Já não ia a Moura há algum tempo e fiquei novamente encantado com aquelas ruas floridas, a mostrar como os seus habitantes prezam a alegria de viver e não esperam por funcionários do Município para terem tudo num brinquinho. Dá um gosto ver!
Fui lá a 23 de Maio. Na Escola Secundária, tive oportunidade de conversar com estudantes e professores, a convite do Município local e no âmbito da iniciativa Arqueoversas, acerca d’«As pedras com letras que os Romanos deixaram em Moura».
Discutem os especialistas se, por se encontrar na margem esquerda do Guadiana, o território de Moura teria pertencido, no tempo dos Romanos, à província da Lusitânia ou se o rio era mesmo fronteira e, portanto, era à província da Bética que Moura teria de pertencer. Sou ferrenho defensor de que lusitana ela é, até porque ‘rio’ pode ser, de facto, fronteira fácil de ver do ponto de vista administrativo, mas o rio não obriga necessariamente a serem distintas as gentes duma margem das da outra.
Houve ideia de que, outrora, se teria chamado civitas Aruccitana, por lá se ter identificado o pedestal da estátua dedicada por essa cidade a uma imperatriz romana, Agripina; o mais normal, no entanto, é que o nome da actual localidade espanhola de Aroche, que não fica longe, tenha mesmo derivado de Arucci e não se fala mais no assunto. E tem-se a certeza de que Moura foi mesmo importante na época romana – e outros sinais há disso, bem elucidativos. Os que pugnam pela importância da presença árabe no sítio preferem salientar esse aspecto e é por isso que à revista municipal foi dado o provável nome árabe do lugar: LACANT.
O Túnel
Esquecida habitualmente pelos senhores de Lisboa (está muito longe!…), Moura foi elevada a cidade a 1 de Fevereiro de 1988, mantém uma vida cultural relevante e merece uma visita serena, que dê hipótese de ida, com vagar, a um dos seus típicos restaurantes.
Levaram-me a O Túnel, onde – para além da enorme cordialidade do seu proprietário André Pires, que partilhou connosco a sua experiência dos tempos, por exemplo, em que o marisco e o peixe vinham bem fresquinhos de Sines para ali –saboreámos deliciosas bochechas de porco preto, acompanhadas de mui bem temperadas e apetitosas migas. Comemos, sobejou e… trouxemos para casa!
Ambiente bem alentejano. O panito numa peneira; azeitonas temperadas, em bonita azeitoneira da olaria tradicional da região…
Souberam os proprietários manter e valorizar o tecto em abobadilha, que é uma das belezas desse nosso Sul. Uma arte que fazemos votos de que se não perca e cuja tradição se perde na noite dos tempos, na medida em que assim, por essas bandas, construíam os Romanos, há dois mil anos, as suas casas.
Saboreada a mousse de chocolate caseira, sobriamente regada com um cheirinho de medronho de colheita particular, fez-se a natural visita à casa-de-banho. Epigrafista como me confesso, gosto de ver como a imaginação se põe em actividade para identificar o sítio das damas e o dos cavalheiros. Neste caso, porém, nada de anormal: o símbolo indicava claramente que era para homens e não havia que enganar. Aliás, como é habitual nessas alturas, uma pessoa nem pensa duas vezes: é ali e pronto!
Sucedeu, todavia, que, ao dispor-me para sair e abrir a porta, dei com o símbolo do… feminino! E a dúvida de imediato me assaltou:
«Estás mesmo velho! Então não viste que não era aqui?»
Saí e qual não foi o meu espanto quando verifiquei que não me enganara mesmo! O patrão riu-se e o pessoal acompanhou-o na facécia. É que, explicou-me, se enganaram a pôr as dobradiças e o letreiro ficou para o lado de dentro! Ou seja: dentro era para senhoras, fora para cavalheiros!
– Tal está a moenga!… – até apetecia dizer!