As imagens dos dez mil migrantes – na maioria haitianos – abrigados debaixo de uma ponte, crianças, mulheres, homens, jovens sem mais nada que a roupa que tinham vestida, à espera de uma autorização para “entrarem nos Estados Unidos” são chocantes.
O que é que faz uma pessoa decidir deixar o seu país, o resto da sua família, pegar na mulher e nos filhos e passar as maiores privações até chegar a uma “terra prometida” na esperança de ali encontrar o que não tem na sua própria terra?
Na voragem das notícias, não há dia em que não se veja mais uma nova migração. As câmaras de televisão tentam dramatizar o mais possível a mensagem que pretendem passar, mostrando cenas de crianças, de bebés ao colo, de mulheres desamparadas e jovens de olhar vazio, manipulando telemóveis à procura dos familiares que já conseguiram “dar o salto”. Tal como nós, em tempos sem televisão à vista, já demos o salto também em busca de melhores dias noutras terras. Mas não desta maneira a que nos habituaram a ver.
Ninguém se esqueceu ainda dos jovens marroquinos que se lançaram ao mar para chegarem a uma porção da Espanha no Marrocos, Ceuta, do outro lado das redes. Foram oito mil a tentarem a sorte que lhes foi madrasta por terem sido devolvidos ao país de origem.
As migrações dos sírios em fuga da guerra no seu país, através de bem organizadas redes que os faziam atravessar o mediterrâneo em frágeis botes de borracha, dos afegãos em fuga dos talibãs, a concentrarem-se nos campos de refugiados na Turquia, o trampolim para a etapa a caminho do Eldorado, a Europa.
Quando nos dizem que existem atualmente mais de 258 milhões de migrantes temos de ficar atentos. Representam 3,4 % da população mundial. Nesta altura, em cada 30 pessoas, uma é migrante.
Há nesta altura 3,1 milhões de pessoas a requerem asilo fora dos seus países de origem. Aqui na União Europeia, em 2019, eram contabilizadas 21,8 milhões de pessoas com nacionalidade de um país terceiro.
Tal invasão já não tem nada a ver com a necessidade dos países importarem mão-de-obra barata na medida em que, quem lhes bate à porta, está fora de qualquer contexto. Desembarcam em praias, atravessam linhas de fronteira sem documentos, entram e esperam as “ajudas humanitárias” que sabem estarem disponíveis ou lhes foram prometidas à partida dos seus lares pelos agentes controladores desses fluxos migratórios.
Guterres bem pode fazer dramáticos discursos sobre o assunto, e traçar linhas para resolver o problema, governantes bem podem fazer discursos de solidariedade e condescência e deixarem entrar umas dezenas para ficarem bem na fotografia do politicamente correcto.
Não se pode confundir estes fenómenos das migrações com a contratação de trabalhadores a prazo que acabam por se diluir na rede dos ilegais na Europa.
Mas o fenómeno não diminui, há sempre uma nova vaga. E há sempre uma nova vinda de gente de países longínquos à conta das redes e à sombra de beneméritas organizações não governamentais. E há sempre um telemóvel para se ligar a quem já veio antes.
Só se procura fora de casa o que não se encontra em nossa casa e as razões para fugir em busca de melhores dias noutras paragens são múltiplas: guerra, perseguição étnica, religiosa, racial, política, cultural, busca de novas oportunidades, trabalho.
Aqueles migrantes debaixo da ponte, muitos deles haitianos fugidos do Brasil onde se encontravam antes, vêm agora juntar-se aos mexicanos que saltam o muro da fronteira entre o México e os Estados Unidos da América.
Os estados “invadidos” por essa gente sem papéis começam a não ter soluções para resolver os problemas básicos daquelas pessoas. Ninguém consegue prever o que tudo isto vai originar a longo prazo. Não é com campos de refugiados que se resolve o problema, nem com palavras inspiradas de boas vontades.