António Costa não quis o pântano

Tenho por mim que António Costa é uma pessoa séria. Tal como todos os políticos, e ele não é excepção, também não se inibe de fazer gala nas artes da retórica e da demagogia. Mas daí a ser desonesto, beneficiando do exercício do cargo, não acredito. Já em relação a alguns dos seus colaboradores, não ponho as mãos no lume.

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foto montagem, imagem ilustrativa

A economia do país no ultimo trimestre começou a dar sinais de recessão. Isto apesar do excedente orçamental. Neste começo do Outono agravou-se a luta dos médicos por melhores condições remuneratórias e de trabalho, a seguir vinham os enfermeiros, com inúmeras urgências a fechar, percecionando-se alguma intransigência de ambas as partes. O governo pelo que se percebe, não estava disposto a ceder muito mais aos médicos, e pressentia-se que desta forma o SNS estaria debaixo de fogo, não podendo dar resposta aos múltiplos casos clínicos que ocorrem no Inverno, em especial com crianças e idosos. Isto para não falar nos professores, cuja luta irá até à exaustão.

Com isto, não estou a afirmar que António Costa quisesse ir á boleia desta incursão do Ministério Público na acção do governo, por acaso não o deste, mas o da Geringonça, período no qual o Dr. Matos Fernandes era Ministro do Ambiente e João Galamba, Secretário de Estado, esquivando-se a tempos de crise.

A atitude tomada por António Costa ao demitir-se é de uma dignidade inquestionável.  E louvo-lhe a sensatez e o sentido de Estado, em não se deixar arrastar num apodrecimento fétido, que acabaria por colocar o PS de novo nas bocas do mundo. É claro que de certa forma o país foi atirado para um cenário de provável ingovernabilidade, até porque eu não acredito numa nova ‘geringonça’ tão cedo, como não acredito que uma maioria de direita, ainda por cima com o Chega, possa dar um rumo ao país com estabilidade. Uma coligação ao centro entre os dois maiores partidos está fora de questão. Isso só aconteceria numa situação análoga à que se viveu no pós 25 de abril de 1974, ou numa situação de guerra iminente. A não ser que um dos partidos se queira subjugar ao outro, menorizando-se.

Há aqui no entanto um dado novo que foi lançado na vida politica portuguesa, que jamais tinha ocorrido. A actuação do Ministério Público (MP). Com buscas ao gabinete oficial do primeiro-ministro, pondo em causa a sua idoneidade. Eu vou partir do pressuposto que este órgão da justiça portuguesa conduziu e fundamentou bem as suas investigações e as suas suspeições. Não nos esqueçamos que pela primeira vez em Portugal cai um governo com base numa suspeita, no mínimo, de favorecimento a uma entidade privada por parte do chefe de Governo.

Se todas aquelas suspeitas e todo aquele folclore acabarem como muitos outros processos, em nada, alterando o Governo da República, apenas com base na suspeição de um pretenso telefonema, a descredibilização da Justiça será tão grande, que só com uma nova reformulação legislativa, não sei mesmo se constitucional, na forma de actuar do MP, poderá vir a solucionar o problema.

Estou em crer que o MP abriu um precedente um pouco leviano, e, caso não obtenha resultados palpáveis, a sua desastrosa forma de actuar acabará por ser virar contra si mesmo. Pior, com isso corre o risco de se politizar, o que por si só levanta um manto tenebroso sobre a nossa democracia.

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