Não dou alvissaras por este governo. Nem este, nem algum outro que seja detentor de uma maioria absoluta, assente apenas na vitória eleitoral de um só partido. A vantagem das coligações é vigiarem-se uns aos outros, mesmo que em muitos casos, nem isso seja suficiente para evitar algumas asneiras. Mas do mal o menos.
Também nunca votei em Marcelo Rebelo de Sousa. Por uma simples razão. A minha percepção de que independente da simpatia que ele granjeou na opinião publica, fruto daquele ar simpático e ternurento com que se dirige às pessoas, numa linha de populismo “pimba”, há ali um “Petit Maquiavel”. O percurso intelectual e politico do actual PR mostra-nos que ao longo da sua vida, os seus momentos de êxtase sempre coincidiram com a criação de factos políticos. O Professor Marcelo não resiste à normalidade.
Já aqui escrevi no “Duas Linhas”, que o actual PR teve uma intuição desastrada quando no final de 2021, após o chumbo do OE 2022, dissolveu o parlamento, convencido pelas sondagens de que o PS iria perder essas eleições. Ou vencendo-as por margem ínfima, no mínimo acabaria por ficar refém do PSD, num governo minoritário liderado por António Costa, sem qualquer apoio à sua esquerda no parlamento. Como viemos a verificar a coisa correu-lhe mal, e o PS acabou por alcançar uma maioria absoluta, contra todas as expectativas.
É neste novo quadro que o PS tendo a liberdade de movimentos que lhe é conferida por uma maioria absoluta, avança para um conjunto de medidas politicas, uma delas a privatização da TAP, sem a pressão dos partidos à sua esquerda. Mal ou bem, com um sucedâneo de episódios rocambolescos, o governo lá conseguiu pôr a TAP a dar lucros. E isso é que é importante, independente das indecências relativas a algumas indeminizações, que, note-se, também foram pagas na CGD a ex administradores, por Paulo Macedo, sem o alarido da TAP.
Onde é que o PR entra muito mal neste segundo mandato?
Depois de já ter dissolvido o parlamento uma vez, do qual resultou a actual maioria absoluta, insinua aqui e acolá, a cada momento critico, com uma nova dissolução, como se o mais alto magistrado da nação andasse numa espécie de jogo do gato e do rato com o PM. Goste-se ou não, António Costa está investido de toda a legitimidade politica e democrática para prosseguir o seu mandato. Nem há nenhuma disfunção regular dos órgãos de soberania, nem a maior ou menor fragilidade politica de um ministro é razão para se dissolver o parlamento.
Há sim, um Presidente da Republica que ainda não digeriu bem o resultado eleitoral das ultimas legislativas, contra todas as suas expectativas. Essa realidade que emergiu nesse ultimo domingo de Janeiro de 2022, deixou-o num estado de ansiedade que está bem latente nas suas entrevistas e afirmações ao longo deste ano. Para aqueles que sempre acharam o actual PR uma espécie de inteligência rara, acima da média, face aos seus antecessores, desenganem-se. Está muito longe de ser o estadista de que necessitávamos.