Fui votar antecipadamente à hora do almoço. Eu e os meus ómicrons. Não é verdade que uma pessoa esteja recuperada após cinco ou sete dias de isolamento. No meu caso. Estou melhor, mas permanecem resquícios. A garganta apanhada. Cansaço…
… Ontem, ouvi na televisão um homem dizer que o voto dele era no PSD, desde sempre, mesmo que gostasse de outros candidatos e causas. Sempre votou no PSD e não ia mudar. Eu não gostava de ser como ele e de votar num partido como se crê em Deus. O Deus em que creio hoje já não é aquele em que cria há 20, 30, 40 anos. Se não me serve o mesmo Deus, como poderia servir-me o mesmo partido? Tenho a esperança de que estas eleições legislativas iniciem mudança no panorama político-partidário português. Precisamos de partidos novos a par dos do sistema. Com igual peso. Com equilíbrio. O sistema tem experiência, mas estagna. Vai resolvendo, vai mantendo. Não transforma. A política, a cultura, tudo precisa de sangue novo. De mudança.
Ontem fui à praia com as cadelas. Tempo ótimo. Alemães de t-shirt a divertirem-se na água como se fosse verão. A Marisol encontrou um grande companheiro de correria e rebolanço na areia. De resto, fiz nada. Este fazer nada fui buscá-lo ao diário de Fernando Pessoa de 1906. À noite, peguei nas Colóquio Letras que ando a arrumar, abri uma de 1987, e encontrei o excerto de um diário de juventude de Pessoa, que li com gosto. Um diário é sempre um pratinho. Entradas de duas ou três linhas. “27 de Março – Curso: Geografia e Inglês. Enfadonho. Grande passeio com a tia Anita. Fiquei em Pedrouços. Não fiz nada.” Primeiro, a importante confissão de enfado relativamente ao curso. Depois o laconismo predominante a todas as entradas. Mas sobretudo o “não fiz nada.” Quase todos os dias repete isto: “o curso é uma chatice, passeei com fulano e não fiz nada.” Sempre compreendi este homem. Não há na sua curta vida nada que me seja estranho ou incompreensível.
Este não fazer nada significa não ter realizado trabalho intelectual. Nos dias em que escreve ou lê não encontro essa anotação. Não realizar trabalho intelectual gera um enorme sentimento de culpa que compreendo perfeitamente.
(excerto editado de Diário da Revolta, 23 de janeiro de 2022, Facebook de Isabela Figueiredo)