Ser gente

A mensagem que Victor Brito hoje me enviou obrigou-me a teclar esta crónica. Assim num impulso íntimo – sem dúvida, motivado também pelos tempos que ora nos é dado viver.

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Charles Plumb, o piloto  saltou de para-quedas quando o seu bombardeiro foi abatido na guerra do Vietname, contava a mensagem, que será bastante conhecida já. Feito prisioneiro, só ao fim de largos anos logrou ser libertado. Um dia, já nos Estados Unidos, num café, alguém lhe perguntou:

– Você é Charles Plumb, o piloto que se salvou, não é?

– Sou, como é que sabe?

– Era eu quem dobrava o seu para-quedas! Parece que funcionou bem, não é verdade?

O piloto sentiu um baque. Nunca ligara importância a esse homem que lhe falava agora, tantos anos volvidos, com quem tantas vezes se cruzara e a quem, decerto, nunca dera os bons-dias!…
E surgiu-me, de novo, a história dos meus jovens vizinhos de cabelo multicolorido que me ofereceram um bonito banco de jardim: «Sabe, é que vocês são os únicos que nos dão os bons-dias!». Ainda hoje, a sua expressão me arrepia!… E deles me lembro quando no banco me sento…

Atropelam-se-me na memória palavras de reconhecimento e palavras de sincera discordância por parte de quem se cruza comigo. O gesto que fez bem, o gesto que marcou negativamente… Amiúde, mera expressão facial, duas ou três palavras… Ficaram na memória. Indelevelmente. Sinto-me responsável. E peço perdão por não ter sido oportuno. E fico contente quando me dizem, como há dias um amigo, ao telefone: «Não te apercebeste disso, mas a tua atitude deu-me alento». E a frase que alguém recebeu: «Bem haja pela sua enorme capacidade motivadora e por aquilo que ensina, talvez mesmo sem o saber».

A nossa responsabilidade enorme de cidadãos.

Evoco de novo aquele instantâneo na ilha Great Abaco, nas Baamas, em Maio de 1989. A equipa cruzou-se com uma senhora. Nós, uns estranhos. Saudou-nos num sorriso: «You welcome!».  Sorrimos também. E tenho presente o sorriso do condutor do autocarro que passa pelo meu bairro, quando lhe aceno. E a saudação habitual, em Londres, ao motorista quando se entra no autocarro e lhe agradecemos à saída!… Sim, esse o mundo de comunidade em que eu quero viver!…

No final da mensagem, em que me respondia à pergunta se estavam bem, a minha amiga escreveu: «Tenho saudades de falar com Gente!». Acabei por lhe telefonar, no pressuposto de que… seria gente. E ambos fomos mais gente!

(o autor também publicou esta crónica no blog “Notas e Comentários“)

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