Nem sequer os responsáveis camarários esperariam tamanha afluência, tamanho entusiasmo. É que a revitalização do casal saloio de Outeiro de Polima, além de ser uma aspiração geral, muito tinha a dizer a esta população do interior do concelho de Cascais. Revia-se ali, naquelas paredes, naqueles objectos, naquela reconstituída vivência – que fora a sua na juventude, que fora a de seus pais e avós.
Muitas alfaias, muitas fotografias. Num desafio: «Olha, esta é a Maria!», «Olha, isto é em Manique!», «Olha, esta era a foice que a gente usava!».
Disse o presidente da Junta que se concretizara um sonho; disse o director municipal da Cultura que se concretizara um sonho; repetiu-o o Presidente da Município.
Era bem visível a alegria de todos e o Director do Departamento do Património, Doutor João Miguel Henriques, não hesitou em enumerar quantos tinham contribuído para que o sonho se tornasse realidade. De facto, a obra resultou do empenhamento de uma vasta equipa, só possível porque todos sentiam estar a contribuir para dar vida a uma aspiração, a consolidar uma memória.
Insistiu-se: Cascais não é só o litoral, é também a região saloia, cujos habitantes – para além, agora, dos muitos imigrantes vindos das mais variadas zonas de todo o Portugal – descendem dos que, no tempo dos Árabes, cultivavam a terra para abastecer de alimentos a cidade de Lisboa. Um orgulho, afinal!
Vale a pena visitar com tempo todas e cada uma das dependências, dotadas de um projecto museológico digno. No final do percurso, depois do mundo agrícola, do mundo do trabalho da pedra, da cozinha, passa-se pela antecâmara que dá acesso à escada para o quarto de dormir, no 2º piso. Invocam-se as entidades proporcionadoras de um sono bom; imagina-se a noite, desce-se pela escada exterior e baixa-se a cabeça para espreitar o curral, onde outras maravilhas inesperadas se deixam admirar também.
De algo de muito importante agora se tomou consciência: a possibilidade de se recolherem alfaias em desuso, fotografias antigas. Que o Povo agora vê que esses objectos, aparentemente sem interesse e porventura destinados ao lixo, constituem memórias a preservar, estão cheios de histórias por contar. Aos netos e, também, para quem tem vivido em artificiais meios urbanos e nem sabe distinguir uma espiga de trigo da de cevada!
Parabéns!
É um final feliz para um sonho de quatro décadas… Mas José d´Encarnação diz uma coisa muito importante: a identificação das gentes próximas do casal saloio, com utensílios que fizeram parte do carácter rural deste Cascais interior.
Guardam memórias de trabalho e abundância, daí que o apelo para oferecerem objectos antigos a esta casa-museu, seja uma forma de preservar a identidade de uma população.
A habitual e desajustada conotação negativa de cascalenses com o ócio, merece um reparo sério. Há citadinos trabalhadores e também não se pode negar a existência deste mundo rural de abundância criado pelos trabalhadores da terra. Eram eles que a faziam produzir e abasteciam os centros urbanos.