Parece indesmentível que a sociedade civil russa está em luta contra o regime. A cena que todos já vimos da jornalista que apareceu em pleno noticiário do canal 1 da televisão pública, com um cartaz contra a guerra na Ucrânia, é exemplo disso.
Os jornalistas sempre foram alvos a que todas as ditaduras dão especial atenção. Um dos pilares das ditaduras é o controlo sobre a informação. Por isso, o jornalismo independente dos interesses do Estado nunca foi bem tratado pelos regimes absolutistas. Em Portugal, foi assim no tempo da ditadura do Estado Novo.
Na Rússia, a Amnistia Internacional refere que há mais de 150 jornalistas fugidos do país e a existência de vários casos de autocensura para evitar a prisão. Há órgãos de comunicação social encerrados compulsivamente, casos do Nastoyashchee Vremya (Tempo Atual), uma filial da Rádio Europa Livre/Rádio Liberdade, a TV Rain, a rádio Eco de Moscovo (sedeada na Letónia), os sites Meduza, Znak.com, Mediazona, Republic e Sobesednik e, ainda, o portal de ativismo de base Activatica, além dos serviços em russo da BBC, Voz da América e Deutsche Welle. Até mesmo o Novaya Gazeta, um marco do jornalismo independente liderado pelo Nobel da Paz 2021 Dmitry Muratov, removeu os artigos sobre a invasão da Ucrânia. E há o bloqueio no acesso às redes sociais Facebook e YouTube.
O parlamento russo aprovou leis que criminalizam a liberdade de expressão. Há já registos de milhares de detenções, depois das novas leis terem entrado em vigor. A Amnistia Internacional, mais uma vez, refere haver cerca de 13.800 manifestantes detidos arbitrariamente, por terem participado em manifestação contra a guerra em 70 cidades russas. Os detidos testemunham a prática de espancamentos, humilhação e outras formas de maus-tratos. Muitas relataram ter-lhes sido negado o acesso a advogados.
Ou seja, muitos russos resistem, muitos russos opõem-se ao regime e a guerra não se desenrola apenas nos campos de batalha.
Para final de história, referir que a tal jornalista do canal 1 foi acusada de “infração administrativa”, terá de pagar uma pequena multa e, eventualmente, cumprir um máximo de 10 dias de prisão, informou o correspondente do Finantial Times em Moscovo, Max Seddon, surpreendido por não ter sido aplicada nenhuma das novas leis que reprimem este tipo de protestos.
