Com a vida por um fio…

Cumpri anteontem 72 anos, o último aniversário que meu pai comemorou. Em 1996, e subitamente, ele não conseguiu ultrapassar o dia mais inglório da minha própria vida.

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Um 7 de abril de 2021 que esperava feliz, mas que, entre outros incidentes, ficou também ensombrado pelo falecimento de Jorge Coelho, alguém com quem mantive uma relação muito próxima e franca no século passado, embora não isenta de divergências.

Sendo eu também um combatente, mas sonhando com um Portugal diferente, a certa altura o nosso percurso divergiu: sem traumas nem ressabiamentos, antes com a rara lealdade de quem é capaz de defender sem receio diferentes opiniões. E assim, ainda que singelamente, lhe presto a devida homenagem.

O dia 7, porém, tal como quase todos os trepidantes dias que vivo, ficou marcado por muitos mais “episódios”. Com uma manhã para esquecer, pela tardinha bateu à minha porta um “amigo” que transportava um medalhão romano, de lápis-lazúli, com cerca de 15 centímetros. Na posse de um privado há dezenas de anos, entrava nesse mesmo dia no mercado. Por favor, analisem esta maravilha que qualquer museu do mundo gostaria de expor…

Já agora, e como ainda não tive tempo de fazer qualquer pesquisa, alguém sugere qual o Imperador que representa? “Premiarei” quem ajudar…

Pensando nunca poder ver uma peça tão rara, verifiquei, contudo, que o seu preço até era muito inferior ao que “corre” em feiras internacionais. A razão residia em urgentes razões, que não ajudaram a melhorar o meu estado de espírito:

No dia 5, o proprietário, ainda pessoa “jovem”, achara-se subitamente doente e percebeu que tinha contraído uma forma violenta de Covid-19. De mal a pior, resolveu desfazer-se de tal peça logo na manhã seguinte, assim garantindo a sobrevivência de sua família, durante semanas. O tempo necessário para que, a tudo correr bem, sair do hospital. Desconheço quem seja, mas, ao que me foi dito, ainda na noite de 6 foi internado de urgência em “Cuidados Intensivos”, onde corre o risco de não sobreviver.

Deste mundo das “artes e antiguidades”, recordo ainda um velho amigo a quem, tendo um dia recusado a compra de um precioso lote, dado o baixo preço que pedia e que não era justo, enigmaticamente me anunciou:

– Ai o doutor, que é o meu melhor amigo, não me ajuda? Então, já sei o que vou fazer…

E na manhã seguinte, na reta do Cabo, em Lisboa, AG acabaria os seus dias enfaixado, a “muitíssimos à hora”, na traseira de um camião TIR.

A partir dessa “lição”, e embora sempre com a condição de devolver, sem juros, as peças adquiridas, em caso de “arrependimento”, passei a ter outras “cautelas”. É que a cada passo, a vida nos reserva surpresas: nem sempre as melhores e, quantas vezes, de todo inesperadas…

Numa fase, em que o número de casos de Covid-19, em Portugal, parece estar a aproximar-se do “limite” sustentável, que ronda os mil novos casos/dia – e esqueçam preciosismos estatísticos como o R e quadros às cores, que só complicam –, seja-me permitido afirmar que os próximos dias serão cruciais para se saber, se quem agora dá alento à “geringonça”, está habilitado a conduzir “veículos” destas dimensões.

Eu nunca abriria as populares esplanadas, em desfavor da restauração, atividade que sanitária e economicamente seria muito mais justificada, como há semanas defendi. E também, porque no campo da medicina não se pode “receitar” o mesmo a todos, tenham ou não tenham tosse, também nunca se recomendaria o desconfinamento de concelhos com taxas de contaminação acima do tolerável. Por exemplo, o que se passa desde há dias na cidade da Figueira da Foz, com as esplanadas a abarrotar, é intolerável num país bem dirigido e civilizado.

Veremos o que os próximos dias nos dirão: se há mesmo “gato” e onde o “gato mia”. Só após criteriosa análise das novas incidências, poderemos perceber quais os setores de atividade que, eventualmente, estarão a afetar a saúde pública. E só depois, RAPIDAMENTE, se pode definir se Portugal pode avançar no desconfinamento ou se, pelo contrário, terá de recuar nas áreas em que, inequivocamente, se prove aumento de contágios.

Notícias preocupantes, as que aqui vos deixo. Com a certeza, podem crer, de que desejo ao “proprietário” da peça romana que entendi preservar, a possibilidade dele a poder retomar, em breve.

9 COMENTÁRIOS

  1. Vamos a isso, mui prezado Cândido! Divulgarei o achado junto de quem pode dar-lhe uma resposta.
    Entretanto faço votos de que mais aniversários possa cumprir, com saúde e serenidade. Ambos somos septuagenários, eu um tudo-nada com mais uns aninhos, e ainda – se Deus quiser! – havemos de ter mais alguns pela frente. Ânimo!
    Dar-lhe-ei notícias!
    Abraço
    J. d’E.

  2. Muito obrigado, José d´Encarnação

    Em breve, com outros temas como pano de fundo, mostrarei mais “preciosidades” encontradas no nosso território. Deta, não sei a proveniência.

