Guerras feitas por encomenda

0
2101

Descobri que é possível saber, com 2 anos de antecedência, quando uma guerra vai começar, depois de um telefonema a propósito do tanque de lavar roupa da minha tia.

Por causa das escutas telefónicas, recebi a visita de um ilustre desconhecido que me imaginou perito em tanques! E eu julguei-o vendedor de seguros.

Na conversa desencontrada, o homem atalhou de imediato com perguntas a que fui respondendo conforme pude. Tem certificação Nato? O quê?! É necessário. Para quê? Para pagar as comissões aos vários níveis e para a segurança do negócio.

Fiquei, então, a saber que o procedimento demorava pelo menos dois anos e podia ser conduzido a partir de Lisboa, por um telemóvel via satélite com escuta garantida dos russos, americanos e israelitas.

Mas cuidado! Os tanques seriam encomendados a quem fabrica com qualidade garantida: Estados Unidos da América, Grã-Bretanha, França e Rússia. O comprador não queria pechisbeques.

Seriam organizadas visitas às fábricas e escolhido o modelo. O material era fabricado de propósito, porque não é coisa que se encontre em prateleira. A encomenda era feita por Lisboa para poupar os grandes a um qualquer escândalo.

Tratava-se de uma encomenda de 90 tanques e o seu valor seria depositado de forma integral num dos melhores bancos suíços, que deveria constituir-se como depositário do negócio.

Lisboa ganharia cláusulas de contrapartidas por ajudar à “detente” bélica internacional. Porém, o mais provável era não serem executadas, como aconteceu na compra dos 2 submarinos.

Para além dos tanques, o acordo implicava a formação técnica de 180 mercenários para guiar aquelas máquinas carregadas de sofisticados instrumentos informáticos e de incríveis mecanismos. Os nativos desta e de outras guerras não poriam as mãos naquelas coisas caríssimas.

E lá continuámos a conversa com a minha baralhação a ser interpretada como excentricidade. Percebe? Eu?! É novo no negócio? Eu?! Disseram-me que fala muito sobre tanques ao telefone. E eu ri-me.

Acordou-se numa penalização caso se excede-se o tempo máximo de 3 anos para o fabrico, a formação do pessoal, as transferências, as confirmações, as taxas e as discussões de todos os pormenores. Dois anos eram o mínimo dos mínimos. O transporte consumia mais dois meses. Um cargueiro especial rumava, por exemplo, para a Argentina, que mantém há anos uma disputa territorial muito conveniente com o Chile. E depois embicava no rumo certo, rasteado pelos satélites das super-potências. Tudo para disfarçar.

O tal homem ficaria hospedado no Hotel Lisboa Palace para ser seguido pela inteligência portuguesa, como era de bom-tom. E iríamos todas as noites ao Maxime, já reaberto. O Maxime era o cabaret eleito, desde sempre, pelas Inteligencias cruzadas de vários países, a deliciaram-se com as coristas Judite e Batatinha e com as irmãs Carmencitas.

Demorei algum tempo a explicar o sentido do meu telefonema. Tratava-se de um tanque de lavar roupa, em cimento. O homem desatou a rir e ganhei um amigo. Um amigo da onça!

Quando agora vem Lisboa vamos ao Maxime, bebemos umas cervejas e ele conta-me onde vai ser a próxima guerra, com 2 anos de antecedência.

Depois eu chego a casa com azia. Porque sinto que faço parte de um grupo de homens que manda homens matarem homens. Aqui em Lisboa.

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui