Sim, Senhora Ministra

Acordei esta manhã ouvindo na TSF esta declaração: “... quanto à senhora ministra, nós até passamos lá pelas instalações do ministério para nos certificarmos de que ela ainda lá está". A declaração era de um funcionário judicial, dirigente sindical, e a ministra a que se referia era obviamente a da justiça.

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Com efeito, salvo o seu discurso na cerimónia de abertura do ano judicial, em que fez um balanço dos principais problemas da justiça com enfoque nas soluções já em marcha, foram quase invisíveis as suas intervenções. Tão raras que até eu, sempre atenta às notícias, só recordo uma intervenção num jornal da noite, a propósito do encerramento do Estabelecimento Prisional de Lisboa.

É um facto que os ministros com grande visibilidade mediática, quase sempre (talvez possamos tirar o quase) o são pelas piores razões, pelo que esta invisibilidade da Ministra da Justiça poderia ser um bom sinal.  A justiça é um dos “cancros” da política portuguesa que parece ter atingido o grau de incurável. Mas o poder judicial está tão pulverizado por instituições, que só com a Constituição da República na ponta de língua me atreveria a dizer o que é da competência da senhora ministra. Duma coisa estou certa: do que depender dela, fará as reformas que tornarão o sistema judicial português um exemplo para o mundo.

Já ouço apupos dos funcionários judiciais. São precisos mais de mil, a Senhora Ministra prometeu duzentos…

Ela quer “fazer acontecer” mudanças, mas para poder, tem de contar com as finanças. Para fazer acontecer seja o que for, para o bem de todos, é preciso coragem de desafiar as instituições políticas e financeiras a pensarem no bem comum e não nos privilégios de minorias, grupos económicos e pessoas com nome. É escandalosa, amoral, a distorção que os governos em geral fazem dos conceitos fundacionais da democracia. Há uma naturalização do capitalismo, como se fosse o fim da história, quando não passa de um sistema criado pelos homens (e mulheres) que aprimorou tudo o que tem de pior: desigualdades económicas gritantes, fortunas imorais de uns poucos e bandos de miseráveis. No meio, uns remediados. Ouvi um jovem comentar o carro do vizinho nestes termos: “eh pá, para ter um carro destes há de ganhar praí uns mil euros limpos por mês!” Deu-me vontade de chorar. Já ninguém estranha. As desigualdades são aceites como naturais. Imagens de gente a passar fome, a dormir na rua, já nem nos estragam o jantar. E têm menos mediatismo do que usar uma mala que custa 400 mil euros. Mas ainda há quem venha para a rua gritar. Clamam por justiça. Até perderem a voz.

Conheço a Ministra das Finanças. Conheci-a Catarina, nos seus 18 anos, já a ler textos integrais dos antepassados da democracia moderna: Montesquieu e “O espírito das leis”, Jean-Jacques Rousseau e “O contrato social”.

Sim, Senhora Ministra, tenho a certeza de que gostaria e seria capaz de ‘fazer acontecer ” uma verdadeira revolução no sistema judicial português. Assim pudesse!

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