No dia 22 de Abril teve uma queda em casa com perda dos sentidos (desconhecemos a razão da queda). Foi vagamente assistida pelos bombeiros locais (o 112 entendeu que não era caso para enviarem uma VMER) e foi levada para o Hospital do Barreiro onde deu entrada dentro das urgências às 13h45. Apresentava um ferimento na nuca com sangue, tinha náuseas e vómitos.
Os bombeiros informaram-me que devido ao facto de entrar na maca teria prioridade, mas eu não a poderia acompanhar. Até cerca das 15h45 como não obtive qualquer informação sobre o seu estado lembrei-me de recorrer à ajuda de uma pessoa conhecida, funcionária naquele hospital, para tentar obter alguma informação. Alguns minutos depois essa pessoa conseguiu chegar junto da minha mãe e gentilmente efectuou uma chamada do seu telemóvel pessoal, colocando-me em contacto com ela. Queixou-se que ainda não lhe tinham feito nada, necessitava de ir à casa-de-banho, tinha fome e sede.
A partir das 16h e durante algum tempo consegui, através de um corredor por outro edifício paralelo, chegar a poucos metros da minha mãe onde em curtas visitas de poucos minutos fui tentando acompanhar o seu estado e fazendo com que ela se sentisse acompanhada. Estava “estacionada” no meio de uma sala improvisada, que na verdade é uma espécie de corredor / ponte que une dois blocos hospitalares. Apesar dos seus pedidos, as auxiliares ou enfermeiras recusaram-se a leva-la à casa de banho, tendo que urinar na própria maca.
Segundo indicaram, não podia beber água porque iria fazer exames. A minha mãe não comia nem bebia qualquer líquido desde o pequeno-almoço. Poderia ter siso colocada a soro para compensar estas carências, mas não foi….Não lhe fizeram qualquer curativo no ferimento da cabeça. A fronha da maca esteve do principio ao fim com uma mancha de sangue na zona da cabeça.
Ás 18h continuava a aguardar que lhe fosse feito algum exame… Eu aguardava junto à sala de espera na esperança vã de ser chamado para me transmitirem alguma informação. Tendo perdido a paciência, dirigi-me à recepção e exigi que me fosse dada alguma informação, realçando o facto de que a minha mãe poderia ter um traumatismo, já tinha vomitado tudo o que havia para vomitar, estava fraca e há horas sem comer nem beber. Segundo o sistema informático, estava indicada para ir fazer um TAC. Pedi o livro de reclamações e preenchi relatando o que se tinha passado até essa hora.
Por volta das 18h30 a minha mãe foi finalmente levada a fazer o TAC e recolha de sangue para análise. Numa das minhas curtas e fugazes visitas disse-me que estava a ficar com frio e sugeriu-me que fosse a casa dela buscar um roupão. Aproveitei a ida a casa para trazer também o seu telemóvel por forma a que pudesse comunicar mais facilmente. Voltei ao hospital.
Entretanto a porta do edifício por onde durante a tarde conseguia chegar perto da minha mãe já tinha sido fechada e por isso dirigi-me à entrada principal das Urgências e pedi ao segurança que me deixasse entrar para entregar o roupão e o telemóvel à minha mãe. Entrei e permaneci alguns minutos junto dela. Voltou a queixar-se de fome, sede e que estava urinada sem que alguém fizesse alguma coisa. Tentei que bebesse alguma água de uma garrafa que lhe levei, mas cumpridora como era recusou-se sempre pois foi lhe dito que não podia porque poderia a qualquer momento ter de ir fazer mais exames.
Pouco depois das 20h ligou-me através do telemóvel e disse que foi informada que teria de ir fazer nova colheita de sangue, pois a que efectuaram antes não tinha sido suficiente. Preparei-me para mais uma longa espera e permaneci junto à entrada das Urgências até por volta das 21h. Entretanto a minha mãe insistiu comigo ao telefone para que eu fosse jantar, uma vez que eu também não tinha almoçado e o resultado dos exames certamente ainda demoraria umas 2 horas. Fui a casa comer alguma coisa e entretanto enviei-lhe uma mensagem para saber como ela estava. Com alguma dificuldade e sem os óculos que lhe foram retirados, escreveu-me da melhor forma que pode que estava com fome e que não lhe podiam dar nada sem saber se teria de fazer mais algum exame. Quando estava dentro do carro para voltar ao hospital ligou-me a dizer que as auxiliares tinham pedido para que lhe levasse umas calças de pijama para a vestirem quando tivesse alta. Estacionei, voltei a casa, coloquei a roupa dentro de um saco e regressei ao hospital. Passava das 22h.
