No último adeus a José Eduardo dos Santos (JES), boa parte dos angolanos não foram na treta da homenagem ao “fundador” da nação ou ao “construtor da paz”. O ditador não foi uma coisa nem outra. Não fundou coisa nenhuma, a independência de Angola foi fruto da geopolítica, numa época em que o colonialismo tardio de Portugal era já impossível de sustentar. Numa altura em que a URSS tinha ascendente sobre o MPLA.
A guerra civil que se seguiu foi igualmente provocada pelas tensões entre as superpotências. Os EUA armaram e apoiaram FNLA e UNITA para contrabalançar o domínio soviético. Quando essa questão ficou arrumada, deixaram cair os peões que andaram décadas a fazer a guerra contra a URSS. Ou seja, a paz foi arrancada a ferros e com o fuzilamento de Jonas Savimbi, algures no leste do país.
As eleições em Angola sempre foram aldrabadas. Nunca até hoje o MPLA respeitou minimamente o voto expresso nas urnas. O que está agora a acontecer é mais do mesmo e só não se repetem os acontecimentos de 1992 porque não é preciso. O MPLA tem o aparelho de Estado na mão e não vai abdicar dele. Manda nos tribunais e processará quem quiser com uma desculpa esfarrapada qualquer. Tem o Exército e a polícia na mão e a força inerente a esse controle.
Marcelo em Luanda
Sobre o momento político, Marcelo Rebelo de Sousa sabe que pisa campo minado se resolver abrir a boca. É bom que permaneça silencioso quanto às virtudes da “democracia angolana”. Há temas em que não se admitem palhaçadas.
Um dos argumentos que invoca para estar em Luanda é o facto de JES ter coexistido como Presidente de Angola com todos os presidentes portugueses desde 1979. Pudera! JES interpretou a mais longa ditadura de África, até ser obrigado a reformar-se.