A existência de vida extraterrestre é uma certeza. Quanto mais não seja, no campo das probabilidades. Ou seja, não há nenhuma lógica que no meio de um Universo imenso com dezenas de milhões de planetas, só um reúna condições para a existência de vida.
Factualmente, porém, falta oficializar a coisa. Numa pesquisa descuidada num motor de busca, apareceu uma notícia publicada pelo Diário de Notícias em abril de 2011 onde se relata como um tal Gastón Garnier, na Argentina, fotografou um objeto voador não identificado, um OVNI.
A fotografia chegou à NASA, a agência espacial norte-americana, que a analisou e que terá considerado o objeto fotografado “semelhante” a um outro que tinha sido avistado e fotografado em Abrantes, Portugal, em 13 de dezembro de 2010.
OVNI AVISTADO EM CASTELO BRANCO
Foi quanto bastou para irmos bater à porta de Joaquim Fernandes, historiador e investigador da Universidade Fernando Pessoa, autor da série temática “Encontros Imediatos”, dedicada ao fenómeno OVNI em Portugal, que a RTP 2 exibiu. Desse ímpeto, resultou esta entrevista:
Pergunta: Quando foi assinalado o mais recente avistamento de ovnis em Portugal?
Resposta: Se quisermos aceitar apenas fontes como o Facebook e as redes sociais em geral, a referência mais recente a um suposto avistamento de um “objeto aéreo oval invulgar” reporta-se a 12 de abril, na zona de Castelo Branco em pleno dia. Os detalhes, por ora escassos, sugerem ainda uma trajectória do fenómeno no sentido da serra da Gardunha, acrescidos de uma fotografia, ainda que pouco esclarecedora e sujeita a eventual avaliação. De momento, não tendo sido viável a elaboração de um inquérito pessoal junto das testemunhas, fica em aberto esta possibilidade, apenas como dado cronológico de um continuado fluxo de observações esparsa no tempo e no espaço nacional. Aliás, é recorrente esta fluxo de divulgação por parte de entusiastas em círculo fechado, o que dificulta uma análise, rigorosa e detalhada, do evento original, já que as especulações em torno do depoimento original podem proporcionar uma alteração e degradação progressiva do testemunho original. Ora, tal deformação inquina a estrutura-base da experiência, ainda mais se não for acompanhada de outros elementos, como fotos ou vídeos.
P- Há a sensação de que o assunto desapareceu dos radares mediáticos. É desinteresse dos media ou o fenómeno arrefeceu? Ou é perceção errada da minha parte?
R. – Se não desapareceu assistiu-se, no mínimo, a uma óbvia transferência e mutação entre media: da imprensa escrita e audiovisual das décadas de 1970/80, – que albergaram e replicaram o então inovador rumor coletivo concebido pelo imaginário ET, via cinema, por exemplo, por obra do icónico filme “Encontros Imediatos do 3º Grau”, de Steven Spielberg – assistimos hoje ao realojamento da temática OVNI/ET na turbulenta realidade das plataformas virtuais. Com outros públicos e gerações distintas, muitas vezes convocadas para um credo mais ou menos acrítico, de franca aceitação de tudo, e com variantes entre a pura irracionalidade e a ingenuidade. O que remete o assunto para uma espécie de “gueto” onde a Ciência parece não caber. Diga-se que este reducionismo é, em parte, culpa da comunidade científica, da Academia, em geral, bem como da organização das políticas estatais, das implicações ao nível da Defesa.
Daqui resulta que hoje as abordagens por parte dos media tradicionais, do mainstream, se reduzam de quando em quando, a pontuais referências e citações a documentos oficiais de origem militar. Escasseiam, para não dizer, não existem, tratamentos do tema com sentido didático/científico, mormente na abordagem das implicações eventuais da temática dos “Não Identificados” com as dimensões existenciais da espécie humana, do nosso planeta nativo e as futuras descobertas de sinais exobiológicos, inteligentes ou não, e que poderão ter notórias implicações políticas, religiosas e culturais.
P- Os avanços na Astronomia (sondas, telescópios cada vez mais avançados) deveriam confirmar a existência de vida extraterrestre, mas isso não está a acontecer. Consegue explicar?
