Ilídio Duarte tem 79 anos, foi mobilizado para Angola com 26. Mecânico de aviões na Base Aérea do Montijo, poderia escapar a essa mobilização mas foi avisado pelo comandante que, não indo para Angola, acabaria por ir parar a Moçambique ou, pior ainda, à Guiné. E ninguém queria ir para a Guiné.
E assim Ilídio Duarte lá foi juntar-se à Esquadra 94 estacionada em Luanda. “Fui enganado, mas ainda bem”, diz ele à medida que descreve a amizade que nasceu entre os camaradas de armas, até hoje.
“Ainda hoje, todos os anos, são organizados almoços” de forma a reviver esta amizade duradoura. O respeito é mútuo e Ilídio incentiva qualquer um a distinguir graduações. “Desafio-o a distinguir Generais de Sargentos e Sargentos de Cabos”, adianta.
Quando chegou a Angola, já estavam a ser utilizados os famosos Alouette 3, helicópteros que “rapavam” a superfície e que, já adaptados ao estilo de combate, serviam que nem uma luva a todos os operacionais que sobrevoavam a mata à procura do inimigo ou de soldados portugueses para salvar.
Inicialmente, quem manuseava o heli canhão eram soldados paraquedistas. Mas enjoavam muito com os voos rasantes e acabou por ser decidido dar aos mecânicos a tarefa de disparar o heli canhão, uma arma temível de 20mm que espalhava o terror no inimigo quando atacado pelo ar.
Ilídio Duarte chegou à guerra em 1967 e já só ouviu contar sobre as atrocidades cometidas seis anos antes, quando os povos africanos deram início à luta pela independência. Mas a guerra não faz ninguém santo, independentemente da cor da pele ou das motivações pessoais. Na guerra mata-se e morre-se com facilidade. A adrenalina é uma droga e os combatentes depressa se viciam nela. Quem nunca pecou que atire a primeira pedra.
Ilídio contou-nos histórias que não queremos reproduzir aqui. Ele sabe que houve excessos nos dois lados da “trincheira”. Morreram muitos civis, brancos e pretos, sem necessidade e sem justificação militar. Foram mortes que apenas serviram para espalhar o terror e desmoralizar.
Ilídio, o guerreiro, carrega a Cruz de Guerra ao peito. “Éramos heróis e morremos pela pátria”, é a frase que usa para honrar os camaradas e amigos caídos em combate. Jovens sacrificados em nome de um desperdício político.