Pedir um dia de folga do trabalho para tratar de assuntos pessoais pode tornar-se um pesadelo. Queremos fazer o máximo possível, mas graças ao estado dos transportes públicos, perdemos mais tempo (e paciência) do que ganhamos. No meu caso, tendo precisado de utilizar o autocarro 1101 (antigo 1 da Vimeca), perdi uma consulta médica devido ao atraso causado por conta do peculiar horário desta carreira. Este autocarro, mesmo em hora ditas “de ponta” e em período escolar, só passa de meia em meia hora, e isto sem contar com os atrasos eventuais (tráfego automóvel intenso, enganos nos percursos porque os motoristas estão a ambientar-se, para dar alguns exemplos).
Da parte da tarde, tendo de ir para a zona de Queluz, foi o pesadelo kafkiano: entre as 15h e as 15h50, o autocarro que era o 149 da Vimeca não passou, e quando por fim apareceu, não era a caminho do destino previsto, mas no sentido inverso. No decorrer desta situação, telefonei para o serviço de atendimento ao cliente da Carris Metropolitana, para ser atendida por um funcionário especializado em variantes das frases “não sei” e “não posso fazer nada”.
Por conselho de um motorista, apanhei o autocarro que sucedeu ao número 12 da Vimeca. O mesmo autocarro, conduzido por um cavalheiro com sotaque de português com açúcar que não só não sabia dar informações sobre se passava no arruamento do meu destino, “nem tinha obrigação de saber”, como a dada altura deu meia volta ao percurso para voltar ao ponto de partida sem avisar. Ao contrário do que ele afirmou, o placard electrónico do autocarro em causa não informava do facto.
Acabei por apanhar um táxi, de forma a chegar enfim ao meu compromisso, o que contribuiu para depauperar as minhas já frágeis finanças.
Mas foram buscar motoristas ao estrangeiro? A julgar por esta notícia do jornal Expresso, sim.
O projecto, lançado no primeiro dia deste ano da graça de 2023 (ou desgraça, para quem depende dos transportes públicos) já tem problemas, como relata esta notícia da CNN Portugal. Nas redes sociais e nas conversas espontâneas entre perfeitos conhecidos nas paragens de autocarros, a insatisfação é para lá de grande. No Portal da Queixa, ainda mais.
Nos últimos anos, o decréscimo da qualidade dos transportes públicos nas grandes cidades tem sido um filme de terror. Não parece haver melhorias, até porque vivemos em metrópoles carrocêntricas, mesmo com estudos que provam até à exaustão que essa está longe de ser a melhor prática, e onde quem não tem automóvel é tratado como um cidadão de segunda ou terceira categoria. Provas desses comportamentos abundam, desde a selvajaria do comportamento nas paragens e estacionamento de veículos até ao tráfego automóvel de pesadelo, mas há outros. Há poucos dias, um cidadão europeu à conversa comigo comentou surpreendido uma constatação: que em Portugal, o custo dos combustíveis era um escândalo, e em paralelo as pessoas utilizavam cada vez mais o automóvel.
Algumas perguntas ficam para já sem resposta:
Como é que a administração da Carris Metropolitana, que teve meses para se preparar para a transição, não previu ou acautelou situações como estas nem estabeleceu planos de acção caso acontecessem?
Como é que se planeou um portal tão confuso que o utilizador, sobretudo quem recorre pela primeira vez, não consegue saber a que linha corresponde qual carreira, e qual carreira corresponde a uma anterior?
Que consequências vai haver para os responsáveis que não souberam prever este surreal e triste cenário, que só promete agravar-se nos próximos tempos (mau tempo, greves, eventos em larga escala, etc.)?
Quem está disposto a ouvir as dezenas ou mesmo centenas de utilizadores prejudicados, desrespeitados, exaustos e até revoltados com este estado de coisas, que merecem apenas um bom serviço para o qual já pagam duas vezes (através do passe e dos impostos)?
No meio de tanta coisa má e perguntas que ficam no ar, só tenho resposta para isto “Que consequências vai haver para os responsáveis(…)”
– prémios, e chorudos por sinal, suponho.
E ainda resta acrescentar que quando me bateram na viatura fui ao escritório deles fui muito maltratada e vieram de noite limpar a tinta deixada no meu carro para eu não ter provas contra eles”!