    Temos dois museus de arquelogia – Cantanhede e Setúbal – para inaugurar brevemente e poderá sempre passar na Casa da Urra, onde há umas coisitas, para além de néctares.

    Forte abraço e cuide-se!

    CF

  3. Dei a conhecer a colegas meus. Ainda espero algumas respostas; adianto, desde já, o que me respondeu o internacionalmente reconhecido numismata, que é o Doutor Rui Centeno: «Em minha opinião, pela representação dos cabelos e da barba, é uma peça do séc. II, sendo o mais aproximado o Adriano, do início do reinado».
    O imperador Adriano reinou de 117 a 138.
    Claro que foram mais as perguntas do que as respostas: é romano ou renascentista? Donde provém? Perguntas estas um tudo-nada apressadas, digamos assim, porque se não leu que se tratava de peça de coleccionador, comprada no mercado de antiguidades e que, por via disso, a sua proveniência se perdeu… na noite dos tempos!… Portanto, o medalhão (ou camafeu) vale por si, fora de qualquer contexto arqueológico.

  4. Caro José d’Encarnação:

    Os palpites apontam para uma grande fase do Império Romano, tornando assim provável o achamento da peça em Portugal, como tudo leva a crer, dada a projeção de Roma naquele tempo.

    Renascentista, a peça não é, de certeza. E, parecendo um camafeu, tem 13,5 cm e não é de trazer ao peito

    A discussão continua, pois assim se faz História.

    OBG e venha-me visitar.

  5. Bom dia,

    Com base nas sugestões, que agradeço, pesquisei também e tratar-se-á mesmo de Adriano.

    Tenho um prémio para o “descobridor”, tal como prometi. Via “Duas Linhas”.

    ABÇ e OBG

  6. Cópia do que hoje mesmo divulguei nas listas em que incluíra esta notícia:
    No passado dia 9, dei conhecimento de um «medalhão romano, de lápis-lazúli, com cerca de 15 centímetros», no sentido de se obter a sua identificação. Os resíduos de terra visíveis nos interstícios do molde indiciavam que se sugeria ter sido o ‘medalhão’ achado em contexto arqueológico (vide foto em anexo).
    Recebi diversos pareceres e perguntas – que agradeço. As questões centravam-se na possível identificação do personagem e na possibilidade de se tratar, de facto, de uma peça romana.
    Efígie de imperador romano acabou por se descartar, não só porque não coincidia com as efígies conhecidas cunhadas nas moedas, mas também pelo pormenor da coroa de loiros, mais consentânea com uma personagem ligada às artes e às letras. Por outro lado, considerou-se estranha a utilização do lápis-lazúli, na época romana.
    Crê-se, pois, com maior verosimilhança, que poderemos estar perante uma obra do século XVIII, neoclássica, muito em linha com as séries dos 12 Césares que estiveram em moda, nessa época, tanto em mobiliário como em elementos decorativos. Mas pode não ser um imperador, mas o retrato de um mecenas, por exemplo. Há, inclusive, a hipótese de estar assinada, sobre o vestido aparece abaixo do pescoço, à altura do ombro, o que poderia ser um I e um V em cursivo.

  7. Olá!
    Óptimo este nosso modo de estabelecer contactos! Nada melhor do que pôr os temas em discussão, a fim de colher opiniões!
    Agradeço a Jorge Sánchez-Lafuente Pérez ter-me passado a informação colhida por Fernando A. Muñoz Villarejo:
    Dos opciones
    O es una pieza renacentista como esta
    https://www.catawiki.es/l/19046205-lapis-lazuli-cameo-roman-emperor-nero-mm-100x80x20-mm-renaissance-xvi-century-italy
    O es una copia o falsificación de este tipo de piezas.
    Acedendo ao site indicado, encontra-se:
    lapis Lazuli Cameo Roman emperor Nero mm 100x80x20 mm Renaissance XVI Century Italy
    in good condition
    Beautiful 16th century cameo, made in Italy with a fine Lapis Lazuli.
    Representative of the Roman emperor Nero, In good condition, only small breakages and wear and tear of time, as shown in the photos, otherwise in good condition.
    It is part of my private collection, inherited from my father, which he has collected over the years.
    Dimension:
    mm 100x80x20 mm
    E a imagem é bem semelhante à que nos foi apresentada.
    Grato a todos os que tiveram a gentileza de pronunciar-se
    José d’Encarnação

  8. A peça foi encontrada em Évora, há muitos anos, representa inequivocamente o Imperador Adriano que nasceu e ascendeu ao poder aqui bem perto e nem sequer é novidade: há mais peças de lapis-lazúli, assinaladas na região, embora de qualidade inferior.
    A hipótese adiantada de ser uma cópia renascentista, ainda que se venha a provar, provavelmente ainda acrescenta valor. Seria bem vinda, mas não parece colher.

    Já quanto a ser uma falsificação atual, é “teoria” de quem nada percebe das artes da gliação, que foram interrompidas desde o séc. XVIII. Qualquer “artista” atual já estaria referenciado e cobraria uma fortuna por falsificações. Sobretudo por artefatos desta qualidade.

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