Novamente junto à sala de espera das urgências à espera de que a qualquer momento alguém me chamasse com alguma informação, resultados dos exames… alguma coisa. Passava das 23h e decidi de saco da roupa na mão pedir ao segurança para deixar entrar, ao que acedeu. A maca da minha mãe tinha entretanto sido deslocada para o canto da sala improvisada. Um canto escuro, mal iluminado onde durante o dia a luz entrava pelas janelas laterais, mas aquela hora aquele espaço tornou-se sombrio. Continuava a queixar-se de fome e sede. Tal seria a sua carência que aceitou à primeira a minha sugestão de beber da garrafa que eu levava. Muito a medo bebericou apenas um pequeno trago. Ainda tentei que comesse uma peça de fruta que eu levei comigo, mas por receio de contrariar as indicações não o fez. Desabafou comigo que tinha perguntado se não lhe faziam um curativo na ferida da cabeça e que lhe responderam que depois em casa ela podia limpar com água oxigenada (!)…
Perguntei a uma auxiliar que estava por perto se mais de 3 horas passadas não seria já altura para se conhecer o resultado dos exames (o TAC feito às 18h30 e as segundas análises feitas por volta das 20h30). Respondeu que não era com ela, que devia de perguntar a uma enfermeira. Indicou-me um gabinete que não tinha ninguém, procurei por isso noutro gabinete. Durante quase 15 minutos tentei captar a atenção de alguma enfermeira colocando-me à porta de do gabinete. A primeira que me apareceu não me deixou terminar a frase e como se eu não estivesse ali entrou no gabinete virando-me as costas. Quando finalmente consegui encarar um enfermeira de frente e esta parou para indagar o que eu queria, fiz a mesma questão que tinha feito à auxiliar e esta respondeu-me que não era com elas, que teria de perguntar ao médico de serviço. Indicou-me o número do gabinete e sem mais demora dirigi-me a ele.
O médico de serviço estava sozinho no gabinete e rapidamente lhe fiz o relato que já repetira anteriormente. Mandou-me sentar e muito tranquilamente foi perguntando o nome da minha mãe enquanto consultava no computador. Respondeu-me que os resultados das análises já estavam no sistema. Estava tudo normal. Fez um print do resultado e entregou-me. Disse-lhe que a minha mãe também tinha feito um TAC e este respondeu que também estava tudo normal com o TAC. Fez um print do resultado e entregou-me. Acrescentou então que até “já ia dar alta” à minha mãe. Por momentos atravessou-me no cérebro uma questão: se eu não tivesse ido aquele gabinete pedir informações quanto mais tempo a minha mãe passaria esquecida naquela maca…Perguntei-lhe se não tentaram saber a razão da minha mãe ter caído, ao que me respondeu que isso (ela) teria de de ir realizar depois exames mais aprofundados. Que é como quem diz, por conta dela, não naquele dia e muito menos no seu turno, pelo que entendi. E quanto a medicação, vai receitar alguma coisa? Perguntei eu. Se tiver tonturas tome Ben-U-Ron e Betaserc. A minha perplexidade acerca da prescrição do Ben-U-Ron impediu-me de decorar o nome do Betaserc e por isso pedi que escrevesse. Digitou então no computador e imprimiu a receita. Ainda meio surpreendido com toda a passividade do médico, atirei mais uma pergunta. A minha mãe vai ter alta já? Não vai ficar algum tempo em observação? Não, vou dar indicação para a prepararem para ter alta, respondeu-me ele.
Este médico nem sequer voltou a ir junto da minha mãe para avaliar como ela se encontrava. Baseou-se apenas na informação do resultado do TAC e análises que chegaram através do computador…Fui dar a novidade à minha mãe e consegui, finalmente, convence-la a comer a peça de fruta que eu tinha levado. Disseram-me que podia ir buscar o meu carro enquanto preparavam a minha mãe.
Já passava da meia-noite e lá fui buscar o carro que estava estacionado fora do perímetro do hospital. Demorei cerca de 15 minutos até voltar para junto dela. Estava exactamente na mesma, deitada na maca, com a bata do hospital, molhada e com os sacos da roupa que eu trouxe a seus pés. Fui saber o que se passava e responderam que estavam à espera que a casa-de-banho grande ficasse livre para ajudarem a minha mãe a vestir. Já não sai e fiquei a aguardar no corredor. Pouco depois espreitei e vi que tinham decidido colocar um biombo à volta da maca e acabaram por a vestir ali.