R- Enquanto ser humano sou tentado a inquirir se a minha espécie é uma exceção ou antes uma regra. Os continuados esforços das ciências exobiológicas, astronomia e astrofísica incluídas tem sido paulatino e gradual, mas importa recordar que estamos a lidar com dimensões de espaço e de tempo na ordem dos milhões de galáxias e de infindáveis anos-luz! A Vida, presente ou passada, pode estar ali ao virar da esquina, como Marte, mas igualmente noutras paragens hoje inacessíveis do universo local e mais além. Potencialmente a Vida será um princípio básico da Realidade (Cosmos). Por isso, será histórico encontrar indícios de vida microscópica, unicelular, antes mesmo de nos defrontarmos com uma civilização tecnológica hiperdesenvolvida, com a qual, aliás, não podemos antecipar o tipo de relações que viríamos a estabelecer: veja-se o que os ocorreu com as culturas ameríndias do século XV/XVI quando se confrontaram com os descobridores europeus…
Certo é que uma vida circunscrita ao nosso planeta seria um absurdo desperdício de espaço. Mas será que podemos considerar essas potenciais incursões ao nosso planeta como viagens de homónimos “astronautas” alheios ao nosso mundo? Ou essas alegadas “manifestações” ocorrem, num outro quadro espácio-temporal fora dos padrões cognitivo-sensoriais comuns? Por outro lado, importaria conhecer que capacidades tecnológicas fariam mover eventuais civilizações avançadas até nós. Mas, mais do que tudo, que motivações e interesses poderiam trazer até nós essas formas inteligentes, pelo menos mais apetrechadas do ponto de vista técnico e científico do que o sapiens sapiens. Forçosamente é essa a obrigação da Ciência: a de verificar todas as hipóteses.
Por outro lado, importa assinalar que a carga mítica do chamado fenómeno ovni é por demais evidente. “Mito moderno” assim lhe chamou Carl Jung, discípulo de Freud, e teórico da psicologia das profundidades, do simbólico e dos arquétipos.
À luz da cultura contemporânea o acrónimo O.V.N.I. transformou-se em substantivo e desde logo acarretou uma intensa carga simbólica incorporando muitas das aspirações e sonhos do nosso tempo: o (re)encontro com o Outro, que sempre esteve nas nossas cogitações quando, há quatro séculos começamos por encurtar distâncias oceânicas e buscar o desconhecido similar a nós. O mito do ovni transformado em nave espacial de capacidades inimagináveis que traz até o “Outro” das estrelas, o Superior Desconhecido, o deus-astronauta para muitos dos desiludidos com as religiões monoteístas institucionais. Também mito na perspetiva do Homem sozinho na imensidão do Universo, da solidão cósmica que tanto atormentou Blaise Pascal, filósofo cristão.
Por estas razões, a rápida tradução e identificação do fenómeno ovni com a hipótese de existência de vida extraterrestre é uma relação forçada que não confirma nem anula nenhuma das suas partes. Ou seja, a possibilidade de vida, bem provável na imensidão do cosmos, não depende em nada do facto de podermos vir a considerar todos os fenómenos tipo ovni como explicáveis no quadro das respostas terrestres e humanas. O ET – seja qual for a sua expressão biológica e morfológica – mantém todas as possibilidades de existir independentemente de solucionarmos ou não o problema dos fenómenos aeroespaciais não identificados. Só o faremos quando estes passarem a ser indiscutivelmente “não identificáveis”.
P- O Governo dos EUA desclassificou há tempos documentos sobre ovnilogia, havia algum segredo interessante nesses papéis?
R. – Nos anos mais recentes tem sido possível obter a desclassificação de documentos oficiais dependentes do Departamento da Defesa dos EUA, ao abrigo do chamado FOIA (Freedom of Information Act) que já em décadas passadas havia já libertado milhares de páginas relativas a “incidentes UAP”, sendo esta a nova sigla de Unidentified Aerial Phenomena em uso. Mais recentemente, novas diligências permitiram conhecer dimensões desconhecidas do envolvimento de departamentos do aparelho militar dos EUA e alguns registos vídeo de alta estranheza captados pela Marinha dos EUA com imagens de objetos aéreos atípicos interceptados nos radares e com movimentos e acelerações pouco ou nada convencionais. Nesse processo regular de requisição de documentos oficiais surgiram mais recentemente 38 documentos de projetos ditos “exóticos” relacionados com suposta ultra-tecnologia aérea tida como secreta.
Posso adiantar que neste momento, Portugal está representado num projeto de cooperação internacional e multidisciplinar científica denominado ICER (International Coalition for Extraterrestrial Research) que reúne 27 países nos cinco continentes, iniciativa que entre nós é participada pelo “Projecto STELLAR”, numa parceria entre o CTEC, da Universidade Fernando Pessoa e a Exopolítica Portugal.
Análise deveras interessante, que põe os pontos nos iis e remete o tema para um domínio mais científico do que meramente conjectural.
Caro José d’Encarnação, grato pelas suas considerações. O tema tem sido vilipendiado e desprezado ao longo de décadas ( desde finais da 2ª Guerra Mundial!) quando despontou na cultura popular ocidental (cinema e literatura de FC) e por via da C&/T ocidentais alertadas para os relatos militares (pilotos e outros).
Lástima que a Academia- com raras e notáveis exceções – se tenha refugiado numa alegada “indignidade” do tema quando ele ultrapassa de longe os critérios ET do ponto de vista astronómico e se revelam indicadores sugestivos de outros campos disciplinares, ao nível do indivíduo e do todo social. Cumprimentos.