A minha vida e o leitão do José Vidal-Bairrada.

A paixão por Águeda nasceu numas férias de verão passadas na Borralha em casa dos meus tios e levou à descoberta do rio e da piscina e dos cheiros e das cores do campo. E do valor da amizade. E daquilo que é ser aguedense, para a vida

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O meu tio Fernando Ribeiro levava-me algumas vezes nas suas viagens pelos clientes e numa delas, ao final da tarde, parou no Queiróz, em Avelãs de Caminho para lancharmos. Foi a minha primeira sandes de leitão e desde então o bácoro é a minha iguaria de eleição.

Pouco tempo depois fui viver para o Sardão onde o velho Patuá na sua mestria assava os leitões e a minha curiosidade irrequieta para lá se inclinava.

À medida que crescemos e vivemos numa terra de artistas assadores vamos percebendo que o Restaurante Vidal do Senhor Vidal Dias Ferreira e da Dona Maria do Carmo têm o melhor leitão e a melhor cabidela do dito.

Não residindo em Águeda há muitos anos, sempre que pude lá voltei para comer o leitão e nunca na minha vida outro comi que não fosse do Vidal (O Ivo é uma excepção, muito boa, do ano passado, por amor à verdade). “Pertenço a uma Confraria, jurei fidelidade…” e lá saía mais ou menos airosamente.

Em Agosto de 2021, de passagem por Águeda, fiquei a saber pelo meu amigo Eduardo Girão que o José Vidal e a Paula Figueira já não estavam na casa que o Senhor Vidal tinha fundado e para a qual o José Vidal tanto tinha dado. Desde muito novo que aprendeu com o pai a assar os leitões e era ele o assador do Restaurante Vidal e o gerente da casa ainda antes do falecimento do pai. Se podemos falar de segredo da arte ou de conhecimento ele está na posse do José Vidal, na sua cabeça, nas suas mãos, na sua experiência, no sentimento e assim foi até ao falecimento mais recente da Dona Maria do Carmo.

Em boa hora o casal abraçou um novo desafio honrando a família de ambos.

Apareci sem avisar nas antigas instalações da fábrica do pai da Paula por indicação do Girão e encontro o José Vidal como sempre agarrado ao batente, a erguer de raiz uma obra que hoje é um orgulho. Mas já lá vamos. Apresentei-me e claro que não me reconheceu bastante mais magro que eu estava! Na altura ainda de porta fechada ao público aguardando as licenças mas já com os amigos de sempre para o ajudarem.

Voltei um ano depois com a minha mulher num fim-de-semana especial para finalmente degustar o meu leitão. Foram anos de espera mas valeu a pena. Naquele almoço com a Cristina estava a minha vida toda, as minhas memórias, as minhas raízes, as minhas braçadas no rio, as horas de apneia debaixo de água com o Noronha, os mergulhos, os sucessos, as angústias, a eterna saudade, até os chapéus de chuva coloridos que vieram depois. Queria mostrar-lhe o barro que me moldou.

Da casa que a Paula Figueira e o José Vidal construiram, um bacalhau sublime para a Cristina e o pormenor do espumante bruto natural que não é apenas um pormenor, é sensibilidade, é distinção.

Voltei com o meu filho mais novo João, com o Noronha e com o Girão para apresentar oficialmente o leitão ao João.

O leitão é uma parte muito importante da sociologia da cultura de Águeda.

O João já brinca comigo porque eu desde que ele é pequenino que lhe explico que para criar um porco é preciso o povo ser sedentário, criar raízes, amar a terra e o espaço, amar Águeda.

Da próxima vez vou juntar os meus dois filhos e, se calhar, quase sexagenário… mas a felicidade não pode esperar.

José Vidal e o seu restaurante na Bairrada

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