Um Governo ditatorial só se consegue manter no poder com o apoio das armas. Na altura, a exemplo do que acontecia com a generalidade da população portuguesa, nas nossas Forças Armadas havia um pequeno grupo com consciência política e vontade de ajudar na democratização do país. Destaco, por exemplo, Melo Antunes, Pezarat Correia, Ramalho Eanes e Salgueiro Maia (por serem os mais lembrados ainda hoje).
A imensa maioria dos militares do quadro vivia num total alheamento do mundo que os rodeava. Gente sem outra ambição que não fosse a sua própria carreira, na maior parte das vezes.
Um litígio de origem profissional entre os capitães do quadro e o Governo, provocou um enorme desagrado a alguns oficiais que, pela primeira vez, o demonstraram publicamente. As forças políticas da oposição, em conjunto com a referida elite intelectual dos militares, aproveitaram esse desagrado e trouxeram esses militares para junto de si. Assim nasceu o 25 de Abril.
Foi longa e dura a luta seguinte, até se conseguir que os mais preparados politicamente assumissem, depois, a liderança e conseguissem parar com populismos, por um lado e tentativas de regresso ao fascismo, por outro. Eram muitos, aqueles que tinham passado de anónimos a figuras de capa de todos os jornais e não menos os que queriam manter os privilégios de gerações. Todos foram sendo derrotados.
Passados todos estes anos, contudo, continuam a aparecer algumas figuras, quer de um lado quer do outro, a mostrar o seu descontentamento pelo resultado final da Revolução dos Cravos. A democracia, que traz vantagens à imensa maioria da população, desde logo por determinar que os cidadãos são todos iguais nos direitos e deveres, “prejudica” aqueles que eram tratados de modo diferente, para melhor, dado o seu estatuto social.
E também não satisfaz, completamente, alguns dos militares menos esclarecidos, de que falei acima, que não seguiram o exemplo dos principais (dos verdadeiros!) artífices do 25 de Abril, que se afastaram das luzes da ribalta, ficando, para sempre, no coração do Povo mas, pelo contrário, preferiram rentabilizar o facto de terem ficado conhecidos pela intervenção no processo recolhendo algumas mordomias a partir daí. Nada de ilegítimo, sequer condenável, não fosse o caso de passarem a considerar-se os “donos” de uma data que a maioria dos portugueses considera pertencer a todos os democratas.
A recente decisão de se considerarem no direito de escolher aqueles que podem participar num desfile comemorativo é bem o exemplo do que acabei de escrever. Quem lhes concedeu essa prerrogativa?
O 25 de Abril de 1974 é, para muitos, um dos dias mais felizes das suas vidas. Todos os anos faço questão de o comemorar. Este ano não será excepção.
A quarenta e oito horas da data ainda não sei como o farei, até pelos condicionalismos conhecidos, mas de uma coisa estou certo: não participarei em qualquer desfile encabeçado por ditadorzinhos.
Estas datas são para celebrar com gente simples, sedenta de justiça social, que luta pelos seus direitos e democratas sem reservas de qualquer espécie. Nunca com pretensas vedetas inchadas de vaidade ou pretensiosismos.
O 25 de Abril é para gente magra.