fosse construído dentro dum cenário abstrato, para que ninguém pudesse ser responsabilizado. Mas aconteceu. Atingiu-se o objectivo pretendido, que era o tratamento das crianças.

Há milhares de portuguese há espera de tratamentos caros. Sejam iguais a este ou transplantes de órgãos. Vamos ver quanto tempo o SNS demora a satisfazer estes pedidos, salvando vidas. Nomeadamente crianças e jovens que vivem cá. Que não têm outros recursos. Que são pobres.

Portugal gasta mal muitos milhões de euros da sua receita anual e futura, endividando-se. Só em pareceres para o TGV e para o novo Aeroporto somam-se umas centenas de milhões. Sem que daí haja uma decisão definitiva e obra feita. Ao menos estes milhões salvaram duas vidas. Do mal o menos.

Outro dado relevante deste caso e não menos importante é o da intriga. O Presidente, já desde o tempo de jornalista, sempre teve fama de alimentar intrigas. As relações do governo com o chefe de estado nunca foram boas desde que António Costa conquistou a maioria absoluta. Uma vitória contra as sondagens, nas quais o Presidente Marcelo acreditou, e o terão levado a dissolver o parlamento, numa atitude calculista. Daí para a frente foi um sucedâneo de casos, com o Professor Marcelo a comentá-los quase semana a semana. O mais recente foi o caso Galamba.

Há um governo demissionário e com forte desgaste politico, onde o Presidente não está imune. Há uma luta dos médicos por melhores condições salariais e de trabalho, com negociações que se arrastam há anos, sabendo nós que eles têm razão. Por fim há uma investigação jornalística sobre um caso com quatro anos, que envolve o chefe de estado, numa espécie de tráfico de influências. A mesma acusação que recai por agora sobre o líder do governo demissionário e alguns dos seus assessores.

Quem quiser que tire as suas conclusões. Não venham é depois queixar-se do populismo.

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