Eram 0h35 mais ou menos quando me trazem a minha mãe, pelo seu próprio pé. Fiquei com a sensação que a minha mãe parecia aliviada por ir finalmente sair dali e eu também estava por a poder levar para casa. De tal forma que nem me ocorreu contestar porque razão não colocaram ao menos a minha mãe numa cadeira de rodas. Depois de um breve Boa Noite, a minha mãe deu-me a mão e começamos a andar pelo corredor. Não teremos andado mais do que 3 metros quando a minha mãe levanta o braço para se apoiar na parede e começa a desfalecer. Só tive tempo de a amparar para não cair abruptamente no chão. Pela primeira vez após tantas horas vi e senti preocupação e sinais de urgência no pessoal hospitalar. Vi a minha mãe inanimada com os olhos abertos, sem encontrarem a sua pulsação e a ficar vermelha. Ajudei as enfermeiras a colocar a minha mãe na maca, pediram-me para sair e aguardar. Percebi assustado que era grave. Muito grave.
Esperei nervosamente 40 longos minutos. Quando tinha acabado de dizer ao segurança que ia entrar por ali a dentro ele diz-me que querem falar comigo na outra ala do hospital. Esperava-me a chefe do serviço acompanhada de 3 ou 4 enfermeiras em posição de formatura da tropa. Já não havia nada a fazer. A minha mãe não resistiu a uma paragem cardio-respiratória. A segunda enfermeira disse-me para me dirigir no dia seguinte a uma funerária que me explicariam e tratariam de tudo e outra enfermeira entregou-me dois sacos de plástico com os pertences da minha mãe. Fiquei praticamente sem acção. Não consegui trazer a minha mãe de volta a casa…Tinha 70 anos..
Devido aos contornos que envolveram o falecimento da minha mãe foi pedida a realização de uma autópsia. Resolvi fazer este relato porque entendo que esta situação é demasiado grave e tem ser denunciada. Aliás, todas as situações como esta o devem ser, por forma a evitar que se continuem a repetir. É vergonhoso!
Embora com pouca esperança, porque vivemos numa República das Bananas terceiro-mundista, espero e desejo que seja apurada a responsabilidade pela má assistência que foi prestada à minha mãe.. Tenho fracas possibilidades financeiras, pelo que alguém que me possa prestar algum aconselhamento jurídico, por pequeno que seja e livre de honorários ficarei muito agradecido.
Grato pela vossa atenção, Jaime Silva.
Lamento o sucedido com a sua mãe.
Com a minha ocorreram factos muito semelhantes, mas felizmente ainda está viva.
Quando esteve no Hospital Amadora Sintra deixaram-na cair, fraturou o nariz.
Apanhou uma infeção pulmonar. Lavaram-na, mas não lhe secaram o cabelo com secador. O caos.
Quando foi enviada para O Hospital de Santa Maria onde aguardámos 14 horas por noticias. Uma vergonha. Os hospitais têm de contar com comissões de utentes organizados, que os percorram 24 horas por dia.
Os hospitais são dos portugueses, não são dos médicos, enfermeiros e auxiliares. A arrogância de alguns médicos e de alguns administradores é insuportável. As informações sobre o estado dos doentes devia ser enviado por sms de tantas e tantas horas. Os doentes deviam ter uma ficha horária de percurso e um profissional responsável pelo preenchimento dessas fichas para a culpa não morrer solteira.
Deixem de enfiar milhões nos Bancos, 7 mil milhões no Novo Banco, e coloquem o dinheiro ao serviço dos portugueses e não dos banqueiros.
No Hospital de Santa Maria existem voluntários. Mas são hostilizados pelos médicos e enfermeiros. Verifiquei eu. Abraço e sentidos pêsames
Que tristeza, também perdi a minha no Hospital de Faro em 1995 aos 59 anos. Não foi muito diferente! Nós é que arranjamos a desculpa para nós mesmos de que havia chegado a hora! É mesmo uma República das Bananas e nós somos os “bananeiros” responsáveis pelo caos. As nossa reações acontecem nos sítios errados e têm pouco impacto! O livro de reclamações do SNS já foi por mim preeenchido várias vezes. E depois recebia uma carta passados uns anos a dizer que não havia recursos humanos para dar resposta a todas as solicitações! É o que temos e há que mudar com urgência! Vão morrer muitas mais pessoas que podem ser salvas se nada fizermos para que mude!
Também passei por muitos maus tratos no hospital Garcia de Orta no final de dezembro de 2020,depois de uma indução para o parto por três dias,fui cortada e cozida sem anestesia e como tive covid me trataram como animal,deixando ali em uma sala jogada a ter de fazer tudo sozinha,meu menino foi puxado a ventosas,como não saia puxaram a ferro e veio ao mundo todo machucado…nem sei como estou viva.