Tem de ser divertido

nota da redação: hedonismo é a doutrina que faz do prazer um bem supremo e finalidade primordial da vida.

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Há décadas que o hedonismo vem dominando as teorias e práticas pedagógicas. A escola tem de ser um local de alegre convívio social das crianças e jovens, as aulas têm de ser divertidas, aprender tem de ser um prazer. O contrário será traumatizante e os alunos só poderão detestar uma  escola que não tem piada.

Este  hedonismo obsessivo é, na minha opinião, um dos grandes equívocos pedagógicos, que frustra os professores que valorizam o esforço dos alunos que de facto querem saber, e, não raramente, leva ao nivelamento por baixo. Esforço e sacrifício tornaram-se palavras e práticas interditas na pedagogia.

Durante décadas, fui militante ativa do Movimento da Escola Moderna. Tempo bastante para distinguir com clareza,  aprender e saber.  Aprender exige sempre esforço. O prazer vem depois, quando somos colocados em situaçoes nas quais  demonstramos saber.
Mostrem-me um artista, um escritor,  um músico, um ator, um  cientista ou… um desportista  que não tenha feito sacrifícios, horas e horas de trabalho, esforço a sério, para se tornar excelente.

Venham-me  com a teoria de que o que é preciso é inspiração. Oporei, com toda a convicção,  que o que é preciso é transpiração. Alguém o disse ( creio que um cientista): “o génio é 1% de inspiração e 99% de transpiração “. Não poderei estar mais de acordo.
Aos professores que pedem aos alunos  trabalho, esforço, sacrifício, chamam exigentes. Em geral, alunos e pais , se puderem, fogem deles a sete pés. Chovem as queixas contra eles.  E, como nos momentos de avaliação, traduzida em números, vale tudo o mesmo, estes professores são pressionados para subirem as notas, não raramente detestados pelos colegas, vistos como presunçosos.

Claro que o hedonismo não é exclusivo da pedagogia. É um sinal dos tempos. Ser divertido tornou-se um dogma.  Exigir sacrifícios parece  coisa da idade média. Não me surpreendem, por isso, publicações científicas que recentemente divulgaram a diminuição do QI médio. 
Se juntarmos ao tem de ser divertido, a confusão entre ter conhecimentos e saber clicar,  a equivalência geral entre conhecimento  validado e “vi na NET”, entre notícias e cochichos de vizinhas no facebook,  facilmente compreenderemos por que, em geral, as gerações mais qualificadas  podem ser as mais superficiais, como desenvolveu  Nicholas Carr, num excelente ensaio , já com uma dezena de anos: “Os superficiais. O que a internet está a fazer aos nossos cérebros”, cuja leitura recomendo.

Nicholas Carr, autor de “Os Superficiais. O que a internet está a fazer aos nossos cérebros”

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