Comecemos pela “porta de entrada”, o aeroporto de Lisboa, onde há mais de dois anos se regista uma bagunça indecorosa e que abala a imagem de um país que vê no turismo a sua boia de salvação.
Os prejuízos causados pela péssima gestão do SEF, em coma desde o assassinato de um cidadão ucraniano, além de incalculáveis, são bem demonstrativos da inépcia de quem tem, por dever de ofício, de adiantar soluções e não agravar os problemas.
“Espertamente”, diz quem pode, quer e manda que a capacidade das instalações do aeroporto está esgotada. Esgotada está a minha paciência, quando vejo silenciados peritos que defendem que, com gastos irrisórios, a simples demolição de barracos inúteis e a criação de uma escapatória para o outro lado, quase se poderia duplicar a eficácia. Mas, ao que tudo indica, o “interesse nacional” passa por manter a “indústria” de projetar novos aeroportos, uma “mina” para “os do costume”.
Os do costume que, num ano quase sem incêndios, insistem na farsa do julgamento de um zeloso bombeiro, muito embora comissões independentes tenham indiciado a EDP como causadora da tragédia de 2017 e, seguramente, de muitas outras.
Os mesmos que, em tempos de restrições e fome, e em que se exige rigor e seriedade, agravaram exponencialmente os custos de uma Administração Pública em decadência.
Quem, detentor de cargos políticos, e enquanto se encerram serviços hospitalares e escasseiam os médicos de família, debita discursos de ódio contra os profissionais que ainda resistem na frente de batalha, ainda hoje alvo de graves agressões físicas por parte de uma população desinformada.
Na década passada, com base em falsas notícias, uma orquestração mediática montada em torno da morte de um bebé nas cercanias da Mealhada, o ex-Ministro da Saúde Correia de Campos foi alvo do único processo de demissão exigido pelo ex-Presidente Cavaco. Coincidência pura, em quase quatro mil dias de mandato, na semana anterior o ministro havia inviabilizado a transferência do IPO para uns terrenos fraudulentamente adquiridos por Duarte Lima: o tal comendador benemérito que, para evitar a extradição para o Brasil, encontrou refúgio numa prisão portuguesa, enquanto retém reformas milionárias…
Mas quem sou eu, que ainda terei de “nascer mais duas vezes”, para questionar a sensatez e as certezas de quem “raramente tem dúvidas e nunca se engana” e que, nos últimos dias, não cessa de me bombardear com lições de competência e de patriotismo?
Regressemos à atualidade. Face ao descalabro que atingiu o SNS, e exibindo um “otimismo irritante”, copiado não se sabe donde, o atual Presidente, em digressão pelos antípodas da Ucrânia e não pelos hospitais e centros de saúde, nem pestaneja, enquanto garante a resolução dos nossos problemas antes do Verão e recomenda serenidade.
Ontem mesmo, uma jornalista pediu-me que comentasse a solução levantada pelas autoridades do Ministério da Saúde, que passaria pelo serviço obrigatório dos médicos, no SNS, após a sua formação profissional e durante tempos indefinidos.
Defensor dos direitos humanos, e suportado num curso académico de seis anos em que sofri até às lágrimas, e em mais dez anos de trabalhos forçados para obter a especialidade, quase fiquei sem palavras. Só me faltava ouvir mais esta atoarda, a defesa da “requisição civil” de quem, mão-de-obra barata e a quem até férias são negadas, ainda hoje é obrigado a trabalhar dias e noites, sem descanso, para garantir o funcionamento de um SNS em lenta agonia.
Num momento em que, pela primeira vez, decresce a esperança de vida dos portugueses, encerrei logo a “entrevista” com uma curta declaração, que espero ver publicada: em minha opinião, não é a falta de excelentes profissionais, mas a incompetência, a impunidade e o excesso de autoridade dos diversos poderes dominantes, as únicas causas da “morte temida” do nosso SNS.